Nau sem rumo

A administração Alexandre Ferreira (PSDB) atravessa uma tormenta. O prefeito tem encontrado enormes dificuldades para manter o barco.

16/06/2013 | Tempo de leitura: 5 min

Numa democracia mais avançada, o próprio secretário Teixeira teria pedido demissão faz tempo. Na falta de senso de oportunidade do condenado, um líder consciente teria resolvido a questão
Numa democracia mais avançada, o próprio secretário Teixeira teria pedido demissão faz tempo. Na falta de senso de oportunidade do condenado, um líder consciente teria resolvido a questão

‘De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer as injustiças, de tanto ver agigantar-se os poderes nas mãos dos homens, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto’
Rui Barbosa,
diplomata e jurista brasileiro


A administração Alexandre Ferreira (PSDB) atravessa uma tormenta. O prefeito tem encontrado enormes dificuldades para manter o barco no prumo, muito em função de características personalíssimas que fazem com que, diante das dificuldades, prefira para auxiliá-lo os manuais das teorias acadêmicas no lugar da experiência acumulada de quem já navegou por mares furiosos. Até agora, a estratégia tem se mostrado fracassada.

A coleção de intempéries é bem conhecida. Primeiro, houve o problema do viaduto da Major Nicácio. Aprovado às pressas no final do governo passado, as obras foram concluídas e entregues já sob responsabilidade de Alexandre Ferreira. Denúncias iniciais de irregularidades resultaram numa CEI (Comissão Especial de Inquérito) que, a despeito da má-vontade explícita de alguns de seus membros, tem cumprido papel fundamental. As investigações lideradas por Márcio do Flórida (PT) mostraram que há falhas no projeto, na licitação, na documentação, na responsabilidade técnica, no volume de recursos alocados. O cheiro que circunda o viaduto nem de longe lembra perfume.

Houve o fracasso da Expoagro, tradicionalíssima festa, evento anual que atraía multidões ao parque Fernando Costa e movimentava o setor comercial da cidade durante todo o mês de maio. Aniquilada por uma absurda letargia do poder público diante de prazos que avançavam sem que ninguém movesse uma palha, a Expoagro acabou reduzida a uma quermesse de escola. Bem modesta.

Impossível ignorar ainda as circunstâncias da melancólica saída da secretária de Educação, a queridíssima professora Leila Haddad, inconformada com o tratamento grosseiro que teria lhe dispensado Alexandre Ferreira. Foi outro episódio que em nada lustrou a biografia do chefe do executivo. É claro que, como líder, cabe ao prefeito escolher seus assessores. Também não é o caso de se discutir as credenciais da sucessora, Fabiana Sampaio, que assumiu o cargo com energia. Mas, se havia a decisão de afastar Leila Haddad, que se fizesse com respeito. ‘Fritar’ alguém que acumulava 40 anos de dedicação ao serviço público é pouco nobre.

Como se já não houvesse problemas suficientes, Alexandre Ferreira conseguiu criar confusão até quando o assunto não lhe dizia respeito. A Câmara havia aprovado um projeto que criava um plano de cargos e salários para os seus servidores. O movimento inicial foi uma lambança, com tramitação em regime de urgência, conversas de bastidores e transparência próxima do zero. Houve pressão. Alexandre vetou. Pronto. Sua parte deveria se encerrar aí. Se a Câmara derrubasse o veto, o desgaste não seria seu.

Alexandre resolveu medir forças. Recorreu a argumentos infantis, apelou para uma lógica absurda e tentou disseminar o pânico de que, se mantido o projeto (e derrubado o veto), haveria o caos financeiro na prefeitura, como se Legislativo e Executivo não fossem poderes distintos. Os salários de um não se confundem com os de outro. Alexandre transformou o veto em questão pessoal, convidou levas de vereadores para reuniões, pressionou, articulou. Perdeu. Tomou o que, no futebol, se define como ‘um chocolate’. Foi massacrado por 10 a 4. Expôs-se desnecessariamente, foi derrotado fragorosamente.

Nada disso é páreo, no entanto, para o potencial explosivo do imbroglio que envolve o secretário de Urbanismo e Habitação, Wilson Teixeira, condenado pela Justiça por improbidade administrativa num caso, denunciado pelo Ministério Público por superfaturamento num outro, e mantido nas suas funções, intocável, por obra e graça de Alexandre Ferreira.

Nenhuma das denúncias que atingem Wilson Teixeira é recente. A condenação em uma delas, sim. No primeiro caso, ele foi acusado pelo MP de participar de um esquema para fraudar e superfaturar as obras de alargamento do córrego do Bagres. Teixeira era secretário do governo Sidnei Rocha. Acabou exonerado na época e só foi reconduzido para o posto no final do governo Sidnei Rocha. O caso segue em tramitação na Justiça de Franca.

A segunda denúncia teve desfecho mais rápido. Teixeira era, no mesmo governo Sidnei, secretário municipal e sócio de uma imobiliária, a Parati. Teixeira aproveitou-se desta condição para liberar o loteamento ‘Ana Dorothéa’ com ruas e rotatórias mais estreitas do que a legislação determina. O Teixeira-secretário deu uma ajuda providencial para o Teixeira-loteador. O MP denunciou o caso e, em 2010, a Justiça em Franca o condenou à perda dos direitos políticos por oito anos e à proibição de contratar com o poder público por dez anos.

Teixeira recorreu. E o Ministério Público também, pedindo a aplicação de uma multa de R$ 600 mil. O caso foi então apreciado pelos desembargadores do Tribunal de Justiça, em São Paulo. De novo, Teixeira foi condenado. A sentença foi mantida, com exceção da multa, porque a imobiliária havia assinado um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) com o MP e compensado o dano.

Existe uma lei municipal, de autoria do ex-vereador Silas Cuba (PT), que proíbe que sejam mantidas em funções comissionadas qualquer condenado, em decisão colegiada, entre outras razões, por improbidade administrativa. É exatamente este o caso de Teixeira. Por isso mesmo, o MP já notificou Alexandre para que ele explique porque Teixeira segue no paço municipal. Ainda não se conhece o teor da resposta.

Numa democracia mais avançada, sequer haveria necessidade de se recorrer a leis como a de Silas Cubas. O próprio secretário, constrangido, teria pedido demissão faz tempo. Na falta de senso de oportunidade do condenado, um líder consciente teria resolvido a questão com presteza. É para isso que ele tem a caneta. Ignora-se porque Alexandre Ferreira tenha guardado a sua no bolso. A depender da interpretação do MP com relação à recusa de Alexandre em agir, quem pode virar réu em ação de improbidade é o próprio prefeito.

A nau do governo municipal segue sem rumo, guiada mais pelos impulsos e inflexibilidade do prefeito do que pela razão que poderia manter tudo nos eixos. Ao invés de procurar águas tranquilas, Alexandre mantém o leme reto no rumo da tempestade. Não desvia nem um milímetro, ainda que se multipliquem a cada instante os sinais de perigo. Se o barco afundar, o capitão Alexandre Ferreira não terá a quem culpar. Só a si mesmo.

CORRÊA NEVES JÚNIOR
é diretor-responsável do Comércio da Franca jrneves@comerciodafranca.com.br

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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