Um homem mau

O palco da tragédia foi a escola Chardon High School. Grupos de alunos se espalhavam, como todas as manhãs, pelas mesas da cantina.

24/03/2013 | Tempo de leitura: 5 min

Thomas Lane é a prova de que há gente absolutamente má, sem que exista razão, motivação ou culpado. Nasceu assim, vai morrer assim.
Thomas Lane é a prova de que há gente absolutamente má, sem que exista razão, motivação ou culpado. Nasceu assim, vai morrer assim.

‘Na natureza não existem recompensas
nem castigos. Existem consequências’
Robert Ingersoll,
político americano


Fevereiro de 2012 se aproximava do fim, gelado como sempre na cidade de Chardon, Ohio, na fronteira dos Estados Unidos com o Canadá, sem que qualquer um dos seus pouco mais de cinco mil habitantes pudesse imaginar o que estava para acontecer. Os raios de sol da manhã mal haviam se debruçado sobre Chardon naquele dia 27, quando a primeira parte de um evento sinistro, que ecoaria pelo mundo todo, aconteceu.

O palco da tragédia foi a escola Chardon High School. Grupos de alunos se espalhavam, como todas as manhãs, pelas mesas da cantina. Eram 7h30 quando Thomas ‘TJ’ Lane, um garoto branquelo, magro, nem alto nem baixo, um tipo físico absolutamente comum, entrou no local. ‘TJ’ não estudava ali, mas sua presença não despertou qualquer atenção. ‘TJ’ não disse uma única palavra, não fez qualquer ameaça, não chamou por ninguém. Apenas sacou uma pistola semi-automática Ruger MK III, calibre 22, e mirou em quem estava ao seu alcance. Descarregou de uma só vez as 10 balas que cada ‘pente’ da arma comporta. Matou três garotos com idades entre 16 e 17 anos. Feriu outros três, um deles desde então condenado a uma cadeira de rodas. Foi preso instantes depois dos disparos por um professor, do lado de fora da escola, perto do seu carro. Thomas ‘TJ’ Lane tinha 17 anos.

Os últimos doze meses Thomas Lane passou atrás das grades, para onde foi levado assim que foi detido e de onde não saiu mais. É na prisão que ‘TJ’ vai ficar também para o resto de seus dias, não importa o quanto viva, o que diga ou o que venha a fazer. Sua condenação saiu na última terça-feira, 19 de março, dia de seu julgamento. ‘TJ’ foi sentenciado a três penas de prisão perpétua, uma para cada garoto morto, e não terá direito a pedir liberdade condicional. Foi ali, durante o seu julgamento, que aconteceu a segunda parte do evento sinistro iniciado um ano antes.

Assassinos, por mais sórdidos que sejam, costumam mostrar, em geral, arrependimento e vergonha por seus atos, especialmente quando confrontados com parentes de suas vítimas. A grande maioria chora e pede perdão. Um grupo menor, apesar de economizar nas emoções, demonstra algum respeito pelos familiares daqueles que matou. Um grupo muito pequeno não esboça qualquer reação e, com frieza, mantém-se impassível. O matador de Chardon não pertence a nenhum dos três tipos distintos vistos até hoje.

Thomas Lane entrou no Tribunal com uma camisa social azul por cima de uma camiseta branca. Antes de qualquer palavra, tirou a camisa azul. Queria exibir a estampa da camiseta branca para a plateia. Nela estava escrito, em letras garrafais, a palavra ‘Killer’ - em português, ‘assassino’. Se você acha que isso já seria provocação suficiente para as famílias de suas vítimas, prepare-se. ‘TJ’ Lane foi muito mais longe.

Perguntado pelo juiz se queria fazer alguma declaração sobre os crimes pelos quais era acusado, Thomas ‘TJ’ Lane ultrapassou, com suas palavras e gestos, as piores expectativas. ‘TJ’ se virou para os familiares das vítimas e, riso estampado na face, debochou: ‘esta mão que puxou o gatilho que matou seus filhos agora se masturba com a lembrança. Fodam-se todos vocês’. Para arrematar, ergueu o dedo médio. O juiz, estupefato, limitou-se a perguntar se era só isso que ele tinha a dizer. Não houve resposta.

A natureza da absoluta maioria das pessoas, misericordiosa e condescendente, tem imensa dificuldade para aceitar um fato que me parece cada vez mais inquestionável: o mal absoluto existe e há gente sem qualquer tipo de amarra moral. Mamíferos bípedes como eu e você mas que, diferente de nós, são incapazes de sentir amor, respeito, compaixão, arrependimento ou remorso. São aberrações. Thomas Lane não foi abusado na infância, não foi espancado, não foi obrigado a trabalho degradante, não conviveu com traficantes em boca de fumo, não foi vítima de coisa alguma. Também não tem nenhuma explicação para a razão dos seus atos, não tinha rixa com ninguém nem queria vingança. Disse que atirou a esmo, sem motivo. É mau, simplesmente.

Thomas J. Lane é um monstro. Pelo menos, cometeu seus crimes nos EUA, onde existe consequência para quem transgride a lei. Tivesse escolhido o Brasil para matar, passaria, no máximo, três anos preso na Fundação Casa, reflexo direto de uma legislação surperprotetora e anacrônica que tem no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) sua maior expressão. Ao ganhar a liberdade, ‘TJ’ teria ainda ‘ficha limpa’. Seus crimes sequer seriam mantidos nos registros oficiais.

Nos Estados Unidos, a conversa é bem diferente. Há também Juízes da Infância para cuidar de jovens delinquentes. Mas lá os magistrados têm a prerrogativa de decidir se o jovem autor de um crime deve responder como um adulto. Thomas Lane passou por um destes juízes, que o avaliou e confirmou que ele tinha absoluta noção do que fazia. Assim, ‘TJ’ deveria ser responsabilizado como um adulto, com a única ressalva de que não poderia ser condenado à morte. Pegou a pena máxima: prisão perpétua. Ficou também estabelecido, desde já, que ele não poderá, nunca, nem mesmo tentar a liberdade condicional.

Thomas Lane é a prova cabal de que há um certo tipo de gente que é absolutamente má, sem que exista razão, motivação ou culpado. Nasceu assim, vai morrer assim. Felizmente, longe de nós, na cela de uma prisão qualquer. Para uma aberração, é a alternativa possível à morte. Que fique lá, enjaulado, para sempre. É o alívio possível.

CORRÊA NEVES JÚNIOR
é diretor-responsável do Comércio da Franca jrneves@comerciodafranca.com.br

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