Puro deboche

Os bandidos riem de todos nós porque sabem que, não importa o que façam, não ficam presos muito tempo.

10/02/2013 | Tempo de leitura: 5 min

Os bandidos riem de todos  nós porque sabem que, não  importa o que façam,  não ficam presos muito tempo
Os bandidos riem de todos nós porque sabem que, não importa o que façam, não ficam presos muito tempo

"Quem hesita em punir aumenta o número de abusados"
Publílio Siro,
escritor latino

A semana que terminou foi típica em Franca. Isso não significa dizer que tenha sido tranquila. Não faltaram os roubos, furtos e sequestros-relâmpagos com os quais estamos desgraçadamente nos acostumando. Não faltou também a ironia daqueles que, criminosos flagrados no curso de suas ações delinquentes, se aproveitam de um sistema legal capenga, que traveste bandidos de vítimas, para se safar. Somos todos, neste instante, verdadeiros idiotas sitiados por marginais que usam a legislação que criamos – através dos deputados e senadores que temos elegido – para nos afrontar, ameaçar, machucar.

Um sequestro-relâmpago, ocorrido na noite de segunda-feira, é um excelente exemplo do tipo de violência que aflige o cidadão de bem, do destemor dos bandidos diante das autoridades policiais e de suas inconsequências mesmo quando acabam presos.

O terror começou quando uma senhora chegava na casa da irmã, no jardim Ângela Rosa, e foi rendida por um trio de marginais. O bando raptou as duas irmãs e mais uma sobrinha e obrigou-as a se dirigirem até a rodovia Rio Negro e Solimões. Ali mesmo, perto do aeroporto e debaixo de forte chuva, foram soltas. É claro que, antes disso, os marginais retiraram das mulheres seus pertences pessoais, dinheiro, celulares e cartões de crédito. Fugiram, obviamente, com o carro delas.

O veículo roubado, um Golf vermelho, só foi visto de novo na madrugada de quarta-feira, trafegando na região do Distrito Industrial. Interceptado por uma viatura da PM, seus ocupantes protagonizaram uma fuga cinematográfica. Foram 80 quilômetros de caçada num vai-e-vem insano entre Franca e Batatais, com direito a ultrapassagens perigosas, conversões absurdas e até tráfego na contramão. O carro só parou depois que seus dois pneus estouraram, próximo da entrada de Franca. Seus ocupantes ainda tentaram fugir pela mata, mas acabaram capturados.

Quem dirigia o carro roubado era Wallison Carvalho, 18 anos, autodeclaradas seis passagens por unidades prisionais e participante confesso do sequestro do trio de senhoras. Estava acompanhado por sua namorada, uma sapateira de 21 anos, e por um menor que, segundo ele, era só um “carona”. O bandido disse que seus dois acompanhantes não tiveram qualquer participação no crime. Ambos foram soltos. O mesmo só não aconteceu com Wallison porque, ficha corrida extensa, já tinha um mandado de prisão expedido por um crime anterior. Pelo sequestro, roubo e fuga, muito provavelmente aguardaria em liberdade seu julgamento. Tem sido assim graças a um desastroso entendimento do Supremo Tribunal Federal que garante a liberdade dos acusados, por conta da “presunção de inocência”, mesmo quando presos durante a ação criminosa e sejam réus confessos.

Numa entrevista concedida ao repórter Barros Filho, Wallison deu detalhes do crime. É um primor de falta de consciência. Para quem ouve, fica a impressão de que Wallison se diverte com as fugas e perseguições, não tem qualquer consideração pelas vítimas e, implicitamente, deixa claro que o sistema legal não o detém. A confissão é clara. Perguntado se tinha participação no sequestro, não tergiversou. “Tenho sim, senhor”. Questionado sobre como foi a ação, mostrou o tipo de tratamento que reserva para senhoras de mais de 50 anos. “Tava sozinho, peguei o carro, enquadrei a vítima...”. Orgulhoso, diz que foi para o motel com o carro roubado. “Isso. E com a mulher do lado”.

O trecho em que explica as razões que o levaram à fuga desesperada é absolutmente non sense. “Ah, senhor, uma, não quero ir preso, né? Mas fui. Não tenho habilitação, tavu (sic) bêbado... Vamos correr”, simplifica. E completa, de forma irônica, sobre a interceptação feita pela polícia. “Aconteceu esse imprevisto”. Riscos? Não muitos, na opinião do criminoso. “Eu não tava correndo tanto... Tava no máximo a 160, 180 km/h. Não tava aquela direção tão perigosa”. Sobre a captura na mata, suas explicações lembram aquelas dadas por jogadores de futebol depois da derrota num clássico. “Tentei (fugir), mas não tive o êxito esperado”.

Claro que, cereja do bolo da ópera bufa que é a entrevista de Wallison, a sua autodefinição do grau de periculosidade que representa beira o inacreditável. Depois de seis prisões por assaltos; de pelo menos um sequestro; de roubar celulares, dinheiro e carro; de fugir pela rodovia a quase 200 km/h, inclusive na contramão; Wallison garante que não é perigoso. “Não me considero isso não, senhor. Considero não”.

Se você faz parte do grupo de pessoas que defende a ideia de que os marginais são vítimas de um “sistema injusto” e da “sociedade de consumo” que costuma “virar as costas” para os menos favorecidos, é bastante provável que você acredite que a fala de Wallison Carvalho indica que ele não tem consciência de seus atos e, não duvido, são grandes as chances de que você defenda a tese de que ele nem mereça a cadeia como punição. Discordo radicalmente. Para mim, o que sua entrevista revela é um deboche descarado. Viramos todos palhaços nesta tragicomédia em que se transformou a questão da segurança pública no Brasil.

Os bandidos riem de todos nós porque sabem que, não importa o que façam, não ficam presos muito tempo. A julgar pelo histórico de Wallison, é fácil imaginar a qual tipo de atividade vai se dedicar quando estiver de novo em liberdade. É uma perspectiva horrível para quem ainda acredita na decência, no valor do trabalho honesto, em princípios e valores, numa vida digna. Passou da hora de abandonar a demagogia barata e enfrentar com coragem a questão da criminalidade. Obviamente, com punições mais severas aos delinquentes, apoio às forças policiais e uma legislação que não veja, em cada marginal, só uma “vítima da sociedade”. Esse discurso, além de cansativo, já deu mostras de que é furado. E inócuo.

CORRÊA NEVES JÚNIOR é diretor-responsável do Comércio da Franca jrneves@comerciodafranca.com.br
 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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