<p>Há 14 anos, o delegado Pedro Luiz Dalaqua, 39, chegou a Franca vindo da região de Bauru (SP) e assumiu o 2º Distrito Policial, responsável pelas ocorrências registradas na área do Jardim Guanabara. Passou por outras unidades, mas foi na Dise (Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes) que ganhou notoriedade pelo trabalho realizado. Entre uma saída e outra, já soma dez anos na delegacia cuja atribuição é combater o tráfico de drogas na cidade.</p><p><br />Segundo previsão do Governo do Estado feita em 1991, a Dise deveria contar com 18 investigadores. A cidade cresceu, tem cerca de 350 mil habitantes e a delegacia conta com apenas seis profissionais para apurar as ocorrências de tráfico em Franca e mais 17 municípios pertencentes à Delegacia Seccional local. </p><p><br />Embora a estrutura com a qual conte esteja aquém das necessidades, a equipe do delegado Dallaqua prendeu 70 traficantes no ano passado. De agosto de 2007 até sexta-feira, dia 17, 23 criminosos integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital) foram mandados para a cadeia após investigações conduzidas pela Dise.</p><p> Da relação, fazem parte “Brunão”, “Criança” e “Vaca”, bandidos apontados pela polícia como líderes dos ataques ocorridos em Franca em maio de 2006. “Esta facção tem como principal fonte de renda a venda de drogas. Combatendo o tráfico, também combatemos o caixa da facção e enfraquecemos suas ações”.</p><p> Segundo o policial, as investigações prosseguem e outros integrantes de quadrilha podem ter o mesmo destino dos comparsas já presos.</p><p><br />Nesta entrevista, o delegado Dallaqua conta sobre os riscos de lidar diariamente com traficantes, fala sobre o envolvimento cada vez mais precoce dos jovens com as drogas e da árdua tarefa de conter o tráfico. “Nossa esperança é que ocorra uma diminuição do consumo, tirando drogas de circulação. Também temos como objetivos a prevenção e o tratamento, mas isto não depende somente da Dise”.</p><p><br /><strong>Comércio - Como o senhor ingressou na polícia?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Entrei como escrivão na minha cidade natal (Santa Cruz do Rio Pardo- SP), de 18 para 19 anos, basicamente, porque fui incentivado por um amigo que já exercia a função. Ele me alertou que na época havia saído um concurso regionalizado. Fiz a academia em 1988 e tomei posse no mesmo ano.<br /></p><p><strong>Comércio - Quando é que começa a história do senhor em Franca?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Depois que ingressei como escrivão, me interessei pelo Direito e fiz faculdade em Bauru (SP). Após me formar em 1992, comecei a prestar os concursos destinados ao interior. Me inscrevi quando saiu para Franca e vim para a cidade em 1994. Passei a atuar no 2º Distrito Policial. Entre idas e vindas, já tenho dez anos de Dise, uma das delegacias em que eu mais gosto de atuar, porque considero muito importante o trabalho de combate ao narcotráfico.<br /></p><p><strong>Comércio - A Polícia Civil está preparada para combater o tráfico de drogas na cidade?<br />Pedro Dallaqua - </strong>Está preparada, sim. Temos tido grande sucesso nas diligências. A equipe da Dise tem conseguido grandes resultados, mas não deixamos de reivindicar reforços. Nossa equipe tem dado conta, mas à custa de muito sacrifício. Os investigadores, praticamente, não têm tido folgas porque são em número muito reduzido.<br /></p><p><strong>Comércio - Qual é a principal carência da delegacia?<br />Pedro Dallaqua - </strong>Material humano. Faltam investigadores. A previsão para esta delegacia, datada do ano de 1991 era de 18 investigadores. Tenho sob o meu comando apenas seis investigadores. É um número muito pequeno. Nossa responsabilidade não se restringe somente a Franca, mas a todas as unidades da nossa seccional (17 municípios).<br /></p><p><strong>Comércio - Mesmo com o efetivo reduzido, a Dise prendeu cerca de 70 traficantes. Como avalia o número?<br />Pedro Dallaqua -</strong> É bastante expressivo, principalmente, pelo nível dos traficantes presos. O foco do nosso trabalho é voltado para líderes de quadrilha. Tirando os líderes de circulação, os traficantes menores acabam sendo presos pela Polícia Militar. Nosso objetivo é minar as organizações e aqueles indivíduos que exercem qualquer liderança nos bairros da cidade.<br /></p><p><strong>Comércio - O senhor tem a estimativa de quantos integrantes do PCC foram presos em Franca?<br />Pedro Dallaqua -</strong> De agosto de 2007 para cá, conseguimos recolher 23 integrantes de uma facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios. Vamos continuar este trabalho, porque não queremos, aqui, indivíduos que exerçam qualquer tipo de influência sobre os outros traficantes ou outros criminosos. Esta facção tem como principal fonte de renda a venda de drogas. Combatendo o tráfico, também combatemos o caixa da facção.<br /></p><p><strong>Comércio - Mesmo presos, traficantes comandam a distribuição de drogas de dentro dos presídios. Como é possível?<br />Pedro Dallaqua -</strong> A organização conta com vários métodos. Existem recados dados por familiares, por meio de cartas e, infelizmente, as comunicações por telefone celular. Estes indivíduos continuam se comunicando com os comparsas em liberdade.<br /></p><p><strong>Comércio - O senhor interfere diretamente no interesse de criminosos poderosos. Não é arriscado fazer este tipo de trabalho?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Toda a atividade policial é arriscada. Trabalhamos dentro da legalidade e o indivíduo detido pela nossa equipe sabe que tudo foi feito dentro da lei e que ele corre este risco. Agindo contra a lei, uma hora ou outra vai ser detido. Respeitamos os direitos dos criminosos, mas eles sabem que têm que pagar pelos erros cometidos. Ou pára de cometer erros, ou vai ser preso pela equipe da Dise. <br /></p><p><strong>Comércio - O senhor já foi ameaçado por traficantes?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Já tive algumas ameaças, mas nada muito sério. São ameaças indiretas que chegam por alguém que ouviu dizer que outra pessoa pretendia fazer alguma coisa com a gente.<br /></p><p><strong>Comércio - O senhor tem medo deste trabalho?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Não, não tenho. Trabalho aqui há muitos anos e enfrentamos de frente este tipo de crime. Este trabalho é muito importante, pois o consumo e o tráfico de drogas são um grande mal que atinge nossa sociedade.<br /></p><p><strong>Comércio - Adota algum cuidado especial de segurança?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Todos nós adotamos aqui na Dise. Ninguém relaxa com relação à segurança, mas, como já disse, o trabalho é feito dentro da lei e não humilhamos o criminoso. Isto nos garante o respeito por todos os atingidos pelo nosso trabalho.<br /></p><p><strong>Comércio - Qual a sensação de prender um traficante?<br />Pedro Dallaqua -</strong> É a sensação do dever cumprido. Tirando a droga de circulação, conseguimos evitar que muitas pessoas venham a ficar dependentes ou piorar o estado de dependência.<br /></p><p><strong>Comércio - É comum ouvir na cidade que a polícia não prende os grandes traficantes, aqueles mais ricos. O que tem a dizer a respeito?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Isto não é verdade. Temos todo o interesse em combater o tráfico em qualquer nível. Recentemente, prendemos um indivíduo que era dono de revenda de veículos. Combatemos também traficantes que atuavam dentro de universidades, universitários. O grosso é de indivíduos que vêm da periferia, onde o tráfico é mais intenso e temos mais sucesso.<br /></p><p><strong>Comércio - Mesmo com as constantes prisões, o consumo de drogas parece cada vez maior na cidade. O senhor acredita ser possível acabar com o tráfico?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Nossa esperança é que ocorra uma diminuição do consumo, tirando drogas de circulação. Também temos como objetivo a prevenção e o tratamento, mas isto não depende somente da Dise. Seria necessário um conjunto de medidas a serem adotadas pelos governos.<br /></p><p><strong>Comércio - Qual é a droga mais consumida em Franca?<br />Pedro Dallaqua -</strong> A maconha ainda é a primeira colocada, mas o consumo do crack tem aumentado. A cocaína voltou muito forte.<br /></p><p><strong>Comércio - Qual é o caminho da droga? De onde ela vem até chegar à cidade?<br />Pedro Dallaqua -</strong> A maconha, normalmente, vem do Paraguai e entra no Estado de São Paulo pela região de Presidente Prudente. A maior parte é descarregada em Ribeirão Preto e, depois, segue em menores quantidades para cá. Também há casos em que o carregamento vem direto para Franca.<br /></p><p><strong>Comércio - No mundo do tráfico não há perdão. Quem deve e não salda a dívida paga com a vida. Isto acontece em Franca?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Acontece pouco, pois, como já disse, temos conseguindo controlar as quadrilhas. Desta forma, evitamos que um indivíduo cresça tanto no mundo do crime a ponto de decidir sobre a vida ou a morte de outro.<br /></p><p><strong>Comércio - Nos grampos que realiza o senhor já conseguiu captar algum julgamento de líderes de quadrilha decidindo punições ou a vida de criminosos da cidade?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Tivemos um caso em Ribeirão Preto. Aqui, são situações de menor importância, como indivíduos que acabam furtando nos bairros. <br /></p><p><strong>Comércio - Como é feita uma investigação de combate às drogas? Qual é o ponto de partida?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Trabalhamos com informações que chegam aos investigadores de várias maneiras e também contamos com as denúncias, que começam com poucas informações e que geram prisões futuras de alguma quadrilha. Tudo é checado e vamos somando os dados. Fazemos nossas reuniões e trocamos informações. Depois de tudo apurado, é sair às ruas e efetuar as prisões.<br /></p><p><strong>Comércio - A denúncia anônima é uma das principais ferramentas de auxílio ao combate às drogas. Qual a orientação para a pessoa que desconfiar da ação de traficantes perto de sua casa?<br />Pedro Dallaqua -</strong> A pessoa deve ligar para a polícia. Garantimos o anonimato e vamos investigar todas as denúncias. Às vezes, a pessoa pode achar que não fomos verificar. Como a equipe é pequena e podemos estar acompanhando outro caso, pode demorar um pouco para ir, mas todas as denúncias são verificadas. Em seguida, começamos o serviço de investigação naquela região<br /></p><p><strong>Comércio - Neste caso, o chefe da região passa uma ordem para que o bandido não cometa crimes em locais próximos aos pontos de venda de drogas?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Exato. O líder do tráfico quer evitar que ocorra furto na sua área para evitar que a população chame a polícia. Com menos viaturas circulando na região, os traficantes acreditam que vão ter melhores condições de atuar.<br /></p><p><strong>Comércio - Qual é o período crítico em que a pessoa começa a se envolver com drogas?<br />Pedro Dallaqua -</strong> O consumo esta começando cada vez mais cedo. Já atendemos a casos envolvendo garotos de 11 e 12 anos. Eles começam com a bebida alcoólica, passam para a maconha e, depois, para as drogas mais pesadas.<br /></p><p><strong>Comércio - O Estatuto da Criança e do Adolescente oferece muitos benefícios e proteção aos menores, mas, por outro lado, muitos pais reclamam que dificultou a educação. O senhor acredita que o Estatuto possa ter facilitado que as crianças com tendência a entrar no crime o fizessem?<br />Pedro Dallaqua -</strong> O Estatuto, como lei, foi muito bem elaborado. O que falta, na minha opinião, é a implantação de tudo o que ele prevê. Com relação aos pais, o estatuto continua permitindo que haja educação. O que não se permite, é o castigo físico. Isto, comprovadamente, não funciona. O que funciona é o acompanhamento e o aconselhamento por parte dos filhos.<br /></p><p><strong>Comércio - Como os pais podem perceber se os filhos estão usando drogas?<br />Pedro Dallaqua -</strong> A maconha altera o comportamento do indivíduo. Primeiro, vai diminuir o rendimento escolar. Após passar o efeito da droga, a pessoa vai procurar se alimentar muito, terá bastante fome. Também tem outros desvios de comportamento e fica mais agressiva.<br /></p><p><strong>Comércio - Na opinião do senhor o usuário é doente ou um criminoso?<br />Pedro Dallaqua -</strong> As duas coisas, mas vejo que a principal medida com os usuários é o tratamento, buscar a recuperação. O primeiro passo, no entanto, é a prevenção e evitar que alguém use.<br /></p><p><strong>Comércio - Há pouco mais de um mês, a Polícia Civil do Estado de São Paulo entrou em greve. A paralisação está prejudicando as investigações na Dise?<br />Pedro Dallaqua - </strong>Não. As investigações na Dise continuam. Nossos trabalhos são demorados e continuam em andamento. Estamos investigando outras quadrilha na cidade. <br /></p><p><strong>Comércio - O que um policial ganha compensa o risco que ele corre?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Trabalhamos por vocação. Eu me sinto realizado porque acredito naquilo que faço. Entendo que estou contribuindo para a melhoria da sociedade. Vejo a droga como um mal muito grande, que atinge todas as classes sociais. Combatendo as drogas, a gente consegue melhorar a sociedade. Não há um reconhecimento financeiro. Isto, realmente, não acontece. Temos o reconhecimento por parte da comunidade, que confia e acredita no nosso trabalho. Isto é provado através do grande número de denúncias que recebemos.<br /></p><p><strong>Comércio - O senhor é favorável à greve?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Eu não faço parte do movimento de liderança da greve e, por isto, evito responder a este tipo de pergunta.<br /></p><p><strong>Comércio - Como avalia o confronto entre policiais civis e militares, na tarde de quinta-feira, em São Paulo?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Achei muito lamentável. Foi uma situação que deveria ter sido evitada a todo o custo.<br /></p><p><strong>Comércio - O que representa ser policial para o senhor?<br />Pedro Dallaqua -</strong> Dedicação ao trabalho 24 horas por dia sem nenhuma desculpa para deixar de atuar.<br /></p>
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