ARTIGO

O Debate sobre Raça: A Identidade Humana

Por Prof. Adelino Francisco de Oliveira |
| Tempo de leitura: 3 min

Outro dia, no decurso de uma aula de ética, uma jovem estudante colocou na roda de debates o já antigo problema sobre a existência de diferentes raças, demarcando e limitando a existência das pessoas. Olhando para as tensões racistas e antirracistas no contemporâneo, a jovem provocou se não seria um equívoco se falar em raça – negra ou mesmo branca – para distinguir e categorizar as pessoas. Trazendo concepções do campo da biologia, em uma discussão acalorada, a turma logo enfatizou que todas as pessoas pertencem a uma única e mesma espécie, a humana. Não é possível separar a espécie humana em subgrupos definidos a partir de um critério de identificação de raças.

O pensador francês Edgar Morin, com sua leitura a partir da complexidade, é incansável em ressaltar que a identidade humana se revela na tríade dinâmica entre espécie, sociedade e indivíduo. Todos pertencemos a uma mesma e única espécie humana. Esse é um vínculo universal e insuplantável entre todas as pessoas, independentemente de qualquer constituição fenotípica. Estamos inseridos em uma dada sociedade, em um determinado momento histórico, fazendo e sendo constituídos a partir de uma cultura específica. Mas há ainda a dimensão da individualidade, delineando a singularidade de cada pessoa. O indivíduo se constitui no pertencimento à espécie humana, forjado na cultura de uma sociedade em específico, tendo o planeta terra como comunidade de destino.

A fraternidade que coloca as pessoas em um único gênero, o humano, não significa a anulação da diversidade e riqueza das culturas. O indivíduo, com a potência de sua singularidade, é a síntese mais interessante da relação complexa entre espécie e sociedade. Na compreensão da identidade humana, nenhum dos termos podem ser desconsiderados. Definir e separar o ser humano, tendo como critério a cor de sua pele, representa ignorar a complexidade da relação indivíduo-espécie-sociedade. De pronto o racismo é a expressão de uma profunda ignorância e desconhecimento sobre a realidade da própria identidade humana.

A dimensão da cultura, definindo concepções de existência, deve ocupar um lugar preponderante em qualquer tentativa que se faça de compreensão e análise da identidade humana. O conceito de raça, utilizado à exaustão no contexto do século XIX, esteve à serviço, sobretudo, das teses racistas, que buscavam justificar a exploração e a opressão sobre a população negra. A identidade humana não pode ser reduzida e aprisionada a concepções ideológicas que não são capazes de considerar a intersecção complexa e relacional entre a individualidade, a espécie e a sociedade.

No contexto da aula de ética, a jovem aluna retomou a palavra naquela interessante roda de conversa, enfatizando que o conceito de raça, no entanto, tem assumido uma conotação política no contemporâneo, buscando enfatizar o pertencimento da população negra a um projeto histórico de libertação coletiva. Dizer-se da raça negra, afirmando um radical pertencimento à ancestralidade africana, representa colocar-se no bojo de uma trajetória histórica demarcada por tantas negações, violências, resistências e também lutas por emancipação. O conceito de raça, quando assumido pela população negra em uma perspectiva política, aponta para uma outra sociabilidade, pautada na ética da alteridade, na ética ubuntu, sedimentada no mais profundo e inegociável compromisso com a causa da justiça, apontando para a construção da utopia do reino da liberdade, um tempo livre de todas as formas de opressão e exploração, um tempo profundamente antirracista.

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