Região Metropolitana de Piracicaba: demagogia ou algo pra valer?

Por Professora Bebel | 10/08/2021 | Tempo de leitura: 6 min

O governo do Estado de São Paulo protocolou no último dia 21 de junho do corrente ano Projeto de Lei Complementar (PLC 22) instituindo a Região Metropolitana de Piracicaba, o qual havia sido anunciado com pompa e circunstância pelo Governador Dória em visita a Piracicaba no dia 18 do mesmo mês.

Trata-se de uma medida correta, pois vai na direção de promover a descentralização da gestão administrativa do Estado e impulsionar o desenvolvimento regional, e deveria ser recebida com júbilo não fosse o histórico anterior de absoluto descaso e abandono por parte do governo estadual e dos governos municipais, em sucessivas gestões, do arranjo trazido pela institucionalização, em 2012, da Aglomeração Urbana de Piracicaba (Lei Complementar 1.178, de 26/6/2012).

Com efeito, desde 2012, decorridos, portanto, quase dez anos, a região já passara a contar com um arcabouço institucional adequado para impulsionar o desenvolvimento regional e, graças à incompetência, descaso e inércia dos governos estaduais e municipais desde então, aquilo que poderia ser celebrado como um extraordinário avanço não passou de mera promessa demagógica, pois nada aconteceu de relevante para dar forma e conteúdo ao instituto da Aglomeração Urbana criado. O Conselho de Desenvolvimento previsto para ser instalado ainda no decorrer daquele ano de 2012, não o foi. O Conselho Consultivo, igualmente, não o foi. E o principal instrumento criado pela LC 1.178, que é o Plano Regional de Desenvolvimento, apenas em setembro de 2017 foi tornado público, quando a EMPLASA abriu uma plataforma para receber sugestões para a sua estruturação, estabelecendo-se então o prazo de 1º de março de 2018 para que tais sugestões fossem apresentadas. E esse Plano foi concluído? E foi aprovado pela Conselho de Desenvolvimento? E é de conhecimento público? Nem uma coisa e nem outra. Zero.

Ou seja, a Aglomeração Urbana de Piracicaba se constituiu num rotundo fracasso, mercê, repito, do descaso e da incompetência dos sucessivos governos estaduais e municipais ao longo de quase dez anos. O Parlamento Regional da Aglomeração Urbana de Piracicaba - PRAUP, que congrega os representantes do poder legislativo regional, foi criado dias atrás e, apesar de tardiamente, é um fato pelo menos auspicioso.

Mas não é apenas a região de Piracicaba que tem pagado esse preço. Se examinarmos o que tem ocorrido nas demais regiões, seja as que conformam aglomerações urbanas, seja as que conformam regiões metropolitanas, o fracasso é semelhante. Aqui e ali acontece algo de alguma relevância, mas não tem sustentabilidade, não para de pé, pois o próprio governo estadual não acredita no processo de desenvolvimento urbano-territorial. Vejamos o absurdo. Em maio de 2019, o Governo Dória extingue a EMPLASA, que era o órgão encarregado de dar suporte técnico às regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, realizando diagnósticos e liderando a elaboração dos planos de desenvolvimento. Esse papel e todo o acervo da EMPLASA migraram para a Secretaria de Governo e Secretaria de Desenvolvimento Regional, que não têm estrutura e nem competência institucional para tal responsabilidade.

A institucionalização, portanto, da Região Metropolitana de Piracicaba traz a dúvida procedente: pirotecnia demagógica ou é para valer?

Na Exposição de Motivos do PLC 22, à guisa de justificar a medida, o governador menciona a realização de audiência pública no dia 8 de maio de 2021, dando a entender que os poderes públicos municipais e a sociedade em geral, representativos dos 25 municípios envolvidos, reunidos nessa audiência, deram um aval consistente ao projeto. Perguntas: essa audiência aconteceu mesmo e, se aconteceu, teve uma representatividade robusta? Bem, aqui em Piracicaba, salvo melhor juízo, não teve impacto algum, pois a sociedade em geral não ficou sabendo de sua realização e, portanto, não se mobilizou.

Apesar dessa tíbia sustentação política, o governo estadual protocolou o PLC 22 na Assembleia Legislativa em regime de urgência, querendo passar à sociedade a impressão de que tem pressa. Contudo, conforme se verifica no parágrafo único do artigo 4º desse PLC, as estruturas da governança interfederativa - a saber, Conselho de Desenvolvimento, Comitê Executivo e Entidade Autárquica - não foram criadas nessa oportunidade, postergando-se essa providência para um futuro Projeto de Lei Complementar, ficando sem definição quando isso ocorrerá. Por que não se concluiu primeiramente a preparação completa da matéria, detalhando-se referidas estruturas de governança, que são chaves para o efetivo funcionamento da Região Metropolitana de Piracicaba, antes de enviá-la à Assembleia?

Curiosamente, em 20 de maio último, portanto há apenas um mês atrás, o governo estadual encaminhou o PLC 15 para criar a Região Metropolitana de São José do Rio Preto e nele o texto sobre a governança interfederativa guarda muita diferença com o do PLC 22, relativo à Região Metropolitana de Piracicaba. No caso de São José do Rio Preto, por exemplo, há um detalhamento das estruturas da governança interfederativa, ao passo que no caso de Piracicaba inexplicavelmente remete-se esse detalhamento para um futuro PLC. No caso de São José do Rio Preto, o Conselho de Desenvolvimento não prevê a participação da sociedade civil, prevendo-a apenas no âmbito do Conselho Consultivo. No caso de Piracicaba, corretamente, a meu ver, prevê-se a participação da sociedade civil no Conselho de Desenvolvimento e não existe a previsão do Conselho Consultivo. Durma-se com um barulho desses. Por que essa discrepância de tratamento para projetos da mesma natureza e objeto? Ou se trata de mero bate-cabeça nos âmbitos técnico e decisório do governo do estado ou é malabarismo diversionista para dificultar a implementação de ambos os projetos. Ou ambas as coisas.

Ciente dessa eventual manobra, protocolei emenda ao PLC 22, no capítulo das Disposições Transitórias, colocando prazo de 90 dias, a contar da data da sua promulgação, para que o Poder Executivo Estadual encaminhe ao Poder Legislativo Estadual a proposta de dispositivo legal que criará as estruturas de governança interfederativa, conforme prevê o parágrafo único do artigo 4º daquele PLC. Avaliei que sem a exigência de prazo, o governo estadual procrastinará indefinidamente essa matéria tão relevante para o real funcionamento da Região Metropolitana de Piracicaba.

Apresentei outra emenda ao PLC 22, incidente no mesmo artigo 4º, que autoriza o Poder Executivo Estadual a constituir Consórcio Público, em conjunto com os municípios integrantes da Região Metropolitana de Piracicaba, nos termos da lei federal 11.107, de 6 de abril de 2005. Tal medida, se aprovada, criará condições para que a Região Metropolitana de Piracicaba alcance maior robustez e eficácia institucional e operacional na governança interfederativa.

Estou convicta de que a Região Metropolitana de Piracicaba deve ser criada e vou lutar na Assembleia Legislativa pela sua aprovação, com os aperfeiçoamentos que propus e outros que surgirem no curso dos debates naquela Casa, pois é uma exigência de governança administrava necessária ao desenvolvimento urbano integrado regional.

Adotei uma postura crítica diante dessa matéria e procurei expressá-la aqui, com vistas a impedir que a sociedade seja iludida pela demagogia e veja escapar pelas mãos, mais uma vez, algo tão importante para o seu desenvolvimento. Não descansarei um minuto e não darei trégua até que tenhamos a certeza de que o projeto ganhou a sua materialidade necessária e definitiva.

Professora Bebel é deputada estadual, presidenta da Apeoesp e líder da bancada do Partido dos Trabalhadores na Assembleia Legislativa de São Paulo

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