Nossa liberdade está indo pelo ralo

Por Editorial JP | 05/04/2021 | Tempo de leitura: 3 min

Situações anormais exigem medidas extraordinárias. É válido o ditado popular? Até certo ponto sim. Porém, nem sempre tais «medidas extraordinárias» são válidas ou devem ser utilizadas. Há muito que se avaliar na balança das perdas e dos ganhos. Mas não é só isso. É uma boa hora para refl etir sobre a real função do Estado, de seus governantes e legisladores.

Estamos tão acostumados a viver sob a tutela de um Estado que pagamos impostos altos sem nem mesmo questionar «por que fazemos isso?». O Estado nos impõe multas de trânsito se desrespeitamos uma velocidade que nem sequer concordamos em limitar. Tudo isso em prol de um suposto e muito subjetivo «bem comum». Criam-se teorias fabulosas de que o bem público deve prevalecer em relação ao bem privado. Mas esquecem- -se que sem a vida privada não há vida pública, pois esta precede àquela.

Aí temos uma pandemia mundial de vírus cuja letalidade mundial é de cerca de 2,20% e no Brasil, de 2,51% (dados extraídos do site www.worldometers.info). Ou seja, a cada mil pessoas infectadas, 22 morrem no mundo e 25 morrem no Brasil. Trágico, sem dúvida. Mais trágico ainda, porque esse mesmo Estado que aceitamos que nos tutelasse, não está devidamente aparelhado com suporte médico-hospitalar adequado. Fico pensando nas proporções gigantescas de infectados e mortes que a febre espanhola dizimou nos anos 1916- 1918. Aquilo sim foi uma crise sanitária sem precedentes, inclusive para Piracicaba.

Não se trata de negar a existência do vírus nem sua gravidade nem sua letalidade e muito menos sua rápida propagação. Mas também precisamos olhar para a nossa liberdade: sim, essa mesma que estão nos tirando pouco a pouco. Ao elegermos um governante demos a ele poder para retirar nossa liberdade de ir e vir? Onde está o fundamento constitucional para tantas restrições? Bem, é fácil achar um: o direito à vida.

Mas e o direito à liberdade? Também este direito não é algo que prezamos, até mesmo acima da própria vida? Péricles, ao convocar os atenienses para a Guerra do Peloponeso invocou justamente a precedência da liberdade sobre a vida, pois para o líder ateniense a vida não valia a pena se lhe fosse tirada sua liberdade.

É fácil justificar medidas extremamente autoritárias por conta de uma crise sanitária que nos ceifa vidas. É um estado de guerra: uma batalha que estamos travando contra uma doença infecciosa nova e de rápida propagação. Mas até que ponto estaremos dispostos a ceder (voluntariamente) ao Estado nossa liberdade para o bem comum? Se é que estamos mesmo cedendo nossa liberdade para um real bem comum. Há comprovações científi cas irrefutáveis de que o isolamento social, o lockdown e a restrição de andar à noite pelas ruas da cidade (até isso!!) realmente tenha um efeito real para reduzir a propagação do vírus? Mas supondo que todas essas medidas restritivas que nos impõem terão real eficácia nessa luta contra o coronavírus, elas ainda seriam justifi cáveis a ponto de cedermos (voluntaria ou involuntariamente) nossa liberdade? Essa é uma resposta que cada um deve dar a si mesmo. Não há certo ou errado. Numa democracia (se é que vivemos em uma) há apenas o que se quer e o que não se quer.

Mas o poder é sempre tentador. E em ocasiões como essa, abre-se naturalmente o caminho para autoritarismo: é preciso restringir a liberdade individual para poupar vidas. Difícil argumentar contra essa sentença. O Estado nos coloca como assassinos em potencial. Quando, em verdade, a causa maior da mortalidade é a falta de estrutura médico-hospitalar do Estado, incapaz de atender a todos os infectados em estado grave.

Já se passou um ano desde o primeiro infectado com o covid-19. Talvez seja o momento de refl etirmos o quanto essa pandemia custou para nossa liberdade. E se estamos dispostos a novamente abrir mão dela quando o próximo vírus surgir. Ou seremos eternos prisioneiros dos governos autoritários em nome de um bem comum?

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