HISTÓRIA

Protestos: movimento conservador se apropriou da insatisfação de 2013, avaliam analistas

Pesquisadoresargumentam que não há causalidade direta entre os protestos de 2013 e as manifestações dos anos seguintes pelo impeachment de Dilma e a ascensão do bolsonarismo

Por Débora Brito | 19/06/2023 | Tempo de leitura: 3 min
São José dos Campos

Fábio Pozzebom / Agência Brasil

Protestos de 2013 foram marcados pela massificação e diversidade de pautas
Protestos de 2013 foram marcados pela massificação e diversidade de pautas

Após dez anos, os protestos de junho de 2013 ainda provocam leituras diversas sobre suas implicações e desdobramentos. Seria ou não o ovo da serpente do movimento conservador e retrógrado que emergiu no país nos últimos anos? Analistas avaliam que houve uma apropriação política pelo movimento de direita.

Para Sean Purdy, professor do Departamento de História da USP (Universidade de São Paulo), não há uma continuidade direta entre as jornadas de 2013 e os fatos políticos seguintes. "Existe um movimento que diz que junho foi o ovo da serpente, mas há uma divisão entre as jornadas de junho e o que aconteceu depois".

O especialista argumenta que o avanço do discurso da moralidade na última década e que justificou a ascensão de movimentos ultra conservadores, não era a principal demanda de 2013. "Segundo pesquisa do Ibope, 80% das pessoas que participaram do início dos protestos de 2013 nas capitais disseram que estavam na rua pelo transporte ou melhoria nos serviços públicos. Só 20% estavam na rua contra corrupção. Isso é importante porque depois do dia 20 de junho e, principalmente no ano seguinte, a corrupção se tornou a pauta principal dos movimentos que acabaram no impeachment", disse Purdy.

O historiador reforça que houve um "sequestro" do sentimento de inconformismo de 201" e que, a partir de 2013, o movimento de direita conheceu o caminho das ruas.

Para o sociólogo e pesquisador do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), Jonas Medeiros, as manifestações de 2013 devem ser analisadas dentro do chamado ciclo de protestos, que teria sofrido um ponto de virada a partir de 2011, quando eclodiram várias greves pelo país, e prosseguiu após 2013, com a mobilização de estudantes secundaristas em São Paulo, a chamada primavera feminista, entre outros movimentos que têm bandeiras bem diferentes da direita.

"As maiores responsabilidades para construção desse processo que culmina no impeachment da Dilma e na eleição do Bolsonaro estão com atores políticos da centro-esquerda e da centro-direita", explica Medeiros.

Do lado da esquerda, houve dificuldade do PT, que estava na presidência na época dos protestos, em aproveitar as potencialidades dos protestos e dialogar com as demandas lançadas nas ruas. "Teve muita criminalização e estigmatização. Basicamente, o governo virou as costas e isso foi piorando o grau de interpretação negativa", afirma.

Do outro lado, a centro-direita não conseguiu apresentar um projeto presidencial que atendesse aos anseios das classes conservadoras. "É um processo de perda da legitimidade da centro-direita diante desse eleitorado conservador e um pouco da dificuldade do PT de reconhecer que novos atores estavam entrando em cena a partir de 2013", avalia Medeiros.

PESQUISAS.

Os professores também reforçam as diferenças de perfil sociodemográfico e ideológico dos participantes dos protestos de 2013 e das manifestações que ocorreram nos anos seguintes.

"Temos um perfil de pessoas muito jovens em junho de 2013,  a média de idade era de 20 e poucos anos. Na campanha pró-impeachment, a média de idade era 44 anos. Tem uma diferença inclusive de renda. Em 2013, a manifestação é mais popular e nos protestos de 2015, a mobilização é em um grau gigantesco da classe média alta", comentou Medeiros.

Na questão ideológica, em 2013 as pessoas se identificavam em primeiro lugar como de centro, em segundo como esquerda e terceiro como centro-esquerda. Nos protestos pró-impeachment, os manifestantes se identificavam como centro, direita e centro-direita. E nos protestos bolsonaristas, a identificação é somente com a direita e centro-direita.

Apesar das diferenças, a indignação de 2013 ainda ecoa. "Estamos hoje numa situação pior, em termos políticos e econômicos. Não foi feita nenhuma reforma e ainda estamos reféns de todas as falcatruas da política", conclui Purdy.

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