O aumento do número de praticantes de corrida de rua no Brasil tem vindo acompanhado de um alerta médico: casos recentes de morte súbita durante provas reacenderam o debate sobre a importância da avaliação cardiológica antes da prática esportiva, especialmente entre corredores amadores. Especialistas reforçam que a corrida é benéfica para a saúde do coração, mas exige preparo, acompanhamento e exames adequados.
Neste ano, alguns episódios ganharam repercussão nacional, como o de um empresário que morreu durante uma prova de 21 quilômetros em João Pessoa (PB) e, em Porto Alegre (RS), um estudante de 20 anos sofreu um mal súbito após completar uma maratona e não resistiu. Os casos, embora ainda sob investigação, levantaram suspeitas de arritmia cardíaca e mobilizaram profissionais da área da saúde e organizadores de eventos esportivos.
Segundo o cirurgião cardíaco do Hospital São Vicente de Paulo, de Jundiaí, Dr. Alexandre Zilli, a preocupação é constante no meio médico. “É uma prática excelente para a saúde e para a prevenção e tratamento de doenças do coração, mas cuidados precisam ser tomados”, afirma. De acordo com o especialista, a principal causa de morte súbita em atletas é a cardiomiopatia hipertrófica, uma doença genética caracterizada pelo espessamento do músculo cardíaco e associada a maior risco de arritmias.
O cardiologista ressalta que a avaliação médica deve anteceder qualquer atividade física regular. “Antes de iniciar qualquer atividade física é imprescindível passar por um médico e fazer uma avaliação criteriosa”, destaca. O tipo de exame indicado varia conforme a intensidade do esforço, mas a consulta com um cardiologista já permite identificar fatores de risco importantes. “É um pré-requisito fundamental”, completa.
O Dr. Alexandre também explica que atletas com comorbidades, como hipertensão, diabetes e colesterol elevado, além daqueles com histórico familiar de doenças cardíacas, precisam de acompanhamento ainda mais rigoroso. “Esses atletas são mais suscetíveis a problemas no coração e devem passar por avaliações mais minuciosas”, alerta.
Outro grupo que exige atenção são os chamados “atletas de fim de semana”. “São pessoas que, muitas vezes, não estão preparadas para o tipo de exercício que vão realizar, não se alimentam direito, não dormem bem e não se hidratam adequadamente. O treinamento precisa ser progressivo, acompanhado e respeitar os limites do corpo”, explica o médico.
O uso indiscriminado de suplementos também preocupa. De acordo com o especialista, é comum o consumo de substâncias estimulantes, como pré-treinos, energéticos e até suplementação hormonal, que podem ser prejudiciais ao coração. “Esses produtos aumentam o risco de arritmias, especialmente quando usados em altas doses ou sem orientação médica”, afirma. Ele ressalta, no entanto, que algumas suplementações podem ser benéficas, desde que prescritas e controladas dentro das doses adequadas.
VIROU LEI
A discussão sobre prevenção ganhou força também no campo legislativo. Em João Pessoa, a Câmara Municipal aprovou um projeto de lei que torna obrigatória a apresentação de atestado médico para a inscrição e participação em corridas de rua, tanto competitivas quanto participativas. A declaração deverá ser emitida por médico com registro no CRM, ter validade máxima de 12 meses e atestar a plena aptidão física do participante.
Pelo texto aprovado, caberá às organizações dos eventos exigir e manter a documentação dos atletas, podendo disponibilizá-la aos órgãos fiscalizadores. Em caso de descumprimento, estão previstas advertência, multa de R$ 5 mil em caso de reincidência e até suspensão da autorização para realização de novos eventos no município.