Dom Gil Antônio Moreira, Arcebispo de Juiz de Fora, em conversa sobre crianças, contou-nos a respeito de um menino do projeto no contraturno escolar daquela Arquidiocese. Dava muito trabalho de disciplina nas atividades. Ouviram o pai. Filho único. Residem em área de invasão. A mãe, dependente química, evadiu-se para outra cidade. Às vezes, alguém a vê de passagem nas vielas abandonadas. O pai, trabalhador braçal, de lucidez reduzida, não tinha com quem deixar o filho.
Temia que ele se envolvesse com a criminalidade. Saía cedo para trabalhar e deixava o filho “protegido” numa casinha de cachorro. Soltava-o na hora do almoço e depois o encaminhava às aulas escolares. Era sua percepção de cuidado. Isso integra a invisibilidade de tantos. Quando soube do projeto na cidade, matriculou-o de imediato. Nas primeiras semanas, no entanto, o menino “esticava as asas acuadas” com violência, após ficar vários meses na casinha de cachorro.
Aconteceu na reunião da Pastoral da Mulher/ Magdala. Comentava sobre o encontro de Zaqueu com Jesus. Zaqueu era malvisto pelo povo por ser chefe dos cobradores de impostos. Jesus o viu e disse que iria à sua casa. De coração transformado pela graça, sem prejudicar as pessoas, recebeu o perdão do Senhor e passou a segui-Lo. Citei como exemplo o caso recente do casal que adotou os três filhos, maltratando dos meninos e preservando, pelo que se sabe, a menina. Se houver conversão por parte deles, não deixarão de cumprir aquilo que a lei determina, mas poderão se reconciliar com Deus. Uma das integrantes, que se encontrava embriagada, não compreendeu a minha fala e imaginou que me referia a ela, que teve quatro filhos tirados pela Justiça e adotados. Ficou nervosa demais, brava comigo, querendo se explicar e afirmando que foram bem criados pela família que os recebeu.
Percebemos, de imediato, que a ferida de não poder criar um filho, por razões diversas, nem o álcool cicatriza ou assopra. Que dolorido!
Gosto demais das reflexões sobre o sentido da cruz: as nossas com a de Jesus Cristo.
Domingo passado, na Igreja “Festa de Cristo Rei”, o Evangelho de Jesus crucificado entre dois ladrões, o Padre Márcio Felipe, Reitor e Pároco do Santuário Diocesano Santa Rita de Cássia, comentou que a dor encontra seu cuidado na Cruz do Senhor, através da fé, na qual poderemos encontrar dias melhores. Enquanto tantos buscam o poder pelo poder, por suas regalias, enxergando as pessoas apenas como votos, Jesus reina no alto da Cruz, com coroa de espinhos. Seu trono é a Cruz. Não reina pela força, mas no coração de quem se entrega.
Convidou-nos a rezar: “Jesus, lembra-Te de mim em Seu Reino e ajuda-me a não me esquecer de Ti”.
Ouvi dele que o Céu tem lugar até para quem consideramos que não deveria estar aqui.
Nosso Deus é o Deus dos vivos conforme reforçou, no sábado, na Missa no Carmelo, nosso Bispo Emérito, dom Vicente Costa, a partir do Evangelho de Lucas (20, 37.38): "... Moisés também o indicou na passagem da sarça, quando chama o Senhor o Deus de Abraão, o Deus de Isaac e o Deus de Jacó. Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos, pois todos vivem para ele." Caminhamos para a Eternidade que passa pela Cruz. Os das margens, sem dúvida, me precederão.
Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista