OPINIÃO

Saia da bolha: não vivemos no seu mundo paralelo


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Caro leitor. Nos últimos dias, a internet se alvoroçou com uma fala de um apresentador de TV que "luta" pela causa do Autismo: " Eu tenho pena de quem não tem um filho Autista", disse o apresentador. Eu, não tenho um filho atípico, mas, como Psicopedagoga e Neuropsicopedagoga, atendo muitas crianças e suas famílias.

Sei as lutas que essas famílias enfrentam. Sei as batalhas que essas famílias, principalmente as mães, enfrentam para colocarem em vigor direitos que são garantidos aos seus filhos.  Direitos esses, garantidos,mas não adquiridos.

Quando eu vi o vídeo e ouvi a declaração acima citada, pensei: Dentro dessa bolha, a vida é diferente. Muito diferente da realidade das famílias atípicas que estão vivendo uma vida real aqui na terra.

Sim, imagine a cena. Você tem diabetes, porém, você vive uma vida na qual, você tem ao seu dispor, alimentos zero açúcar de todos os tipos, legumes, verduras, frutas das mais diversas, uma alimentação ricamente natural, orgânica, além de um convênio de primeiríssima qualidade , cujo   o médico, caso você precise, vem até a sua casa para lhe examinar.

Então você, romantizando a sua situação que, apesar da doença, está no controle e na abundância, senta-se à mesa para o seu rico e delicioso almoço e pensa: " Tenho pena de quem não tem Diabetes".

Será que aqueles que possuem Diabetes e que não tem condições de comer legumes, verduras, frutas todos os dias, não têm um convênio médico e que, para passar em uma consulta com um especialista depende da vontade de Deus e que o dinheiro só possibilita comer arroz, feijão e carne, se tiver,são felizes porque possuem Diabetes?

Uma pessoa que possui os melhores tratamentos, os melhores médicos dentro e fora do país, uma conta bancária milionária, terapias, quantas forem necessárias, resumindo: tudo de melhor que o dinheiro pode pagar para uma qualidade de vida excepcional do filho  com Autismo, acha que tem bagagem para usar a própria régua social para medir a vida social do outro? Para medir a vida de famílias que, a única coisa que têm em comum com ele é o Espectro Autista dos filhos?

É preciso que as pessoas parem de romantizar algo que não é lindo, não é fácil, não é tranquilo: o Autismo. Não importa o nível de suporte, o Autismo é um sofrimento para quem possui e para quem cuida. As famílias que cuidam de uma pessoa com Autismo e que precisa do serviço público, além de precisarem sobreviver com benefícios que, muitas vezes são cortados, sentem o coração se despedaçar e os ouvidos arderem com uma declaração infeliz dita pelo apresentador.

Que as pessoas aprendam a olhar com empatia para o outro e para a condição do outro, pois, nem todos vivem na mesma bolha como se estivessem em um universo paralelo. A vida real não é para amadores e a vida das famílias atípicas reais não é fácil. Pense nisso.

Micéia Lima é pedagoga, psicopedagoga e neuropsicopedagoga na ONG ‘A casa do Ney’ 

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