Historicamente, os municípios brasileiros não foram criados de forma planejada. O crescimento desordenado, aliado a zoneamentos pensados sem considerar o fluxo de pessoas e veículos, tornou-se a regra. Isso explica por que corredores de ônibus rápido, metrôs ou até ciclovias são tão difíceis de implementar em boa parte das cidades médias: as ruas e avenidas simplesmente não foram idealizadas para comportar sistemas modernos de transporte coletivo. Some-se a isso a falta de visão de gestores que, muitas vezes, não compreendem a necessidade de políticas de mobilidade acessíveis, tais como: transporte público gratuito ou a valores módicos, que afeta diretamente a economia local e a qualidade de vida da população.Planejar o crescimento urbano não significa apenas abrir ruas ou aprovar loteamentos. Significa pensar a cidade como um organismo vivo, que precisa ser eficiente, sustentável e acolhedor. Uma cidade organizada gera mais empregos, atrai investimentos, melhora o ambiente de negócios e oferece aos cidadãos condições dignas de deslocamento, moradia e convivência.
Do ponto de vista jurídico, o principal marco regulatório é o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), que estabeleceu diretrizes gerais da política urbana no Brasil. Ele exige que os municípios com mais de 20 mil habitantes elaborem um Plano Diretor, instrumento básico de ordenamento territorial. O Plano Diretor deve definir regras de zoneamento, uso e ocupação do solo, preservação ambiental, além de prever medidas que garantam mobilidade urbana sustentável. O problema é que, em muitos municípios, esse instrumento acaba engavetado ou reduzido a um documento burocrático, sem efetiva participação social e sem análise técnica e jurídica especializada. Outro ponto central são as leis de zoneamento urbano, que delimitam onde pode haver habitação, comércio, indústrias e áreas verdes. Quando mal feitas elas incentivam a segregação espacial: bairros distantes, sem infraestrutura, obrigam o cidadão a depender de carro para acessar emprego, saúde ou educação. Por outro lado, zoneamentos inteligentes favorecem o chamado “adensamento equilibrado”: permitir que habitação, trabalho e lazer coexistam em áreas próximas, reduzindo a necessidade de deslocamentos longos. É aqui que reside a chave para cidades mais humanas e funcionais.
Não se trata apenas de uma questão técnica, mas também política. O planejamento urbano deve ser entendido como uma política de Estado, e não de governo. Isso significa que ele precisa resistir às mudanças de gestão e ser construído de forma participativa, com audiências públicas, conselhos municipais e instrumentos de transparência. Cidades médias que negligenciam esse debate correm o risco de reproduzir problemas graves das grandes metrópoles: congestionamentos intermináveis, desigualdade territorial e altos custos de manutenção da infraestrutura. O planejamento urbano não é luxo: é requisito para que o cidadão viva melhor e para que a cidade se torne um polo de desenvolvimento e oportunidades.
Marcelo Souza é advogado, consultor jurídico e mestre em Direito Constitucional (marcelosouza40@hotmail.com)