Dê atenção à seguinte observação do mundo do futebol:
“O medo de perder tira a vontade de ganhar.”
Tal frase foi atribuída a Vanderlei Luxemburgo (mas há controvérsias, pois se diz que ela foi uma adaptação do empresário americano Robert Kiyosaki, que se referia a “ação de ‘perder dinheiro inicialmente’, investindo em educação corporativa para ganhar mais dinheiro posteriormente com o lucro da produtividade de funcionários mais capacitados”). Porém, o autor pouco importa, mas o que vale é: ela tem sentido no que diz?
Particularmente, eu penso que sim. Boa parte dos clubes, quando estão empatando, não são ousados em determinados momentos que poderiam ser, e abrem mão da vitória justamente para não serem contra-atacados e tomarem um gol – comprovando que se abre mão de ganhar para garantir que não se perderá.
Considere, na tabela de pontuação, quem estaria à frente: um time ousado, que jogou 3 vezes e possui 1 vitória + 2 derrotas, ou aquele que não perdeu nenhuma mas tem 3 empates?
Ambos terão 3 pontos, mas o critério de desempate faz o primeiro ter vantagem.
Jorge Sampaoli, quando foi técnico do Atlético Mineiro e do Santos, por exemplo, tomou muitos gols, mas ele mais venceu e perdeu do que empatou, naquelas passagens. E apesar de não ter conquistado títulos, conseguiu dar brilho aos jogos de futebol (no Flamengo, não vale contar, pois ali ele e a sua comissão técnica se perderam pela vaidade). Será que um treinador mais conservador não teria o mesmo rendimento em pontos do que ele, com um futebol burocrático e enfadonho?
Vide o próprio Vanderlei Luxemburgo antes de ser “derrubado” pelos atletas naquele famoso Palmeiras x Coritiba (da “entregada” dos jogadores que queriam a sua demissão) e ceder seu lugar para Abel Ferreira: a busca dos seus times era de vencer, vencer ou... perder. Lembram da fase em que Tite era ironizado pelo apelido de “empaTite” (mas depois ele se atualizou)? Ou um pouquinho mais longe: os times pragmáticos do gaúcho Celso Roth, que não tinham vergonha de jogar feio?
Aqui, difere-se algo importante:
- o time que joga prioritariamente para não perder (como o citado Celso Roth, ou ainda o saudoso Milton Buzzeto, o “Rei da Retranca”, e
- o time que busca o gol e, conseguindo-o, joga para segurar o resultado (como Felipão fazia em determinado momento de sua carreira, ou o falecido Marcelo Veiga no Bragantino).
São dois estilos que contradizem os times montados de Pep Guardiola, Jurgen Klopp, Marcelo Bielsa e outros dessa linha. Mas, evidentemente, a primeira justificativa será: “eles trabalham com mais recursos financeiros e podem escolher a dedo os jogadores que querem para implantar tal metodologia”.
Será verdadeira tal afirmação? Talvez sim, talvez não. Veja o que faz Fernando Diniz (que chegou a liderar o Brasileirão com o São Paulo e depois vencer a Libertadores com o Fluminense – embora sabemos que ele tem um ápice e depois não consegue render tanto): ele busca o gol, podendo fazer 4 tentos, mesmo que levando 3.
Os mais jovens não se lembram: a vitória no futebol valia, antigamente, 2 pontos (e o empate sempre valeu 1). Na Copa do Mundo de 1994, nos EUA (de baixíssimo nível técnico) tivemos uma quantidade enorme de empates na primeira fase e a FIFA resolveu valorizar mais a vitória, atribuindo 3 pontos.
Com a mudança, empatar era algo evitável ao máximo (hoje, nos acomodamos)! Eduardo José Farah, nos anos 90, criou algumas alterações no Paulistão: empatar sem gols levaria o jogo para uma disputa de pênaltis, onde o vencedor levaria 1 ponto e o perdedor nada. Vitórias com mais gols poderiam ter mais pontos, e outras invencionices. E isso me leva a questionar: e se as vitórias valessem mais pontos?
Não me canso de viajar no mundo do achismo: como as equipes atuariam, caso uma vitória valesse 4 pontos? Teria um dinamismo maior em campo? Ou ninguém arrisca a mudança, com medo de uma ou duas equipes de ótima qualidade dispararem na tabela e fazerem um campeonato “à parte”?
Confesso: tenho curiosidade num teste de nova pontuação.
Rafael Porcari é professor universitário e ex-árbitro profissional (rafaelporcari@gmail.com)