Ao reorganizar antigos arquivos do período em que exerci o mandato de vereador em Jundiaí, deparei-me com uma série de documentos que trouxeram à tona lembranças importantes da minha trajetória pública. Entre eles, reencontrei um ofício que me é especialmente caro. Nele, encaminhava ao então Ministro da Cultura, Celso Furtado, a Moção nº 182/86, de minha autoria, solicitando ao Condephaat o tombamento do conjunto de prédios das oficinas da antiga Companhia Paulista de Estradas de Ferro. À época, o complexo pertencia à Fepasa e já abrigava o Museu Ferroviário “Barão de Mauá”, criado com o propósito de preservar, em Jundiaí, parte fundamental da memória ferroviária nacional.
Pouco tempo depois, recebi um ofício do Ministério da Cultura informando que, a partir daquela iniciativa, o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) havia formalizado ao Condephaat seu interesse no pleito. A Moção 182/86 foi, portanto, o documento que deu início ao processo que culminou com o tombamento desse valioso conjunto arquitetônico, hoje reconhecido como um marco da história ferroviária brasileira. Ela possui, portanto, um valor simbólico pois consta da abertura do processo de tombamento.
Nos relatórios da Companhia Paulista de 1891 e 1892, encontra-se registrada a decisão estratégica de transferir as oficinas de Campinas para Jundiaí, diante da impossibilidade de expansão no local original. A companhia, então já com uma frota considerável de 42 locomotivas e 1.256 veículos, optou por Jundiaí por dispor de grande área disponível junto à linha férrea e por ser o ponto inicial da estrada de ferro.
Para os funcionários, a Companhia construiu ao lado das oficinas um conjunto de moradias: “Achando-se já prontas 40 casas” (relatório de 1894) . Os documentos resgatam com precisão os esforços, os ideais e os investimentos por trás da construção desse complexo, que viria a transformar o perfil urbano e econômico da cidade.
Não tenho dúvidas do significado histórico e simbólico desse tombamento. Ele impediu que as oficinas fossem demolidas, desfiguradas ou descaracterizadas, garantindo a preservação de um patrimônio que, se perdido, representaria uma lacuna irreparável na memória da ferrovia brasileira.
Mais do que uma ação administrativa, o tombamento foi um gesto de compromisso com a história de Jundiaí e com os trilhos que ajudaram a construir o Brasil. Ao reencontrar esse ofício, percebo que alguns papéis, embora amarelados pelo tempo, continuam vivos na memória — e, sobretudo, na alma de quem ama esta cidade e acredita que preservar o passado é também uma forma de cuidar do futuro.
Francisco Carbonari é ex-secretário de educação de Jundiaí (fjcarbonari@gmail.com)
Comentários
2 Comentários
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MARCELLO PUCCI 16/07/2025Caríssimo Professor, graças ao seu gesto, os trilhos da história da memória ferroviária continuam vivos — conduzindo identidade, cultura e orgulho para Jundiaí e para o Brasil! Parabéns, e obrigado por compartilhar esta lembrança! -
jorge luiz vernaglia 15/07/2025Parabéns professor. Como sempre, chegando antes do futuro, com muita sobriedade e sabedoria.