OPINIÃO

O envelhecimento não é problema, é projeto


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O mundo está envelhecendo. Esta não é uma projeção para o futuro distante, mas uma realidade concreta que já molda as políticas de saúde, os serviços sociais e a organização das cidades. Entre os diversos conceitos que norteiam a prática geriátrica, os chamados "7 Is da Geriatria" configuram-se como um marco teórico e prático indispensável. Cada "I" representa uma condição ou desafio comumente enfrentado pelos idosos e que deve ser abordado de maneira integrada, individualizada e interdisciplinar: 

Imobilidade

Imobilidade, na geriatria, é definida como a redução progressiva da capacidade de se mover de forma independente, muitas vezes levando ao acamamento. Ela não é apenas uma consequência do envelhecimento biológico, mas resultado de condições médicas mal manejadas, hospitalizações prolongadas e falta de estímulo à mobilidade no dia a dia.

As causas mais comuns incluem doenças osteoarticulares (como artrose), neurológicas (como AVC e Parkinson), uso excessivo de medicamentos sedativos e ambiente não adaptado. As consequências vão desde atrofia muscular até complicações graves como tromboses, pneumonias, úlceras de pressão e perda da autonomia.

A abordagem exige uma estratégia multidisciplinar, envolvendo fisioterapeutas, educador físico, terapeutas ocupacionais, enfermeiros e cuidadores, com foco na prevenção da imobilidade através da estimulação precoce, adaptação do ambiente domiciliar e manutenção da funcionalidade.

Instabilidade Postural (Quedas)

As quedas representam uma das principais causas de hospitalização e morte em idosos. A prevenção de quedas é uma das ações centrais da geriatria. Ela inclui a avaliação sistemática dos fatores de risco, treinamento de marcha e equilíbrio, revisão de medicações, correção de problemas visuais e adaptação do domícilio com barras de apoio, eliminação de tapetes e melhoria da iluminação.

Incontinência

A incontinência urinária ou fecal é uma condição comum, mas frequentemente subnotificada devido ao estigma social. Suas causas variam entre alterações musculares, neurológicas, infecciosas ou efeitos de medicamentos.

Para além do desconforto físico, a incontinência compromete a autoestima, contribui para o isolamento social e aumenta o risco de institucionalização. A abordagem deve incluir identificação do tipo de incontinência (urgência, esforço, mista ou funcional), treinamento vesical, fisioterapia pélvica, revisão medicamentosa e, quando indicado, uso racional de fraldas. Mais do que tratar, é fundamental desestigmatizar a incontinência, promovendo acolhimento e autonomia.
Iatrogenia

A iatrogenia é definida como qualquer dano à saúde causado por intervenção médica, incluindo erros de prescrição, interações medicamentosas, exames desnecessários ou procedimentos mal indicados. Idosos são particularmente vulneráveis à iatrogenia devido à polifarmácia e à maior sensibilidade às medicações. Estudos mostram que até 30% das hospitalizações de idosos são causadas por reações adversas a medicamentos.

A geriatria moderna defende o uso racional de fármacos, com avaliação periódica da necessidade de forma individual.

Insuficiência Cognitiva

Definida como o declínio das funções mentais como memória, atenção e linguagem, a insuficiência cognitiva pode variar de um leve comprometimento até quadros de demência estabelecida, como Alzheimer e outras doenças neurodegenerativas. O impacto é profundo: perda de autonomia, dificuldade nas atividades diárias e sobrecarga para familiares e cuidadores. O manejo inclui estimulação cognitiva, ambiente estruturado, suporte psicossocial e, em alguns casos, medicação.
Insônia e Distúrbios do Sono

O sono do idoso sofre alterações fisiológicas, mas a insônia patológica interfere diretamente na qualidade de vida, no humor, na cognição e na imunidade. Causas frequentes incluem dor crônica, depressão, ansiedade, apneia do sono e uso de medicamentos. O tratamento vai muito além de sedativos. Envolve higiene do sono, rotina regular, atividade física, exposição à luz natural e, quando necessário, intervenção psicoterápica ou farmacológica com critério.

Isolamento Social

O último "I", mas não menos importante, é o isolamento social. Vivenciado por muitos idosos, ele pode ser consequência de viuvez, perda de amigos, dificuldade de mobilidade ou abandono familiar. Seus efeitos vão além do emocional: aumentam o risco de depressão, declínio funcional e mortalidade. A geriatria defende a criação de redes de apoio, grupos de convivência, acesso à cultura, tecnologia e lazer. O objetivo é resgatar o sentido de pertencimento e conexão. Os 7 "Is" da geriatria moderna não são apenas categorias clínicas, mas um convite à reflexão sobre como cuidamos, acolhemos e respeitamos nossos idosos. Cuidar do idoso é, acima de tudo, um ato de responsabilidade coletiva, que exige competência técnica, escuta ativa e humanização.

Edvaldo de Toledo é empresário, enfermeiro, especialista em Gerontologia e Geriatria, Apresentador do IssoPodAjudar, Criador da Cuidare e Diretor de Saúde do Município de Pedra Bela (atendimento@edvaldodetoledo.com.br)

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