MULHERES

Vereadoras combatem violência política de gênero

Por Marília Porcari |
| Tempo de leitura: 5 min
Jornal de Jundiaí
A ampliação de mulheres com mandato ajuda a ampliar debates e combater preconceito
A ampliação de mulheres com mandato ajuda a ampliar debates e combater preconceito

Toda semana há uma nova - e triste - notícia sobre violência política de gênero. Na última terça-feira (17), uma vereadora do PT, Elisane Rodrigues dos Santos, foi morta a facadas na cidade de Formigueiro, no Rio Grande do Sul. No começo deste mês, deputadas da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) foram ameaçadas de morte e estupro, em mensagens que chegaram por e-mail. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, também sofreu episódio de violência, sendo desrespeitada em no Senado Federal. Entre interrupções e falas agressivas dirigidas à ambientalista, ela ouviu que deveria “colocar-se em seu lugar” e que não seria respeitada “como ministra”. Em Jundiaí, as três vereadoras já relataram terem sofrido com este tipo de crime e estão unidas em busca de conscientizar e acabar com este problema.

Juntas elas irão apresentar um projeto de lei no próximo semestre para que a violência política de gênero seja um dos motivos para a cassação de mandato. “Ainda estamos trabalhando nesta proposta, mas vamos levar o debate à Câmara. Fiz questão de convidar minhas colegas para assinarem comigo a lei porque, apesar de estarmos cada uma em um campo político, nossas lutas se encontram em determinados momentos”, conta Mariana Janeiro (PT). Para ela, a ampliação na quantidade de mulheres atuando na Câmara Municipal de Jundiaí é essencial para aprofundar debates, como a alienação parental, Maio Laranja de combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes, entre outros temas. Ela considera que, apesar das diversas iniciativas construídas pelos vereadores homens, é mais difícil para eles a compreensão plena do problema. “Não é possível defender o que eles não vivem. Por isso a participação das mulheres é tão importante para criar leis e políticas públicas”, diz.

A vereadora também destaca a lei de sua autoria nº 10.338, que institui a Campanha Margarida Alves, de conscientização sobre o assunto e que foi aprovada neste ano. “É muito simbólico que leve este nome e é um avanço. Tenho buscado construir uma relação fraterna com meus colegas na Câmara e hoje vejo que temos isso. Os ataques que sofremos, enquanto mulheres na política, são externos e vêm disfarçados de críticas, mas acabam virando pessoais. O que não ocorre com os homens”, comenta.

Já a vereadora Carla Basílio (PSD) lembra que estas posturas agressivas são maneiras de intimidar. “A violência política de gênero é uma das formas mais perversas de tentativa de silenciamento. As mulheres, quando ocupam cargos de poder, ainda enfrentam resistência, ataques pessoais e tentativas de deslegitimação, não por suas ideias, mas por serem mulheres. Isso precisa mudar”, considera. Ela lembra que das 19 cadeiras na Câmara de Jundiaí, apenas três são ocupadas por mulheres, além dela e de Mariana, há a vereadora Quézia de Lucca (PL), que está em seu segundo mandato. “Na legislatura passada (2020 a 2024), apenas uma cadeira era ocupada por mulher, a própria vereadora Quézia. Isso mostra que, apesar dos avanços, seguimos sendo minoria nos espaços de decisão, e essa baixa representatividade agrava o cenário de violência política”, diz.

Carla sente a dificuldade em trabalhar em uma área que tem disparidade de gêneros e ainda é predominantemente masculina. “Desde que assumi meu primeiro mandato, percebo o quanto é desafiador ser mulher na política. As cobranças são diferentes, o tom dos ataques também”, por isso considera que as iniciativas de uma legislação mais dura contra esses atos é urgente, como tem sido realizada por ela e as colegas na Câmara. “Garantir punições adequadas é essencial para proteger quem está na política hoje e também para abrir caminho para quem ainda virá”, afirma, considerando medidas que podem ser tomadas, como no caso das deputadas da Alesp. “Para inibir esse tipo de atitude, é fundamental que o sistema de justiça atue com agilidade e rigor na responsabilização, além de que o Legislativo invista em protocolos de segurança, canais de denúncia eficazes e ações educativas que promovam o respeito à presença feminina na política”.

A vereadora também avalia que a união das parlamentares e de outras agentes políticas é importante para este enfrentamento. “A política está mudando, e nosso mandato reafirma isso todos os dias. Agora é Ela, e ela não está sozinha”, diz, brincando com seu próprio slogan.

Parceria feminina

Longe de ser uma cruzada contra os homens, a união feminina se faz presente e necessária principalmente para proteger as mulheres, em especial as que estão em cargos públicos e são vítimas constantes de agressões e ameaças. Na Câmara Municipal, a parceria entre as vereadoras jundiaienses é realidade não só na construção de projetos contra a violência política de gênero, mas também no apoio aos casos que ocorrem frequentemente.

No mês de maio, a vereadora Quézia de Lucca postou em suas redes sociais um trecho de sua fala na sessão onde contou sobre os comentários agressivos que ouviu e foi apoiada pela vereadora Mariana Janeiro. Em campos políticos opostos, as duas se encontram e se somam com Carla Basílio nestes momentos de enfrentamento às violências.  “O que mais senti, temos até um projeto juntas, inclusive sobre isso, é o assédio que a mulher sofre realmente”, disse durante a sessão, quando foi ameaçada.  “Não podemos e não vamos calar diante de qualquer forma de violência, desrespeito ou discriminação. Toda mulher merece ser ouvida, respeitada e protegida”, considerou.

Para que este tipo de crime seja punido, desde 2021 vigora no Brasil a Lei nº 14.192, que estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, alterando o Código Eleitoral, a Lei dos Partidos Políticos e a Lei das Eleições. O dispositivo visa criminalizar ações que impeçam ou dificultem a participação da mulher na política, incluindo assédio, humilhação e perseguição.

Apesar da legislação, os números não são animadores. De acordo com o Instituto Alziras, ONG que visa fortalecer a presença de mulheres na política e na gestão pública, um balanço de 175 representações de violência política de gênero e raça monitoradas pelo Grupo de Trabalho de Prevenção e Combate à Violência Política de Gênero do Ministério Público Federal revelou que apenas 12 resultaram em ação penal eleitoral (7%) entre 2021 e 2023.

Deste total de denúncias, 92% têm homens como acusados nas ações penais de violência política de gênero e a maior parte é praticada em ambiente parlamentar (60%) seguida pelo ambiente virtual (33%). 

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