OPINIÃO

O retorno do pintar


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O excesso de telas tornou-se parte da nossa rotina. Elas nos acompanham do despertar ao adormecer, oferecendo estímulos visuais e auditivos constantes, notificações incessantes e um ritmo frenético do qual o corpo humano não foi programado para suportar por tanto tempo. Esse excesso de informação tem um custo alto para a nossa saúde: a sobrecarga do sistema nervoso, alterações do sono, do humor, prejuízos posturais, diminuição do foco e falta de conexão com o presente.

Em contrapartida, há práticas simples, quase esquecidas, que vêm ressurgindo como verdadeiros remédios naturais para nosso corpo e principalmente para a mente. Uma delas é a pintura, com lápis de cor, canetinha, giz de cera, seja como for, apenas colorir algo. Não estamos falando de uma técnica artística profissional, pelo contrário, apenas o ato de pintar com liberdade, sem a necessidade de “ficar bonito” ou de atender expectativas externas. E é nesse contexto que volta à cena uma figura icônica e inesperadamente terapêutica: Bob Ross, conhecido por muitos com carinho como “Bob Goods”.

Bob Ross foi um pintor e apresentador norte-americano que se tornou mundialmente famoso por seus programas de televisão nos anos 80 e 90. Ele ensinava a pintar paisagens com calma, gentileza e frases que marcaram gerações, como: “Não existem erros, apenas acidentes felizes.” Muito mais do que ensinar técnicas de pintura, Bob nos conduzia a um estado de presença. Sua voz serena, seu ritmo lento e sua abordagem sem julgamento criavam um ambiente quase meditativo. Assistir a um episódio já era calmante. Pintar junto com ele, então, era uma verdadeira prática de regulação emocional.

Do ponto de vista fisiológico, quando nos engajamos em atividades como a pintura, especialmente de forma espontânea e sem pressão estética, entramos em um estado neurológico chamado “flow”, ou fluxo criativo. Nesse estado, o cérebro desacelera os circuitos ligados à ansiedade e ativa o sistema nervoso parassimpático, responsável por funções como descanso, digestão, recuperação e regeneração celular. Em outras palavras, pintar ajuda o corpo a sair do modo de alerta constante (o estado de luta ou fuga, que tanto escrevo aqui) e retornar ao equilíbrio.

Além disso, estudos recentes mostram que práticas artísticas manuais, como a pintura, contribuem para a redução do cortisol, o famoso hormônio do estresse, e promovem uma melhor regulação emocional. Também estimulam a criatividade, o raciocínio, a percepção visual e a coordenação motora fina,  sem contar a sensação de prazer e satisfação que vem de criar algo com as próprias mãos. É como se o ato de espalhar cores no papel ajudasse também a reorganizar pensamentos e emoções.

Esse tipo de prática pode ser especialmente valioso para crianças e adolescentes, que estão cada vez mais expostos às telas e, muitas vezes, já apresentam sintomas relacionados a esse excesso: insônia, irritabilidade, baixa tolerância à frustração, dores musculares e dificuldade de concentração. Pintar se torna, então, uma forma lúdica e eficaz de autorregulação, integração sensorial e expressão emocional. E vale também para adultos, e este é o convite deste artigo: que você experimente! Quantos de nós não nos sentimos engolidos pelo ritmo da vida digital, sentindo falta de algo que nem sempre conseguimos nomear? Talvez seja apenas a falta de uma pausa, de um momento para respirar, acalmar a mente e, por que não, pintar!

Se você está se perguntando por onde começar, minha sugestão é simples: separe 20 minutos do seu dia. Pegue uma folha ou compre um livro para colorir e permita-se pintar. Sem meta, sem julgamento. Apenas mova as mãos, observe as cores, entre no ritmo do que estiver sentindo.

Pintar não é só sobre arte. É sobre saúde. É sobre regular o sistema nervoso, sair do piloto automático, diminuir o ruído interno e reconectar-se com o agora. Em um mundo onde tudo grita por atenção, o silêncio de um lápis colorido sobre o papel pode ser uma revolução.

Talvez a resposta para um dia menos ansioso não esteja no próximo aplicativo de meditação ou no vídeo motivacional do momento, mas sim em algo muito mais simples e acessível: um lápis de cor, um espaço em branco e a coragem de se permitir criar ou apenas pintar algum desenho já pronto. Eu, particularmente, adoro pintar mandalas.

Seja como for, colocar o pintar na rotina pode ser um verdadeiro remédio para sua saúde, de forma divertida. Experimente! Muita saúde a todos!


Liciana Rossi é especialista em coluna e treinamento desportivo, pioneira do método ELDOA no Brasil (licianarossi@terra.com.br)

Comentários

1 Comentários

  • IVONE PEREIRA ROSSI 08/07/2025
    Gosto de saber as notícias e novidades da nossa cidade.