A vida é composta de ciclos. Esta frase é bastante comum e com certeza já foi muito utilizada em vários contextos, nas mais diferentes argumentações e por isso cabe aqui explicar a sua validade sob a óptica da medicina tradicional chinesa.
As potencialidades de crescimento e expansão, denominada na tradição oriental como “yang” e seu contraste de restrição e recolhimento, denominado “yin”, se alternam de forma sutil, um transformando-se no outro, criando um movimento progressivo, suave e compassado.
Um exemplo mais palpável disso pode envolver o movimento de caminhar, com sua fase de avanço (mais yang) sendo alternada pela fase em que o corpo se fixa no solo (de característica mais yin) criando uma base para o próximo passo. Caso essa alternância falhe, o movimento todo é comprometido, resultando em algo que chamamos de “tombo”.
A alternância do Yang e Yin pode também ser exemplificada com algo ainda mais fundamental: a própria respiração. Ela é um movimento tão vital que na maior parte do tempo é automática, ou seja, não nos damos conta de que está ocorrendo.
Certamente, o leitor(a) deve estar respirando normalmente desde o início da leitura do artigo, mas tão somente agora se atentou ao ar que entra e sai do pulmão. De fato, as manifestações mais “visíveis” deste movimento de ar estão na sua fase expansiva, expiratória, onde a saída do ar se mostra como o “sopro da vida”.
No entanto, mais discreta que a fase anterior, mas profundamente necessária para o processo de oxigenação do sangue é a fase inspiratória, quando o ar entra e se acumula no interior do pulmão. Uma característica muito relevante nesta fase é que somente uma parte do ar a que temos acesso no ambiente chega efetivamente aos alvéolos, onde ocorre a troca de gases.
Antes de chegar nesta estrutura final, o ar é aquecido, filtrado e condicionado a um determinado fluxo para ser aproveitado ao máximo. Ocorre, portanto, uma seleção do conteúdo inspirado, a cada movimento que fazemos para a entrada do nosso corpo.
Por fim, pego essa sabedoria e amplio no grande ciclo da natureza, as estações do ano. Costumo pensar nas diferentes estações como um ciclo respiratório da Terra, durando por um ano inteiro. O inverno, que é a fase que atravessamos agora, é o caminhar lento e silencioso de todo o potencial da vida resguardando-se na segurança do solo, no interior das sementes, nas casas aquecidas, dentro da quietude da noite dos dias mais curtos.
Como na respiração, esse resguardo não está disponível para todos os elementos que estão expandidos. A mensagem do inverno é recolher somente o que é essencial e que pode contribuir efetivamente para a próxima fase de expansão que irá ocorrer na expiração seguinte, ou, no caso do planeta, na primavera e no verão.
Excessos devem ser cortados para um período que a energia se acumula para poder romper, forte e renascida, em um momento melhor para resplandecer.
Procuro, nesta época do ano, fortalecer a minha mente e energia da mesma forma que o planeta o faz, selecionando aquilo que pode contribuir com uma boa estação e deixando de lado o que só me “fará peso” para atravessar o período de recolhimento.
Alexandre Martin é médico, especialista em acupuntura e com formação em medicina chinesa e osteopatia (xan.martin@gmail.com)