TRATAMENTO

Uso de cannabis medicinal quebra paradigmas, mas ainda é restrito

Por Redação |
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Arquivo pessoal
Apesar de haver resistência de parte da sociedade, a busca pelo óleo canabidiol, por exemplo, já é comum entre crianças, como João Pedro, que tem TEA
Apesar de haver resistência de parte da sociedade, a busca pelo óleo canabidiol, por exemplo, já é comum entre crianças, como João Pedro, que tem TEA

Há cerca de um ano, o Sistema Único de Saúde em São Paulo incoroporou remédios à base da canabidiol no rol de medicamentos disponibilizados gratuitamente para a população. O canabidiol é fornecido a pacientes diagnosticados com síndrome de Dravet e de Lennox-Gastaut, e complexo da esclerose tuberosa. Apesar disso, pessoas que fazem o uso da substância para tratar outras condições ainda têm de enfrentar preconceito, pela associação feita erroneamente à maconha.

Em Jundiaí, segundo a Unidade de Gestão de Promoção da Saúde (UGPS), desde a incusão do canabidiol no rol do SUS paulista, o município enviou ao estado quatro processos de solicitação do canabidiol. Dois deles foram indeferidos por não atenderem às exigências do Protocolo, e os outros dois estão em análise para a liberação pelo órgão estadual.

A UGPS informa que, por se tratar de medicamento do componente especializado, o fornecimento é feito pelo Governo do Estado. Jundiaí faz o envio dos processos de residentes para a Farmácia de Alto Custo da Diretoria Regional de Saúde de Campinas (DRS VII) para autorização e dispensação do medicamento solicitado. Posteriormente, Jundiaí faz a retirada do componente especializado no centro de distribuição da DRS VII e entrega ao munícipe na Farmácia de Alto Custo, na rua Marechal.

O número de pacientes atendidos ainda é baixo por conta da quantidade limitada de condições às quais ele é destinado, mas o canabidiol é usado por pacientes com várias doenças, síndromes ou transtornos, de dor crônica a convulsões. Inclusive, é amplamente usado por crianças.

É o caso do filho de Maria Edna Stocco Rodrigues, de 45 anos, João Pedro Rodrigues Lopes, de 12 anos. João é autista suporte 1. "Procuramos o canabidiol como forma de tratamento após meu filho ser diagnosticado com TEA grau de suporte 1 e não se adaptar à medicação que o neurologista havia prescrito — Ritalina. Ele ficava agitado. Então, conhecemos algumas associações aqui no Brasil que acessibilizavam o canabidiol com custos acessíveis."

Sobre a acessibilidade, Maria Edna não chegou a importar canabidiol antes da popularização maior no Brasil justamente por conta dos custos. "Por ter conhecimento do trabalho das associações, nunca importamos o tratamento, mas chegamos a verificar os valores, e são altíssimos, inviabilizando a compra. Hoje, temos acesso em Itupeva, através da Osaci", diz ela sobre a organização que atende pessoas que precisam usar o canabidiol para fins medicinais.

Maria Edna conta que também começou a usar canabidiol em 2023, após uma cirurgia de câncer. Para ela, falta informação à população sobre o uso da substância. "Ainda existe muito preconceito, mas acredito que seja por falta de informação das pessoas. O acesso à planta oportuniza o tratamento a todos, visto que possui um vasto potencial terapêutico, de baixo custo em relação à importação. Assim, é de suma importância seu acesso de forma a melhorar a qualidade de vida das pessoas, além de contribuir para a saúde pública", finaliza.

Jcomp / Freepik

Possibilidades

O tratamento com canabidiol é bastante amplo. O caso de João Pedro, filho de Maria Edna, é um dos usos. Renato usa para dores crônicas e trata a mãe, que tem Alzheimer. Larissa procura o canabidiol para o filho, Eduardo, que tem paralisa cerebral e epilepsia. São diversas pessoas com diversas queixas que encontram no canabidiol a melhora para aflições, como já contado anteriormente pelo Jornal de Jundiaí.

As pessoas citadas acima têm em comum o acesso ao canabidiol através da Organização Social de Apoio à Cultura, Capoeira e Cannabis de Itupeva (Osaci), que existe desde 1999 com projeto de capoeira em escolas da cidade e desde 2020 incorporou em seu escopo a saúde com tratamentos naturais à base de plantas medicinais da Farmácia Viva tipo 1, cannabis medicinal e Práticas Integrativas e Complementares (PICs). Com relação à cannabis medicinal, a ideia da organização é produzir um óleo de qualidade a baixo custo.

Presidente da Osaci, Denis Lopes diz que o preconceito ainda existe, mas vem diminuindo. "Infelizmente, a desinformação e as informações falsas ainda levam as pessoas a terem um pouco de preconceito, mas isso vem diminuindo a cada ano", conta ele. Hoje, segundo Denis, as pessoas chegam à Osaci já sabendo o que buscam. "Mas ainda sofremos preconceito da sociedade que, por muitas vezes, não consegue entender o trabalho de Associações de Cannabis Medicinal. Ainda sofremos o preconceito de um sistema falho, que vê a cannabis como uma droga ilegal e não um remédio natural que cura milhares de pessoas pelo mundo inteiro", diz.

Diretor de Comunicação da Osaci, Piero Bonini fala que o crescimento da procura é constante. "Não aumenta só em Jundiaí, mas em todo o Brasil. Hoje, a Osaci conta com mais de 500 associados ativos em todo as regiões do Brasil. Na Região Metropolitana de Jundiaí, mais especificamente, a procura é crescente. Todos os dias temos contatos de pessoas querendo buscar mais qualidade de vida com um tratamento natural para se livrarem de efeitos colaterais pesados, ou até mesmo como a última saída para alguma patologia ou condição."

"Não existe um padrão de perfil de quem procura, pois patologia/condição não escolhe perfil ou classe social. Notamos que todas as pessoas chegam a nós buscando o que não conseguiram encontrar em medicamentos da indústria farmacêutica ou desenganadas pelos médicos", conta. "As condições que atendemos são extensas, hoje já temos estudos com dezenas de patologias/condições que a cannabis auxilia, dentre elas, o TEA, Alzheimer, epilepsia, câncer, dores crônicas e muitas condições psicológicas, como depressão, ansiedade e insônia causada por esses fatores. Temos também em nosso quadro de associados pessoas que buscam a cannabis medicinal para largar vícios, como o alcoolismo e o uso de substâncias químicas, como o crack", explica Piero.

Advogada da Osaci, Kimberly Medici Varanda informa que a organização não faz venda do óleo, mas sim a associação de pessoas que buscam acesso ao canabidiol. A advogada lembra que o art. 196 da Constituição Federal trata do acesso à saúde a todos. "Dessa forma, se a saúde é direito de todos e é dever do Estado, deve ser ela garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. É nessa premissa que a Associação busca trazer qualidade de vida, reparação social, tratamentos não medicamentosos, afinal, o acesso ao tratamento de cannabis é fitoterápico."

Kimberly conta que muitas pessoas também têm procurado a associação para ter orientação na produção própria do óleo. "Nota-se realmente um aumento na procura pela produção própria de óleo. É por essa razão que a associação orienta corretamente, com respaldo médico e jurídico, como que essas pessoas podem realizar seu próprio cultivo, tendo em vista que possuímos cursos disponibilizados para os associados, tais como o de 'Cultivo caipira orgânico e extração caseira de cannabis terapêutica para usos medicinais'."

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