Como todos que assistiram à microssérie “Adolescência”, na Netflix, eu fiquei chocada. Mas chocada no sentido de ser uma comunicadora social e não entender os signos, pressões sociais, modos comportamentais a que esses jovens estão submetidos. Conversei com muitos que assistiram, com psicólogos e pessoas que são assistentes sociais. O recado é que os pais precisam acordar.
Agradeci por não ter mais filhos adolescentes, porém preocupada com os dois afilhados, de 10 e 6 anos. Ambos, por ora, estão sendo fiscalizados e monitorados no uso de um dia por semana de jogos e desenhos. Entretanto, não sei qual será a postura de minhas comadres quando eles ficarem mais velhos. E realmente não consigo viabilizar uma planilha em que pais e mães observem o que se passa nos celulares de filhos de 13 a 18 anos, 24 horas por dia.
Nunca olhei os celulares dos meus, apostei no diálogo franco e sem mentiras. Mas, hoje, acho que esta atitude não bastaria. Na microssérie, um adolescente de 13 anos é preso, acusado de ter cometido um crime de assassinato. Apesar de haver provas contundentes, inclusive vídeo, ele continua a negar até que passa por um processo de terapia. Somente ali ele entende que o que foi feito não tem mais volta.
Culpa da realidade virtual? Da falta de responsabilidade? Dos pais que não dialogam com aquele filho que vivia com a porta do quarto fechada? Um menino comum, que a gente tromba diariamente pelos corredores das escolas submetido a bullying e a influencers misóginos do mundo virtual.
E a escola? Aquela escola que não dialoga com ninguém? Com professores que passam vídeoaulas, que não estão nem aí com os abusos cometidos, com a falta de respeito, com a cidadania que não se construiu e nem vai ser construída. Como salvar meninos e meninas em formação?
Nossa crise é moral. Mas não a moral instituída pela igreja ou Estado. Pais (quando estes existem) e mães estão superatarefados com a nova dinâmica social, pressionados pelo tempo que se esvai. Sobra pouca atenção para os filhos, que passam a ser terceirizados para as escolas, avós ou cuidadores. Peraí! Responsabilidade de educar crianças é dos pais! Causa-me estranheza quando vejo, também nas redes sociais, mães modernas reclamando do peso de cuidar dos filhos, de amamentar, de acordar à noite, de dar atenção aos rebentos. Pois é, maternidade/paternidade envolve amar e cuidar. Se não estamos disponíveis para esta demanda, é melhor adotar um pet. A responsabilidade de ser pai é gigantesca, talvez a maior que tenhamos na vida.
Crianças mal cuidadas e sem gerenciamento se tornam adolescentes à mercê do primeiro ditador de regras. Vamos combinar que a adolescência tem, por si só, um peso horroroso sobre nossos ombros. São hormônios à flor da pele, corpo e alma em transformação. Como acolher melhor estes meninos e meninas? Que são lindos brotinhos a desabrochar lá na frente?
Não. A culpa não é da adolescência. A culpa é dos pais mesmo. Mas de um Estado que também não oferece equipamentos públicos de qualidade para o atendimento educacional destas crianças. Quando delinquem, eles nos custam mais de R$ 15 mil ao mês nas Fundações Casas da vida. Não seria melhor investir preventivamente?
E não pensem que somente crianças pobres delinquem. Aqui mesmo, em Jundiaí, há muitos filhos de classe média e alta já em medida socioeducativa por delitos. E sabe qual é a atitude dos pais? Acham que cometer crime é algo normal para a idade.
Ainda assim pensei no impacto social da série. O jovem é de classe média. Os nossos garotos pobres, aos 13 anos, já normalizaram o tráfico em frente à sua casa e muitos já praticaram inúmeros crimes ou estão prestes a matar por um celular.
Triste sociedade. Novamente friso que nossos jovens não podem estar submetidos à terra sem lei da internet. Eles estão em formação física e espiritual. Uma cultura da paz é urgente. Esses valores da pré-história não podem florescer. Não estamos aqui para matar ou morrer. Mas para conviver, aceitar e nos alegrar com a felicidade alheia e construir uma sociedade melhor para todos.
Ariadne Gattolini é jornalista e escritora. Pós-graduada em ESG pela FGV-SP e editora-chefe do Grupo JJ.