Essa é uma pergunta muito frequente no meu consultório vindo de pessoas que tratam alguma outra coisa e, diante do grande sucesso que obtém, se animam em deixar vícios com cigarros, compulsão por comida ou algo assim. A resposta é afirmativa, mas de uma maneira diferente do normalmente se espera.
Famosa pela sua versatilidade, a acupuntura tem ação direta no sistema nervoso do paciente e é capaz de influenciar o seu “funcionamento”, o que a consagrou como uma das práticas auxiliares no “tratamento” dos desvios comportamentais.
Contudo, para entendermos o que a acupuntura faz, precisamos nos esgueirar para a beirada do abismo e dar uma olhada nas suas profundezas, sem nos esquecermos que, certamente, o abismo está olhando de volta para nós enquanto nos perguntamos o que é, afinal, um vício?
Vício é uma dependência física ou psicológica por uma substância ou atividade, mesmo que saiba que seu uso ou prática lhe causa danos óbvios. Essa é uma boa definição, mas vamos além da superfície: ninguém se prende a algo totalmente desagradável. O vício tem também seu aspecto útil, sendo por vezes, de grande importância no contexto de vida daquele indivíduo.
Tomemos por exemplo o fumo: seu efeito deletério é bem conhecido, mas ele tem também um “aparente efeito” de controle sobre a ansiedade. Apesar de existirem dezenas de maneiras melhores de se lidar com a ansiedade do que usando o hábito de fumar, muitas pessoas continuam optando por ele. Por quê?
Os motivos são vários, desde o fácil acesso, efeito de melhora imediata e a aceitação social. O fato é que o ato é sempre associado com um “circuito” cerebral de recompensa e prazer, intensificando-o. Para o fumante, tudo que é bom, pode ser melhor caso seja acompanhado de um cigarro.
Por vezes, o momento que se passa com o cigarro é o único passível de obter algum descanso ou mesmo preservar a sanidade mental. Eu tenho uma cliente, chef de cozinha, que obtém na “pausa para o cigarro” o único momento para si nas doze horas do seu turno.
O primeiro passo para tratar de um vício é se conscientizar que no ato vicioso existe algo útil, nem que seja para suportar uma rotina desumana. Dito isso, fica claro que o paciente deve se colocar em posição para novas escolhas na sua vida. Deve enfrentar medos e temores que o levaram a aceitar uma rotina que provou ser insalubre e que ele permite que continue, por pura inércia.
Em suma, não há de se tratar somente o vício, mas sim o indivíduo preso no comportamento vicioso. Meu trabalho é ajudar o paciente nesta percepção do próprio caminho de vida, fazendo emergir uma mudança a partir de uma decisão no seu íntimo.
Na prática, a mobilização do fluxo energético através da acupuntura, faz com que as” vias de prazer” cerebrais sejam moduladas para não ficarem “em carência de estímulo” enquanto o fator viciante é retirado (o cigarro, como no exemplo), mas também facilita a abordagem do que se oculta “debaixo” dos vícios, tornando o pensamento mais claro e capaz na tomada das decisões necessárias ao processo de desintoxicação.
Alexandre Martin é médico, especialista em acupuntura e com formação em medicina chinesa e osteopatia (xan.martin@gmail.com)
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Katia 28/02/2025Maravilhosa r flexao