Mais uma vez derrubaram uma casa na Rua Senador Fonseca, 776. Esteve protegida pelo Inventário do Patrimônio Cultural de Jundiaí, agora com autorização para sua demolição, foi ao chão no domingo passado, dia 26. Uma casa que causava um certo desconforto para defendê-la porque não tinha 100 anos, não era moderna e não foi construída no alinhamento. Já tentava ser nova. Mas representava uma moda que o cinema americano difundia, um estilo eclético, que teve um auge com os filmes de Los Angeles e mexicanos e que agora parece ter perdido o interesse, mas vem sendo recuperado seus valores.
Sobre isso, na extensa tese “Arquitetando a boa Vizinhança: Arquitetura, Cidade e cultura nas relações Brasil-Estados Unidos 1876-1945”, de Fernando Atique, arquiteto e urbanista, professor mestre em História e Fundamentos Sociais da Arquitetura e do Urbanismo pela Universidade de São Paulo – USP, é possível identificar a casa demolida nesse estilo missões: o torreão curvo que caracterizava a casa é típico desses projetos dessa época, o “mission style”, que nos Estados Unidos definiu uma época que formou paisagens e que por aqui se espalhou como pólvora.
Em seu livro, Atique cita as 9 categorias que caracterizam o estilo missões: pátio com jardim; sólidas paredes, pilares e colunas; arcadas; frontões curvilíneos; torres sineiras aterraçadas, com domo e lanterna; pequenos campanários; largos e projetados beirais; essas espessas paredes não-decoradas; e telhados de telhas vermelhas, redondas tipo capa e canal (Newcomb, 1916 IX).
A maior ocorrência desses adornos está nas ruas entre o Espaço Expressa e o Centro. Em maior ou menor grau, os projetistas entendiam que uma casa sem pelo menos uma coluna na frente era muito pobre e precisavam dessas pequenas varandas antes da porta de entrada, para ter um certo grau de requinte. Além disso, as prefeituras exigiam nos projetos a apresentação desses elementos para aprovação das construções; isso foi disseminado e está presente em inúmeras casas em pé, algumas em conjunto com outras assobradadas isoladas.
Impossível falar desse estilo sem falar dos fachadistas, gesseiros e marmoristas que faziam os adornos, colunas, molduras e bases. Todo tipo de esculturas que depois eram reproduzidas em gesso ou concreto. Foram o Silvio Graziani (1883-1950) e o África – Raul Zomignani – (1910-1983), além dos projetistas que eram inúmeros e precisam ser estudados. A Vila Argos também tem esse estilo bem presente e é o maior conjunto de arquitetura estilo missões de Jundiaí.
A casa demolida tinha todos esses adornos e formas, com seu torreão redondo na frente, com jardim e elementos decorativos que podiam ser vistos nessas referências do estilo. Não foi suficiente! Saiu do Inventário e o proprietário conseguiu essa licença. O que foi triste, e uma forma autoritária de exercer o direito de propriedade, não reconhecendo o valor cultural do edifício. Esse alerta é um sinal de que vai ser difícil conter demolições, já que essa aprovação faz um precedente que pode ser caro para o Patrimônio Cultural da Cidade.
Agora, não sendo suficiente, essa semana também o enorme Ipê rosa da Rua Abilio Figueiredo, no Anhangabaú, que floriu de maneira fantástica no ano passado mudando a paisagem do bairro, também foi suprimido, este por conta dos cupins que devastaram o interior e deixaram seu tronco oco.
Cada vez mais frágeis, o cuidado, a estética e as aprovações estão colocando em risco o que ainda temos e queremos preservar.
Eduardo Carlos Pereira é arquiteto e urbanista e conselheiro do COMPAC. (edupereiradesign@gmail.com)