OPINIÃO

Respeito e autonomia na velhice


| Tempo de leitura: 5 min

A sociedade contemporânea, especialmente em culturas ocidentais, tende a adotar uma visão da velhice associada à fraqueza, dependência e incapacidade. Muitas vezes, essa visão leva à infantilização dos idosos, ou seja, ao tratamento de pessoas idosas como se fossem crianças, sem a devida consideração por sua experiência de vida, capacidades cognitivas e autonomia. A não infantilização da pessoa idosa é um princípio fundamental para garantir que ela seja tratada com dignidade, respeito e liberdade para exercer suas escolhas, sem ser desvalorizada ou privada de sua voz ativa.
                
A infantilização da pessoa idosa se manifesta de diversas formas, desde o uso de um tom de voz até a imposição de decisões sobre a vida do idoso sem o seu consentimento ou participação ativa. Quando uma pessoa idosa é tratada como se não tivesse capacidade de compreender, decidir ou lidar com suas próprias questões, ela é desprovida de sua autonomia e dignidade. Esse comportamento pode ocorrer tanto em ambientes familiares quanto em instituições de cuidado, e pode ser reforçado por estereótipos que associam a velhice à incapacidade. Esse tratamento de "adultos infantis" pode ter sérios efeitos negativos sobre a saúde emocional e psicológica do idoso. A perda de autonomia pode gerar sentimentos de impotência, frustração e depressão, além de contribuir para um quadro de solidão e isolamento. A infantilização também pode afetar a autoestima, criando uma percepção distorcida de si mesmo, como se a pessoa idosa não fosse capaz de realizar atividades cotidianas ou tomar decisões relevantes sobre sua vida.
               
Esse tipo de tratamento desconsidera o vasto acúmulo de saberes e experiências que a pessoa idosa tem ao longo da vida. A sabedoria adquirida através dos anos deve ser reconhecida e valorizada, pois ela contribui para a construção de uma sociedade mais rica e diversificada em termos de perspectivas. 
             
 Uma das principais características do envelhecimento saudável é a manutenção da autonomia, ou seja, a capacidade de tomar decisões sobre a própria vida. Isso inclui o direito de viver de acordo com suas preferências, de escolher seus cuidados, suas atividades diárias e, principalmente, de participar ativamente das decisões que afetam sua saúde e bem-estar.
               
A autonomia é uma das pedras angulares da dignidade humana, e isso não muda com a idade. A pessoa idosa deve ser tratada com o mesmo respeito e consideração que qualquer outro indivíduo, independentemente de sua condição de saúde ou de mobilidade. Mesmo em situações de dependência parcial ou total, é possível garantir que o idoso exerça a sua autonomia de forma significativa. Isso pode envolver escolhas simples, como a seleção de suas roupas ou a escolha de um cardápio alimentar, ou ainda decisões mais complexas, como opções sobre tratamentos médicos ou opções de cuidados em casa.
             
Porém, muitas vezes, as atitudes paternalistas de familiares ou profissionais de saúde, embora bem-intencionadas, podem resultar na exclusão da pessoa idosa do processo decisório. Para que a autonomia do idoso seja preservada, é essencial que ele seja ouvido, respeitado e encorajado a fazer escolhas, dentro de suas possibilidades.
             
A sociedade tem um papel crucial no combate à infantilização dos idosos, promovendo uma cultura de respeito à diversidade etária e a valorização das contribuições dos mais velhos. Isso envolve, entre outras coisas, a criação de políticas públicas que garantam a inclusão social e a acessibilidade para a população idosa, bem como a educação para as novas gerações sobre os direitos e a importância dos idosos.  Além disso, a mídia tem uma grande responsabilidade em representar a pessoa idosa de forma justa e realista, evitando estereótipos que perpetuam a ideia de que os idosos são seres frágeis e incapazes. Uma maior visibilidade da pessoa idosa em diversos contextos – como trabalho, educação, cultura e esporte – pode ajudar a romper com a visão reducionista e limitada da velhice.
             
Envelhecimento ativo é o conceito que visa garantir que os idosos possam continuar a participar plenamente da vida social, econômica, cultural e cívica. Este conceito implica que, mesmo com limitações físicas ou cognitivas, os idosos têm o direito de continuar exercendo suas funções sociais e de contribuir para a comunidade de maneiras que respeitem suas capacidades.
            
Para combater a infantilização e esta falsa fragilidade, é necessário que a sociedade crie espaços e oportunidades para que os idosos possam interagir, aprender e expressar suas opiniões. Programas de inclusão digital, cursos de capacitação e atividades culturais podem ser uma excelente maneira de promover o envelhecimento ativo, além de ajudar a combater o isolamento social, que muitas vezes é um reflexo da falta de oportunidades de interação e participação.
          
Nós como profissionais cuidadores – como médicos, enfermeiros, assistentes sociais e cuidadores profissionais – temos uma responsabilidade significativa em garantir que a autonomia e os direitos do idoso sejam respeitados. É fundamental que esses profissionais sejam capacitados para identificar os sinais de infantilização e para adotar uma abordagem centrada na pessoa, respeitando as preferências e decisões do idoso.
           
Os cuidados devem ser baseados na colaboração e no respeito mútuo. Em vez de assumir a postura de "salvadores", os profissionais devem atuar como facilitadores, oferecendo suporte quando necessário, mas sempre assegurando que a pessoa idosa esteja no centro das decisões. Isso é especialmente importante em contextos de cuidados paliativos ou situações de saúde delicadas, em que a comunicação e a decisão compartilhada são essenciais.
            
Assim podemos construir uma sociedade mais inclusiva e participativa, afinal, se tudo der certo, viveremos mais e melhor.

Edvaldo de Toledo é empresário, enfermeiro, especialista em Gerontologia e Geriatria, Criador da Cuidare e Apresentador do IssoPodAjudar PodCast do Jornal de Jundiaí (atendimento@edvaldodetoledo.com.br)

Comentários

Comentários