O debate sobre a jornada de trabalho tomou conta das redes sociais e da imprensa nos últimos dias por conta da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) apresentada pela deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP). A PEC estabelece uma jornada máxima de 36 horas semanais em quatro dias de atividade e três de descanso.
Com a visibilidade dada à proposta, a deputada conseguiu as 171 assinaturas necessárias para que a PEC passe a tramitar na Câmara dos Deputados. O percurso é longo: tem de passar na Comissão de Constituição e Justiça, depois em Comissão Especial e aí vai a duas votações em plenário, quando é necessário quórum qualificado (308 votos a favor). Uma vez aprovado, o texto segue para o Senado. Ainda assim, diante da repercussão do tema, vale fazer algumas reflexões.
Até a Constituição de 1988, a jornada máxima de trabalho era de 48 horas por semana. Foi a Carta Magna vigente que estabeleceu que a jornada do trabalho normal não deve ser superior a 44 horas semanais, com possibilidade de empregadores e empregados fixarem período menor por meio de negociação.
Na prática, os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que os brasileiros trabalharam 39,2 horas por semana no segundo trimestre de 2024.
Esta quantidade de horas está muito próxima à mediana (38 horas) dos países do G-20, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). O Brasil empata com a Rússia e está logo acima de Estados Unidos e Coreia do Sul, em que a jornada é de 38 horas por semana.
O país do G-20 com jornada mais longa é a Índia com 47 horas. Austrália e Canadá empatam na outra ponta, com 32 horas semanais. A Arábia Saudita não disponibiliza esta informação para a OIT.
O Brasil alcançou este patamar graças às negociações coletivas (e mesmo individuais) entre empregadores e empregados, que são o caminho mais adequado a seguir. As melhores práticas neste campo, os melhores exemplos no mundo, preveem que o acordado deve prevalecer sobre o legislado – como, inclusive, foi estabelecido pela nossa Reforma Trabalhista em 2017.
A imposição legal de um limite menor do que 44 horas de jornada semanal tira a força do diálogo direto entre empregadores e empregados. E só a negociação pode levar em conta as diferentes realidades de cada setor, como o contexto regional, porte das empresas e demanda dos trabalhadores, e de modo a viabilizar a sustentabilidade econômica dos segmentos produtivos.
Sem considerar esses fatores, a competitividade das empresas poderá ser afetada, sobretudo das pequenas e micro, que têm menos fôlego e menos margem de manobra.
Por isso, o argumento por vezes levantado de que mais postos de trabalho serão abertos não é verdadeiro. É o crescimento da economia que dá tração ao mercado de trabalho e gera empregos de forma sustentável, por isso deveria ser a principal agenda econômica do país.
Para finalizar, gostaria de ressaltar que o Brasil precisa acabar com esta mania de que tudo tem de estar na Constituição. Nossa Carta Magna se tornou um documento extremamente detalhado, que, por isso, recebe remendos o tempo todo.
Precisamos acreditar nos outros instrumentos jurídicos disponíveis e que têm força, como os acordos coletivos e as Câmaras de Arbitragem, por exemplo. A via negocial, além de mais rápida, alcança resultados excelentes porque é uma solução construída à base do diálogo.
Vandermir Francesconi Júnior é 2º vice-presidente do CIESP e 1º diretor secretário da FIESP (vfjunior@terra.com.br)