OPINIÃO

A política como ciência humana


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Ao contrário de toda a lógica eleitoral, de todas as previsões e prognósticos, o grupo do atual prefeito de Jundiaí foi derrotado.

Mesmo tendo escolhido como candidato à sucessão uma das pessoas mais competentes e sérias dos quadros públicos da cidade, fica claro que o voto não é uma fórmula matemática. Não há nada de exato.

Existem nuances. Como na vida e no voto, as pessoas mudam de ideia e não são coerentes. Isso é da natureza humana. 

Houve um excesso de autoconfiança após o triunfo de 2020. A aprovação de um governo que fez um bom trabalho e que ainda tem à frente uma pessoa com grande poder de comunicação fez com que a guarda fosse baixada.  Ora, pensavam, se há uma aprovação imensa, basta indicar quem dará continuidade para a fórmula de sucesso. Simples. 

Mas não funcionou assim.

Na vida, como no voto, a rotina pode causar certo desgaste. Estresse. Preguiça. Cansaço. Mesmo que tudo esteja bem, às vezes é bom quebrar o cotidiano da vida fazendo algo diferente. Ainda mais em tempos de modernidade líquida, onde nada parece ser firme, sólido. Tudo é rápido, do meme ao debate, das relações instantâneas aos reels de uma postagem. Por que na política seria diferente? Vivemos  tempos em que ser novidade por si só já é suficiente, E se der errado, tudo bem, porque dá para mudar, nada é eterno.

Na vida, como no voto, queremos sempre mais. Uma vez que conquistamos o que estava em nossos sonhos, vamos querer mais. A satisfação do que está sendo feito e alcançado  dura menos que o desejo de conquista. Ou seja, não adianta apenas acreditar que se está tudo bem e assim ficará. Nada disso. Sempre se quer mais.

Na vida, como no voto, podemos ouvir apenas quem gosta da gente ou dar espaço para o contraditório. Nada é certo. Tudo pode enganar... afinal, somos incoerentes e inconstantes como seres humanos (e repetitivos...). Faltou entender que política tem muito mais a ver com emoção e paixão do que com resultados numéricos e exatidões. Não há case de sucesso, hoje, na política, sem consenso. Sem concórdia.

Na vida, como no voto, excessos fazem mal. Uma pessoa que sempre fala sobre o mesmo assunto com a mesma roda de amigos se torna chata e inconveniente. Quem tem inteligência e perspicácia percebe que ou muda o tom e o tema de suas conversas ou será alijado do grupo. Quem não detesta aquele tiozão que vive perguntando aos solteiros da família quando vão casar ou se o pavê pode ser comido? Repetir algo, especialmente depreciativo, ou persistir em conflitos funciona até um certo ponto. Depois disso começa e se tornar o oposto: cria-se uma empatia por quem aparenta estar sendo perseguido ou depreciado. Somos emotivos demais, como bons latinos (não que eu ache isso ruim, apenas faz parte de quem somos).

A vida, como o voto, surpreende.

E temos, agora, uma nova liderança despontando. Gustavo Martinelli alcançou o grande ponto de sua vida política. Mas, apesar de sua expressiva votação, é preciso que seu grupo (mais do que ele) entenda que a cidade não escolheu um governo conservador. Não houve (como já ouvi de alguns desavisados) uma guinada à direita. Sim, muitas pessoas deixaram de votar em Parimoschi no segundo turno e em seu lugar deram os louros para Martinelli. Mas foi isso: votos de uma PESSOA para outra. Não de uma ideologia para outra. Até porque um altíssimo número de eleitores nem votou.

Martinelli terá de governar pensando em todos. E se precaver, tomando cuidado com os excessos que fazem mal, não se acomodar em conquistas já feitas e não dar muito espaço às incoerências que surgirão dos seus e dos outros. Mas principalmente, ouvindo o contraditório, acolhendo opiniões diversas, compreendendo que não há bem absoluto (que não seja em Deus) ou mal absoluto nessa Terra. Chega de maniqueísmo.

Desejo ao novo prefeito um bom governo.

Samuel Vidilli é cientista social (svidilli@gmail.com)

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