Nas últimas semanas, o Brasil descobriu que vive uma pandemia das bets. O termo, usado pela ministra da Saúde, Nísia Trindade, ilustra o problema social e econômico que existe diante da dimensão que essas apostas tomaram no país. Tanto que o governo decidiu agir e promete medidas para regular o setor.
A primeira é o banimento, nos próximos dias, de cerca de dois mil sites de apostas irregulares. O Ministério da Fazenda autorizou o funcionamento de pouco mais de 200 que são ligados a 95 empresas. É um primeiro passo, mas é pouco. É preciso encarar esta questão da mesma forma que se enfrenta o tabagismo: com forte regulação para coibir o vício que cria dependência e destrói a saúde – seja física, seja mental.
Os impactos financeiros vêm sendo mensurados e impressionam. A Confederação Nacional do Comércio (CNC) estima que o setor pode ter um prejuízo anual de R$ 117 bilhões por causa das bets. Segundo a entidade, entre junho de 2023 e junho de 2024, os brasileiros gastaram R$ 68 bilhões nessas apostas, valor que representa 22% da renda disponível das famílias no período. Isso equivale a 0,62% do PIB ou 0,95% do consumo do país.
O prejuízo é maior do que os gastos porque os custos fixos não mudam, ou seja, funcionários e estoque, por exemplo, continuam pesando para o empresário. Além disso, a CNC reduziu a projeção de crescimento do setor varejista de 2,2% para 2,1% este ano e diante de um quadro que considera alarmante recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão desses sites de apostas.
As bets já levaram 1,3 milhão de pessoas à inadimplência e capturaram, inclusive, beneficiários do bolsa família que, indiscutivelmente, vivem em situação de vulnerabilidade. O Banco Central mostrou que cinco milhões (das 21 milhões) de pessoas pertencentes a famílias que recebem a bolsa governamental gastaram, só em agosto, R$ 3 bilhões nas plataformas de apostas via Pix.
Uma pesquisa da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo revela que a maioria dos apostadores é homem (58%), classe B e C e já deixou de comprar itens como roupas, remédios e de pagar contas. Outra, do Instituto Locomotiva, mostra que 54% eles têm entre 18 e 30 anos e que, pelo menos, 33 milhões de pessoas de baixa renda já fizeram apostas, sendo que 22 milhões (ou 20% deste contingente) aposta mensalmente. E a principal motivação da maioria é “ganhar dinheiro”.
Só o fato de esta ser a principal motivação indica que o poder público tem de ter um olhar atento às bets, afinal, essas apostas não são meio de “ganhar dinheiro”. Pelo contrário, mesmo quem ganha costuma usar o montante recebido para continuar jogando.
É preciso melhorar a regulação das bets e adotar medidas duras para coibir a dependência das apostas online, seguindo as melhores práticas internacionais da área e o exemplo bem-sucedido do Brasil em relação ao tabagismo.
Podemos destacar algumas: proibir que pessoas inadimplentes e menores de idade apostem; proibir as apostas com cartão de crédito e cartão do bolsa família; restringir a propaganda e as campanhas de marketing, limitando-as a determinados horários, formatos e canais; tornar obrigatória a inclusão de avisos de desestímulo à prática, além de monitorar os CPFs utilizados de modo a rastrear eventual lavagem de dinheiro. Trata-se de um problema sério para o qual a sociedade não pode fechar os olhos.
Vandermir Francesconi Júnior é 2º vice-presidente do CIESP e 1º diretor secretário da FIESP (vfjunior@terra.com.br)
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