OPINIÃO

Nem sempre a alternância de poder é salutar


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A sabedoria popular apregoa duas frases moldadas pelo senso comum bastante utilizadas no cotidiano. Uma delas é “toda alternância de poder é salutar”, um dos pilares dos preceitos da democracia. A outra, mais ampla e próxima do dia a dia das pessoas, diz que “em time que está ganhando não se mexe”.

Numa primeira vista, ambas são corretas. Mas, embora lastreadas pelo senso comum, merecem uma reflexão. Ou melhor, como ensina o filósofo italiano Antônio Gramsci em seus famosos cadernos, o senso comum precisa ser superado, pois “se constitui numa concepção de mundo absorvida acriticamente, ocasional e desagregada, o que deveria ser feito por meio da “filosofia da práxis”.

Em termos mais diretos e ainda seguindo Gramsci, “a filosofia espontânea das multidões” que é o senso comum, apesar de partir de uma base racional e lógica, precisa ser melhor compreendida, e com isso, superada.

Para tanto, melhor refletirmos sobre as duas frases com os olhos voltados ao cotidiano. Neste domingo acontecem as eleições municipais. Se considerarmos que a alternância de poder é salutar, acriticamente os eleitores devem votar inapelavelmente nas oposições. E pronto. Mas fica a questão: e se a substituição resultar num candidato eleito menos preparado, mais corrupto e incompetente? Não é preciso muito esforço para que a premissa da troca de poder, simplesmente pela substituição em si, não seria tão positiva assim.

Basta verificar a troca de comando do país que aconteceu no pós-governos Lula e Dilma, do Partido dos Trabalhadores. Independentemente de julgar os acertos e desacertos da condução das relações partidárias entre os poderes e legendas nas disputas pelo poder, tínhamos até então gestões do país alinhadas a programas de governo. Os quais, goste-se ou não, elevou a qualidade de vida dos brasileiros e conduziu o país a um considerável período (pelo menos uns 12 anos) de crescimento econômico, respeito no exterior, entre tantos outros avanços.

Vieram, então, a sabotagem, e o consequente golpe, ao governo Dilma por parte da oposição no Congresso Nacional, aliada a setores da sociedade, principalmente ligados aos campos do mercado financeiro, da indústria e do judiciário.

A abrupta e violenta “alternância” de poder trouxe os governos Temer e Bolsonaro. O que a população ganhou? Com o primeiro veio um ataque nunca visto aos direitos dos trabalhadores (reforma da previdência, mudanças na CLT etc), desemprego, privatizações do patrimônio público a troco de banana e um governo sem qualquer legitimidade nos fóruns internacionais de poder.

Com o segundo, o que já era ruim, ficou pior. Bolsonaro tornou-se piada internacional, sem qualquer habilidade em impor a soberania nacional nas discussões com os demais países, tornando o Brasil um mero quintal dos Estados Unidos. A ponto de o presidente, num dos gestos mais ridículos e sem sentido da nossa história, bater continência à bandeira dos estadunidenses.

No Brasil, tivemos a volta ao mapa da fome, altos níveis de desemprego, retrocessos de todos os tipos. Chegou-se ao ponto de negar a comprovada eficácia das vacinas, levando o país a ter proporcionalmente o maior número de mortes na pandemia em todo o globo. Isso para ficarmos nos exemplos mais evidentes.

Assim, não é preciso ir muito longe para verificar que nem sempre toda alternância de poder é salutar. Ou positiva.

Já ao pensar que “em time que está ganhando não se mexe”, vamos considerar o próprio jogo de futebol. Não são poucas vezes que o técnico, mesmo com o placar favorável, muda alguns jogadores ou mesmo altera a tática de jogo.

O raciocínio é simples. Tais alterações podem ser a colocação de jogadores com mais “fôlego” no lugar de um mais debilitado fisicamente e explorar ainda mais as fragilidades do adversário. Ou substituir um atacante por um atleta de características mais defensivas para assegurar o resultado favorável. Então, é mais do que razoável considerar que em time que está ganhando se mexe sim.

Desta maneira, como ensinou Gramsci, é preciso então superar o conceito mais ligeiro do senso comum. E ir mais além em relação a ele. No caso das prefeituras, uma vez que todos estaremos nas urnas neste domingo, o avanço pode ser justamente alternar o poder. Mas uma substituição que preserve fundamentalmente a direção vinda das gestões passadas. Desde que, obviamente, estas mostrem estar corretas.

E daí caímos no “time que está ganhando não se mexe”. É evidente que pode sim mexer no time, como vimos aqui. Uma mudança que, além de garantir o sentido de progresso traçado ao longo dos anos, represente um sopro de renovação, inovação e pujança, mas que não coloque em risco o placar vitorioso alcançado.

Assim, o que está em jogo no domingo, é a opção de romper com a ideia do senso comum da alternância de poder sempre como algo positivo.  E também a de que é importante mexer sim no time que está ganhando, desde que as mudanças preservem a tática e estratégicas acertadas e, como consequência, o placar positivo.

Maurici é deputado estadual (PT-SP)

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