Essa história aconteceu comigo em meu início de carreira como gestora, na época ainda júnior, estreando na área de RH, dezoito anos atrás.
A companhia, um grupo empresarial conhecidíssimo na cidade de Jundiaí e para o qual eu trabalhei por onze anos, acabara de contratar, a peso de diamante, uma consultoria organizacional para realizar um trabalho com as lideranças. Dois psicólogos organizacionais, que basearam-se no uso da ferramenta de avaliação – assessment - mais badalada da época, chamada de MTBI, dos tipos psicológicos de Carl Gustav Jung, para enquadrar o grupo em quatro perfis gerenciais principais: tradicionalistas, visionários, negociadores-pacificadores e os catalisadores.
Dezesseis participantes, incluindo os dois presidentes acionistas. Ali estávamos de "igual para igual" na roda do aprendizado.
Momento da - tchã-rã! - apresentação das características de cada perfil, com base nos testes aplicados.
Dos dezesseis, nove líderes eram os tradicionalistas. Segundo nos explicaram, este, em quantidade, é sempre o maior grupo. Os tarefeiros, as pessoas que precisam de muitas informações para tomar decisões. São os executores mais ao estilo mão na massa. Palmas para os tradicionalistas! Mas eu não era uma.
Três visionários: os que pensam a empresa à frente. Constroem cenários futuros, desenham como a companhia será, mesmo que nadica ainda tenha sido feito, eles sempre sabem como elas serão logo ali, porque visionam. Palmas para os visionários! Mas eu não era uma.
Três negociadores-pacificadores: os mediadores de conflitos, figuras necessárias e indispensáveis à cultura organizacional, pois sabem como promover o diálogo e o bom entendimento entre eventuais partes conflitantes, chegando-se a bons acordos ganha-ganha. Palmas para os negociadores-pacificadores! Mas eu não era uma.
Já fizeram a conta, leitores queridos? Nove mais três, mais três? Quinze! Quem falta?
À época eu, jovem e ainda cheia de vaidade boba e imatura, pensei: devo estar arrasando aqui! Como assim, de um grupo de dezesseis líderes, eu sou a única de perfil gerencial catalisador? Devo ser alguma espécie de mosca branca!
Pois bem...Estão curiosos pra saber como foi a apresentação do perfil catalisador? Desenhem aí mentalmente, leitores, como seriam seus memes, por favor!
Um dos psicólogos, colocou-se à minha frente e em tom quase sádico ditou a sentença: "...Márcia, vou te contar o que acontece com os catalisadores. Na crise, são os primeiros a serem demitidos da empresa! Mas depois, são as pessoas que mais fazem falta na estrutura e a maioria se arrepende de tê-los dispensado..."
Assim, na lata, sem preparação ou aviso prévio! Um meme da vida real do tal MTBI, que até há não tanto tempo assim, eu tratava em terapia. Hoje acho graça e rio da história, mas já me custou muito sofrimento.
Então, você que é pessoa educadora e coach, espero que sempre seja uma pessoa cuidadosa com os perigos das estigmatizacões. Uma frase mal colocada, mesmo em tom de brincadeira, pode traumatizar para sempre uma pessoa.
Como especialista em cuidado informado sobre trauma te digo: quando for pisar o terreno emocional de alguém vá descalço, pois está adentrando solo sagrado.
E pal...mas...para os ca...ta...lisadores...
Márcia Pires é Sexóloga e Gestora de RH (piresmarcia@msn.com)
Comentários
1 Comentários
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Wálmis Balielo 04/08/2024Olá Márcia, li seu depoimento e fiquei estarrecida com a abordagem do \"psicólogo\" sobre você. Durante a minha pós em Psicoterapia Junguiana, tive a felicidade de ter alguns professores incríveis e muito profundos. Jung transcende muito a \"psicologia\" como ela se apresenta hoje no meio acadêmico e podemos observar aí uma grande barreira e até conflitos entre os métodos. Com certeza que este psicólogo que lidou com o seu caso, nunca sequer resvalou na profundidade de Jung. Um dos ensinamentos de Jung que todo Junguiano deve carregar na alma: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”. O tal psicólogo deu um diagnóstico para você diante de um grupo! Sendo que a no método Junguiano, nem se trabalha com diagnósticos! Grande Abraço!