OPINIÃO

D. Mercedes, uma alma de acolher

Por Ariadne Gattolini |
| Tempo de leitura: 2 min

Existem pessoas que nasceram para se doar. D. Mercedes Marchi, falecida na última semana, era assim. Ela e seu esposo Oswaldo Marchi foram fundadores da Feira da Amizade, evento que surgiu para apoiar os trabalhos da recém-instalada Apae de Jundiaí.

Há 16 anos, ela me convidou para um chá, pois sabia que eu escrevera a história de 50 anos da Apae, editada em livro. Encontrei-a em sua sala, na rua Bela Vista, vestida com a elegância de sempre. Ela queria me dar os parabéns e contar sua história na entidade. Poucas pessoas sabiam que ela tinha uma filha com síndrome de Down e por isso era entusiasta em atendimento de qualidade às pessoas com deficiência. Naquele dia, fazia poucos meses que seu “anjo” partira e ela estava muito comovida, acendendo uma vela diariamente na mesa de centro para a alma de sua filha.

Tínhamos em comum um amor pela sua casa da Dr. Leonardo Cavalcanti e, nessas conexões jundiaienses, ela soube que minha mãe fora sua inquilina naquele endereço durante muitos anos.

A casa era lindíssima, hoje seria retrô, e tinha um cofre no porão onde seu marido – joalheiro – guardava algumas joias. Pois bem, era véspera de Natal e todos se preparavam para a ceia, ainda na década de 70. De repente, para em frente da casa um carro luxuoso de onde saem quatro homens perfeitamente vestidos, de terno e gravata. O líder anuncia o assalto. D. Mercedes pede que eles façam tudo com tranquilidade, pois não queria assustar as crianças.

Neste momento, entra na sala sua filhinha. O líder levanta-se e diz que ali eles não iriam assaltar mais, porque aquela criança era um anjo. E se foram sem levar nada.

Prometi a D. Mercedes só contar essa história depois que ela se fosse. Ela era cercada de generosidade e amor ao próximo. Seu trabalho infindável não media esforços nem recursos financeiros. Ao sair, me entregou um colar de Maiorca para que eu lembrasse dela para sempre.

Eu me lembro com carinho. Neste exato momento, rezo para que ela tenha encontrado seus familiares e abraçado à filha tão querida. Esta menina é o marco do atendimento às crianças com deficiências em nossa cidade.

Ariadne Gattolini é jornalista e escritora.


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