A sociedade está em constante evolução, e as relações familiares e sucessórias não escapam dessa dinâmica. Logo, é sempre necessário que o ordenamento jurídico brasileiro também se atualize para abarcar toda e qualquer nova conjuntura com o objetivo de trazer mais segurança para as relações sociais.
Diante desse contexto e, mediante uma iniciativa da Presidência do Senado Federal, houve a instalação em setembro do ano passado a CJCODCIVIL (Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil) que possui o objetivo de alterar a Lei 10.406/2002, essencialmente no que tange a questões voltadas para o uso da tecnologia no dia a dia das pessoas e nos negócios, bem como aprimorar questões de cunho familiar e sucessório.
Um dos aspectos abordados é a questão dos bens digitais e sua administração. A Comissão de Juristas responsável pelo grupo de estudo propôs a inclusão do "Direito Civil Digital", reconhecendo o valor econômico dos bens digitais do falecido e a proteção de aspectos intangíveis após sua morte, como honra e intimidade.
Outro ponto relevante é a vocação hereditária de filhos gerados por reprodução humana assistida post mortem. A possibilidade de incluir esses filhos na sucessão, desde que nasçam dentro de um prazo estabelecido, pode modificar a distribuição dos bens em casos de sucessão já encerrada.
Em contrapartida, uma das propostas mais polêmicas diz respeito à eliminação da concorrência entre cônjuge, ascendentes e descendentes na sucessão. Esta mudança significaria que nem o cônjuge nem o convivente receberiam fração dos bens particulares do falecido em concorrência com os descendentes e ascendentes.
Além disso, discute-se a exclusão do cônjuge da condição de herdeiro necessário. Essa mudança aumentaria a flexibilidade para a disposição de patrimônio de pessoas sem ascendentes ou descendentes, mas também poderia gerar segregação patrimonial absoluta em casais sem filhos ou pais vivos.
Em outras palavras, aquilo que é considerado um bem particular, ou seja, adquirido antes da constância do casamento regido pela comunhão parcial de bens, ou todo e qualquer bem individual daquela pessoa que é casada no regime da separação convencional de bens, poderá, a partir da mudança legislativa, ser herdado exclusivamente por um filho/neto, por exemplo.
Além disso, aquele casal que não possui filhos ou pais vivos poderá utilizar o testamento para dispor de forma integral de todo o seu patrimônio particular para quem melhor lhe convir.
Outra inovação proposta é a criação da sucessão contratual como um novo formato de sucessão, ao lado da sucessão legítima e testamentária. Isso abriria possibilidades para planejamentos sucessórios mais abrangentes, especialmente em questões empresariais, ressaltando a importância e a segurança jurídica de protocolos familiares, acordos de sócios/acionistas e contratos sociais em geral.
Em conclusão, as propostas de reforma do Código Civil Brasileiro trazem importantes reflexões sobre o direito de família e sucessões. E é crucial nos atentarmos aos debates que vem ocorrendo, para analisarmos cuidadosamente essas mudanças, levando em consideração não apenas os aspectos jurídicos, mas também os impactos sociais, econômicos e culturais que podem advir delas, afinal se faz fundamental garantir que os princípios fundamentais do Direito de Família e Sucessões sejam preservados e fortalecidos nesse processo de atualização legislativa.
Guilherme Del Bianco de Oliveira é advogado, possui graduação pela Faculdade de Direito de Franca e Pós-graduação em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Escola Paulista de Direito, Gestão Jurídica da Empresa pela Universidade Paulista Júlio de Mesquita Filho e Negociação Estratégica pelo Instituto de Pesquisa INSPER. Atualmente é Sócio-Diretor do Moisés, Volpe e Del Bianco Advogados, escritório fundado há mais de 20 anos e com atuação especializada nas demandas de empresários e produtores rurais.