OPINIÃO

Notícia promissora

11/04/2024 | Tempo de leitura: 3 min

A mãe me mandou mensagem bendizendo a Deus. Emocionei-me com ela. São tantas as suas orações. Mulher de fé, de olhar voltado para o Céu.

O dia a dia, desde pequenina, lhe tirou tantas coisas! Foi no percurso, para conhecê-la no hospital, que o acidente levou o pai. A mãe foi cinco anos depois. A irmã com o marido, de situação financeira difícil, acolheu os irmãos. A menina era de idade semelhante à da prima.  Estavam com nove anos quando saíam pelos arredores e no centro, para conseguir um pouco de alimento. Poderia ser mesmo dos latões de lanchonete e restaurante, que guardavam na latinha de cera. A mãe trabalhara de faxina e o pai de ajudante de caminhão. Não tiveram pensão os filhos menores e ainda ficou, da mãe, o último aluguel dos cômodos em que moravam na viela.

Estudaram um pouco. Brincaram tão pouco quanto estudaram. Gostavam, no dia de chuva forte, percorrer as ruas na sarjeta. Era ali que também colocavam barquinhos de papel feitos pela irmã mais velha, imaginando que chegariam em algum porto de terras encantadas. No Natal, os barquinhos eram de papel colorido.

Levavam a vida de acordo com as possibilidades. E por serem viáveis para jovens inescrupulosos que desejavam exercer sua masculinidade sem caráter, tornaram-se presas fáceis em troca de pastel, bombom, bolo com creme...

Para ela e mais gente sua, eram para consumo. Fazer o quê? Consideravam que "sair da linha" era culpa delas. Ah, meu Deus, nesse mundo com tantas diferenças sociais! Não tinham e continuam não possuindo consciência da imensa cratera que existe entre os empobrecidos e os com melhores condições econômicas, a respeito de oportunidades.

Foram assim empurradas para troca com suas carnes, que jamais lhes deu condições de viver dignamente. Empurradas para ser prazer por momentos. Uso e abuso.

Por sua fé – jamais a perdeu -, ela me lembra o que disse Dom Hélder Câmara: "Aceita as surpresas que transformam teus planos, derrubam teus sonhos, dão rumo totalmente diverso ao teu dia e, quem sabe, à tua vida. Não há acaso. Dá liberdade ao Pai, para que Ele mesmo conduza a trama dos teus dias".

Para os filhos, no entanto, sonhou uma vida diferente. As brechas para o ilícito, porém, são inúmeras com propaganda do consumismo, do poder, do trato das angústias nas drogas... Conseguiu lhes dar um tempo maior de estudo do que o seu, mas o filho se enturmou com os de pouca chance como ele.

Nesse ritmo frenético, o moço, junto com a companheira, de conseguir e usar, de usar e conseguir com medo da abstinência, não voltou para sua aldeia. Soube-se, tempos depois, que estava em um estabelecimento penal. Mas em qual se questionava a mãe há quase um ano. Em todos os momentos de prece, ele ergue os braços ao Céu, querendo notícias do filho.

Mandou-me mensagem, como comecei o texto, bendizendo a Deus. A mãe de outro detento se encontrou com o filho dela e lhe trouxe uma carta. Alegria imensa em saber que o filho não consta de lista de desaparecidos ou mortos. Entrará em contato com ele e lhe mandará, primeiro, o "Deus te abençoe" costumeiro.

Seu coração se abriu em esperança nova para o retorno do filho. Gente que realmente se coloca nas mãos do Senhor, que é bom e fiel.

Maria Cristina Castilho de Andrade é professora e cronista (criscast@terra.com.br)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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