As crianças brasileiras estão se conectando à internet cada vez mais cedo. A pesquisa TIC Kids Online Brasil, do Cetic.br, um centro de estudos ligado ao Comitê Gestor da Internet, revela que 24% dos entrevistados disseram ter começado a se conectar antes dos seis anos. Em 2015, a proporção era de 11%. Das crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos, 95% relataram usar a internet, o que significa um contingente de 25 milhões de pessoas no país.
Com a tecnologia na rotina desde tão cedo, os jovens estão bastante expostos aos riscos do ambiente digital - e eles são muitos, de danos à saúde mental à exploração sexual. Tanto que, para protegê-los, a regulamentação das chamadas Big Techs (especialmente das redes sociais) é assunto corrente em todo mundo.
Recentemente, nos Estados Unidos, o tema conseguiu a proeza de unir parlamentares republicanos e democratas. Em sessão no Senado americano, dirigentes das principais redes sociais como Meta (WhatsApp, Instagram e Facebook), X (o antigo Twitter) TikTok, Discord e Snapchat foram confrontados com os malefícios causados aos usuários, bem como a negligência das plataformas para garantir um ambiente saudável para crianças e adolescentes.
Na sessão, pais comoveram a audiência ao exibirem fotos dos filhos que tiraram a própria vida por terem sido expostos ou cancelados nas mídias sociais. O impacto é gigantesco na saúde mental de crianças e jovens que se veem diante de padrões de beleza inatingíveis, cyberbullying e haters, entre outras questões.
Um estudo com quase sete mil adolescentes americanos entre 12 e 15 anos, por exemplo, mostrou que os que passavam mais de três horas por dia nas redes sociais tinham o dobro do risco de sintomas de depressão do que aqueles que limitavam o tempo de uso das plataformas.
A situação é tão séria que, nos Estados Unidos, a discussão chegou aos tribunais. Procuradores de 41 dos 50 estados americanos entraram com processos contra as Big Techs.
Os procuradores acusam plataformas como Instagram, Facebook e TikTok de enganar o público sobre os riscos das mídias sociais. E de usar ferramentas como notificações e rolagem infinita para prender a atenção dos jovens por mais tempo, viciando-os. Doze estados já aprovaram leis que restringem o acesso de menores de idade às redes sociais e as discussões seguem no Congresso.
No Brasil, o debate também é intenso, posto que os riscos são os mesmos. O governo defende a regulamentação das Big Techs, mas enfrenta forte objeção das plataformas e da oposição. No ano passado, esses grupos fizeram pressão e conseguiram tirar da pauta de votações o chamado PL das Fake News (PL 2.630/2020). O projeto prevê a proteção integral e prioritária dos direitos fundamentais de crianças e adolescentes, criminaliza a divulgação de conteúdos falsos e determina que essas empresas tenham regras transparentes de moderação de conteúdo.
Enquanto isso, as denúncias de imagens de abuso e exploração sexual infantil na internet batem recorde no Brasil, em função da maior utilização da Inteligência Artificial. Segundo a ONG Safernet, no ano passado, 71,8 mil denúncias foram encaminhadas à Central Nacional de Denúncias, conveniada ao Ministério Público Federal, um aumento de 77% em relação a 2022.
A Safernet atribui este número recorde às levas de demissões realizadas pelas Big Techs, o que teria afetado a qualidade do controle de conteúdo, além da proliferação da venda de pacotes com imagens de nudez e sexo por adolescentes e da Inteligência Artificial generativa, que consegue criar volumes imensos desse tipo de conteúdo.
Essas poderosas empresas globais precisam agir com responsabilidade e garantir uma infância saudável e protegida a todas as crianças.
Vandermir Francesconi Júnior é 2º vice-presidente do CIESP e 1º diretor secretário da FIESP (vfjunior@terra.com.br)