Dia desses levei minha bicicleta para um ajuste de rotina. Sabendo que seria algo que demoraria uma hora pra ser feito carregava comigo um livro. Enquanto os reparos eram feitos, me sentei na praça da frente e fiquei imerso na leitura.

Estou lendo "Tudo sobre o amor", da Bell Hooks. É um livro que me desliga da realidade. Preciso até escrever sobre isso, mas voltando à história da semana...

Estava lá eu, concentrado quando uma voz me assusta com sua pergunta:

"O que significa essa sua tatuagem?"

Antes mesmo que eu pudesse responder, me dei conta de que eu estava de regata e que o rapaz, um morador de rua, apontava para meu braço esquerdo. Tendo hoje os dois braços tatuados eu preciso que o interlocutor seja mais específico.

A minha primeira vontade era usar a resposta ríspida que tenho decorada pra essa pergunta evasiva.

"Significa que eu tinha dinheiro e o tatuador horário."

Essa resposta costuma funcionar muito bem ao seu propósito, que é afastar pessoas demasiadamente curiosas. Porém o sorriso do senhor em questão me desmontou, não consegui ser seco e usei a resposta polida que uso para pessoas que gosto e para alguns familiares.

"Essa é uma rosa dos ventos, significa direcionamento. Traz rumo e direção para a minha vida." Ele sorriu agradeceu, elogiou a tatuagem e me compartilhou a dele. Era o super-herói Hulk, aquele verde dos Vingadores. Ele disse que tatuou só porque acha bonito mesmo. E saiu rindo.

E eu fiquei ali parado feito um palerma com o livro na mão, invejando a capacidade de ser assim, simplesmente sincero com um desconhecido. Admirando a capacidade que eu não tive.

Eu sempre falo que tatuagens são adornos que a gente em plena certeza de não querer mais tirá-los os eternizamos na pele. Mas, por alguma razão, busquei de uma diplomacia de araque ao invés de falar o que penso. Diplomacia esta que aquele rapaz não teve e ainda resumiu muito melhor o meu argumento com a simples frase "Tatuei porque achei bonito".

Demorei ainda alguns minutos para conseguir entender o que havia acontecido e voltar para a leitura. Eram muitas informações a serem processadas.

A toda semana eu busco me conectar com as pessoas por meio de meus textos aqui e com uma simples pergunta de um desconhecido eu me dei conta do quanto de estereótipos que eu preciso romper para poder ter uma comunicação franca.

Quantas vezes a vida espera essa coragem de peito aberto de conversar com um desconhecido? Matar essa curiosidade, compartilhar uma opinião, um gosto?

Eu quem já usei em algumas crônicas a expressão geração TikTok me vi tão acelerado quanto eles, vivendo a vida em 2X deixando passar o que realmente importa.

Depois de tanto pensar, me levantei e fui até a oficina buscar minha bicicleta. Chegando lá perguntei pro mecânico como vai a vida. Ficamos conversando bobagens do cotidiano. Ele até me contou como vai Palmeiras. E olha que nem de futebol eu gosto.

Eu gosto mesmo é de conversar...

Jefferson Ribeiro é autor e cronista (jeffribeiroescritor@gmail.com)