Opinião

Ressaca sem álcool

18/08/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Na adolescência, a gente acha que tudo é o último, mesmo sendo o primeiro.

O primeiro amor é o amor da vida, o primeiro emprego é onde iremos ser gerente daqui a alguns poucos anos e aposentar no fim da vida.

Quem dera fosse...

Mas é que nem sempre é assim. Alguns "primeiros" são introdutórios, alguns passageiros e alguns até podem ser pra sempre.

É engraçado como a gente acha que no início de tudo, quando abrem-se as cortinas pra vida, quando o palco de uma jornada inteira pela frente ainda está em fase de construção. É tudo pra ontem!

Seja ela breve ou não, intensa ou não, o imediatismo tem esse gosto de vinte anos.

Aí o tempo passa e ri na sua cara, assim como quem diz: "Eu já sabia!" ou "Eu te avisei!".

E aquela que parecia ser a última vez era só a primeira de muitas. Seja ela pra coisas boas ou ruins e a gente enxerga a geração seguinte, nossos filhos, sobrinhos, cometendo os mesmos erros e vem aquele desejo de gritar: "Calma!" "Vai devagar!" "Ainda tem muito pra viver." As mesmas frases que gritaram pra gente em um passado não tão distante assim. As mesmas frases que gritaram e a gente não escutou.

Não escutou porque o barulho da juventude, desse imediatismo era alto demais, intenso demais, gostoso demais.

Penso que a vida seja essa eterna dança das cadeiras onde ora se está em pé, ora sentado. Mas sempre se está no jogo, vivendo...

Mas já são quase três da tarde e eu ainda estou terminado de fazer o almoço. Acordei depois de uma noite daquelas...

Ela veio aqui ontem, tomamos um porre de Fanta Guaraná. Ela não bebe, mas é apaixonada pelo refrigerante. Não quis beber só. Eu tenho o defeito de não conseguir parar. Uma cerveja vira duas, que viram cinco que viram uma noite de lembranças esquecidas e uma ressaca de doer.

Mas dessa vez foi diferente, veio o sono, e a lembrança. Lembrança acompanhada dos braços dela no meu peito.

Depois dela penso até em parar de beber, pois eu sempre me esquecia da noite, da conta e até das minhas companhias. Mas dessa vez foi diferente! Eu me lembro que ela me falou que ama Lasanha com molho branco. Pra minha sorte é uma das poucas receitas que aprendi com minha mãe.

Estou aqui fazendo o almoço pra ela. O date mais inusitado que tive.

Pode ser que eu esteja sendo emocionado, pode ser que seja reciproco ou quem sabe até casual. Difícil saber, mas vou correr o risco, ver onde vai dar.

Pensando até em parar de beber, só pra ter mais lembranças, mais momentos assim.

Acho até que se essa noite ir além do papo e da lasanha em pleno sábado eu arrumo um emprego de palestrante motivacional pra ela.

Meu fígado iria adorar. No embalo que estava, bem... eu não chegaria nos quarenta.

Meu médico já aprova esse relacionamento, e olha que ele nem conhece ela.

E olha que nem é relacionamento.

É só uma noite que de tão incrível criou expectativas que já estão adultas, assistindo tevê no sofá da sala e jogando Candy Crush no celular.

Agora preciso parar de pensar tanto em coisas que pertencem ao acaso ou vou queimar o molho branco.

Aí sim será o fim de minhas expectativas

Jefferson Ribeiro é autor e cronista (jeffribeiroescritor@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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