Consternação. Substantivo feminino. Ação de se comover ou de se perturbar. Choque. Grande tristeza; pesar profundo; contristação, dor, desolação.
Essa palavra define o sentimento de todos os jundiaienses quando a notícia se espalhou. As labaredas de fogo, sempre devidamente controladas, desempenhavam apenas um papel: aquecer os fornos de onde saíram milhares de pizzas servidas no mais tradicional restaurante dessa categoria em nossa cidade.
Ninguém esperava, entretanto, que a casa que tem como nome o temível vulcão que emoldura a bela paisagem de Nápoles, sul da Itália, tivesse seu fim pelo fogo. Fomos inundados (perdão pelo trocadilho) por imagens assustadoras: colunas de fogo, altas e incandescentes, consumindo, para consternação de quem registrava o ocorrido, todo esse complexo gastronômico da rua do Retiro, que virou uma pilha de cinzas, ferros contorcidos e madeiras queimadas.
O sentimento de consternação se confundiu com as lembranças que muitos de nós, da terra querida, temos do Vesúvio e seus salões. Eu mesmo já fiz reuniões entre um pedaço de margherita e outro de aliche. Uma de minhas melhores amigas me convidou para ser padrinho de seu casamento ali. Saindo do teatro ou do cinema, o Vesúvio era garantia de estar aberto e servindo com alegria. E essa é uma palavra interessante sobre esse local: garçons, garçonetes e comensais se conheciam, riam. As crianças tinham ali espaço garantido nas brincadeiras.
Toda essa situação levou a milhares de comentários: muitos lamentos, lembranças, mas muita preocupação. Será que alguém se machucou? Tinha seguro? E como vai ser agora? E assim, aquela aproximação de vizinhos, de amigos, de conhecidos, se formou. Isso tem vários nomes: empatia, preocupação, solidariedade. Só nos preocupamos com quem gostamos. Só queremos bem os que nos fazem bem.
Eu, particularmente, não conheço o dono do estabelecimento, tampouco sou um habitué. Tenho apenas memórias naquele local. Apenas. Mas fico triste por ver destruição. Fico preocupado pelos funcionários. Por quem depende daquele trabalho. Esse sentimento de pertença eu acho incrível. De algo ruim, surge um bem maior. Que nos ajuda a reforçar nossa identidade, nossos vínculos com um lugar, com as pessoas. Num mundo cada vez mais egoísta, individualista, onde a dor do outro parece não ter eco, onde a injustiça não assusta, ver a movimentação das pessoas, a consternação, a empatia me fazem acreditar em um mundo melhor. A volatilidade das relações em nosso meio são muito perceptíveis. a perda dos locais de nossa memória. Cidade em crescimento. Substituição de lembranças. Esse é o processo da vida. Esse é o processo das grandes cidades.
A vida urbana leva a uma valorização do dinheiro, da individualidade e de uma atitude mais reservada, mais apática com relação ao outro.
Por isso que situações como a do Vesúvio, em nossa cidade, com gente que conhecemos, por mais triste e consternadoras que sejam, nos aproximam. Faz com que fiquemos mais solidários e menos endurecidos e brutos.
Que os envolvidos recebam minha solidariedade.
Samuel Vidilli é cientista social (svidilli@gmail.com)