Opinião

Vida vai mais devagar

13/07/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Tem casais que são dignos de inveja. E nem falo daqueles casais melosos, que ficam trocando apelidos carinhosos e vozinha fina em restaurantes e lugares públicos.

Falo daqueles em que a entrega é mutua, sincera. Coisa rara hoje em dia.

Mas até onde o que vemos em parques e fotos do Instagram é alinhado com a verdade? Sempre fiquei pensando sobre isso...

Ele se apaixonou por ela logo após o match. Do primeiro encontro não se lembra de metade do que ela disse. Não que ele não se interessava, mas é que estava preso em seu sorriso. Todo o resto eram acessórios.

Têm clichês que se tornam verdade...

Ela demorou pra enxergar ele da mesma forma. Não era culpa dele. Mas sim do seu último ex. Ele a sufocou por tanto tempo que ela ficou sedenta de liberdade.

Quem vai julgar?

Com pouco mais de um ano e algumas brigas depois aprenderam a respeitar as individualidades de cada um. Foram morar juntos. Era o típico "Viveram felizes para sempre" dos filmes de princesa da Disney.

Mas é que a vida é mais que os limites da casa do Mickey.

Teve o dia que eles discutiram no bar porque ela queria dançar e deixou ele sozinho na mesa. Teve o dia que ele queria jogar futebol com os amigos e brigaram de novo.

Teve... Passado! Hoje ela sabe que ele gosta do fut com os parças. E ele sabe que ela gosta de dançar.

Individualidades que formam um casal.

E assim juntos eles partilhavam sonhos, planos, desejos.

Alugaram um apartamento maior no mês passado. Compraram a tevê de não sei quantas polegadas que era maior que a envergadura dos braços dele. "Agora sim eu consigo jogar um FIFA!" Foi o que ele disse.

"E eu tenho espaço pra minhas plantas." Ela constatou olhando pra sacada.

Eles falavam de comprar um lugar só deles, casar... adotar um gato.

Pra ela, adotar um pet era um ensaio pra se ter filhos.

Ele voltou do trabalho com três gatos e uma aliança.

Um mês depois ele não estava mais usando a aliança. Eles terminaram.

Desculpe o spoiler, mas é que foi assim, de repente.

Bem... Essa é a visão dele.

Na dela, era só a vida acontecendo.

Ela recebeu uma promoção, daquelas irrecusáveis. Salário astronômico, morar em outro país...

Como não ir?

Não indo! Foi o que ele disse.

Mas ela foi.

Tinha o medo de se arrepender, de não ter outra oportunidade, de culpar ele pro resto da vida.

"Vida vai mais devagar..." Pensou ela.

Mas foi assim mesmo, com o pé no acelerador.

Deixando-o no apartamento. Com os gatos, as plantas e a saudade.

O apartamento ficou enorme sem ela. O lar que era deles agora era só o endereço dele.

E os amigos dos dois tiveram que escolher um lado.

Como se em um término houvesse uma audiência pra definir quem foi a vítima e quem foi o sacana da relação.

Houve os dois que deixaram de ser dois.

Talvez ela estivesse certa.

Vida vai mais devagar! Mas ela não ouviu e passou tão rápido que um dos dois caiu. Engraçado que um caiu. Mas os dois saíram arranhados.

Mais arranhados que eles só o sofá depois dos gatos. Inclusive ele vendeu o sofá. Nem pelo estrago, mais pelas lembranças mesmo.

Dois meses depois se mudou do apartamento, tentando fugir das lembranças.

Não adiantou muito.

Tem lembranças que ficam na alma, não no CEP.

Jefferson Ribeiro é autor e cronista (jeffribeiroescritor@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.