Opinião

Se aquele dia eu soubesse...

08/06/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Sentei no meio fio, acendi o cigarro com o fósforo de uma caixinha esquecida no bolso. Balancei o palito algumas vezes pra apagá-lo. Joguei fora e pisei, na esperança de pisotear junto a frustração que sentia.

Dei uma tragada forte, daquelas de fazer qualquer iniciante tossir. Engoli as lágrimas junto com o tabaco.

O que a gente tinha era muito intenso, não se apaga feito fogo de palha. A paixão era nosso forte e nosso fraco. Mas acabou, comigo aqui na sarjeta, literalmente. Que saudade da nossa intimidade de todo dia, das nossas noites de queijos e vinhos em datas não comerciais.

Com quanto tempo já pode falar que é amor? Ir no cartório e autenticar a certidão de juntos pra vida toda?

Foram os três meses mais insanos e mais sinceros que já vivi. No primeiro encontro a gente já saiu de mãos dadas, na segunda semana eu conheci os pais dela e com um mês já estávamos morando junto. Era uma pressa de estar juntos que não tinha quem nos parasse. Durante o dia minhas declarações eram iguais a resultado da Tele Sena, de hora em hora.

Diferente dela, eu nem acredito muito nesse papo de signos. Hoje me lembro que ela sempre falava que Leão e Peixes não combinam. Que a gente era a exceção à regra.

Pelo visto não!

Olhei aqui no calendário se eu tivesse nascido alguns dias depois seria de Áries. E eu li no horóscopo que esses signos combinam.

Porque minha mãe não me segurou mais um pouco? Assim eu não perderia o amor da minha vida. Iria ter o mesmo perfil aventureiro que ela. Gostar de acampar, fazer trilha. Agora estou eu aqui sentado na calçada em frente ao bar do nosso primeiro encontro, lembrando daquela mão que tocou a minha e que nunca mais irá tocar. Misturando o presente e o passado em uma lembrança mais amarga que qualquer drinque com vodca.

Fico pensando em quantos sorrisos terei que cruzar até achar algum igual aquele que fazia meu coração. Que me fazia sorrir junto. Acho que essa busca só me trará confusão nos braços de outra. Acho que estou preso para sempre nessa noite de hoje, nesse eterno dois de maio.

Eu tinha tanto pra dizer depois daquele "se cuida". Mas era o silêncio que gritava na alma, nada mais se escutava. Penso que talvez a maior dificuldade de qualquer relacionamento é saber o que manter e o que ceder. E principalmente quando.

E eu já estou no segundo cigarro e a tristeza não passa. Nem abranda. A memória insiste em visitar nossos momentos, geralmente os bons, aqueles que nunca serão esquecidos. Queria poder ter o contato do Ed Sheeran, só para agradecer por todas as vezes que ele cantou para gente. E por todas aquelas em que ele cantou no carro, no caminho até a casa dela. Aqueles três minutos e menos de um quilômetro que já aceleravam meu coração de ansiedade.

É, eu queria tanta coisa...

Mas o amor nunca sai conforme o planejado. E aqui estou eu, parecendo uma chaminé. Tentando queimar junto com a nicotina essa amargura que arde no peito. Pensando em ir até o bar beber qualquer coisa, terminar a noite manguaçado nesse ciclo vicioso.

Trocadilhos à parte, o estrago que ela fez aqui foi grande, eu não estava esperando por isso.

Se aquele dia eu soubesse... Não teria aberto espaço para ela sentar do meu lado.

Jefferson Ribeiro é autor e cronista (jeffribeiroescritor@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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