Opinião

Coisas da cabeça de escritor

05/05/2023 | Tempo de leitura: 3 min

Hoje me sentei pra escrever e me peguei pensando em como a lembrança de alguns começos deixa um gosto bom na boca.

O doce da nostalgia.

O primeiro dia de aula no colegial, o primeiro beijo, a primeira transa, o emprego... Quantos primeiros!

Fico pensando: Se os começos são tão bons por que tanto medo de recomeços? Será que é o medo que na segunda não seja tão bom?

Quem nunca ficou com medo de trocar de emprego? De voltar a paquerar depois de um término difícil?

E, mesmo assim, novas lembranças vieram, novas experiências, novas histórias.

Devem ser as decepções que fazem da gente centopeia, com todos os pés atrás, todas as inseguranças.

Sabe por que eu digo isso? Porque em contradição a isso existe aquele gosto de quero mais quando o beijo encaixa depois do primeiro encontro. Quando os corpos reverberam na cama a noite inteira, e quando o papo faz o tempo parar fora da troca de olhares.

Desde pequeno a gente ouve que a vida é isso: altos e baixos, mas eu me esqueço tanto disso, comemoro as partes boas e faço birra das ruins. Tipo quando fui ao parque de diversões e fiquei emburrado só porque a montanha russa me deixou enjoado. Me sentei de canto por quase uma hora enquanto meus primos se divertiam.

Essa lembrança dos onze anos vem banhada de nostalgia e descobertas pessoais. Desde jovem eu me frustrava com coisas ruins que apareciam assim do nada. E com isso me esquecia que os acasos da vida são como moedas que jogamos em uma aposta de cara ou cora. É 50 por cento de chance de serem boas ou ruins. A única certeza é o ressentimento do "talvez" que o futuro trará consigo.

Não sei por quantos anos ainda ficarei por aqui. Quantos a vida me permitir.

E ainda assim não vou aprender como viver.

Deve ser esse meu jeito de fazer da vida um palco, igual ao das aulas de improviso no curso de teatro. Fingindo não sentir as dores que me fazem chorar. Escondendo as emoções com sorrisos. Ora sinceros, ora falsos. Mas sempre intensos.

Assim como a montanha russa do parque, sorrisos viram temores em segundos. O contrário também acontece. Por aqui é tudo rápido. Emoções miojo. Após três minutos ficam prontas para adicionar o tempero.

E tem vezes que nesses 180 segundos passados eu vejo que alguns medos são bobos, sorrisos são frágeis e momentos, passageiros.

Tudo assim, em instantes. Mais rápido que o piscar da palavra Jequiti nos programas do SBT. Mais rápido que aquele episódio da sua série favorita em um dia frio ou o orgasmo apaixonado depois de um vinho e duas horas de conversa e amassos no sofá.

Mais rápido que isso só o fato que essa crônica começava falando sobre começos e agora termina falando da velocidade dos meus medos e da fragilidade de minhas alegrias.

Acho que preciso me despir menos por aqui. Preciso que meu corretor tenha freios tão potentes como carros de fórmula 1.

Mas é que por aqui é mais fácil. O que me restou foi usar as linhas de divã.

Abrir o coração para o papel. Ah, se as pessoas soubessem o poder do sulfite...

As papelarias marcariam terapia. Post-its seriam os novos "tarja preta".

Mas a verdade é que tudo isso é imaginação, coisas da cabeça de escritor.

Jefferson Ribeiro é autor e cronista (jeffribeiroescritor@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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