Olho pela janela e vejo a região central de nossa cidade. Por essas ruas a nossa história acontece. São cerca de 40 mil pessoas que passam por aqui diariamente.
Há um potencial incrível nessa região que é pouco aproveitado.
Culpa de quem?
Penso que de muitos.
Culpa de quem tem imóveis e os mantém vazios, pois cobram aluguéis absurdos, preferindo deixar os imóveis em estado lastimável a ocupá-los por menos.
Culpa também dos comerciantes, que buscam minimizar prejuízos e não se unem de forma adequada e exigem melhorias. Não investem em vitrines, promoções etc.
Culpa do povo que hoje prefere comprar pela internet
Culpa dos que apenas passam por aqui, mas que não consomem.
Culpa do poder público, que não incentiva as mudanças necessárias, não parece prestigiar os lojistas, não faz as adaptações necessárias para que se ande pelo Centro sem necessidade de veículos particulares.
Culpados todos esses.
Mas... ao mesmo tempo, se bem refletirmos, todos também são vítimas.
Quem possui imóveis aqui são pessoas mais idosas, em sua maioria. Muitos não possuem tantos recursos. Não conseguem manter suas casas e imóveis e precisam do dinheiro do aluguel para complementar a aposentadoria.
Quem ainda tem comércio aqui passou por uma pandemia pesada. São heróis. Ainda acreditam no Centro Histórico e por isso mantém firmes seus negócios numa região tão degradada, sem o conforto dos shoppings assépticos.
E o povo? Que ganha cada vez menos? Que tem visto seu poder de compra minguar? Às vezes não há opção.
Quem apenas usa o Centro como passagem não se sente parte de um ambiente agradável. Há poucas opções de lazer, de alimentação, sem atrativos culturais para a família. Apenas passam por aqui...
O poder público, por sua vez, vê a degradação de uma área nobre, que tem todos os serviços à disposição, mas que sofre pela cultura dos shoppings centers e agora pelas compras online. Adicione-se as questões físicas: não há como abrir avenidas ou ruas em um espaço histórico como esse, núcleo central mais antigo da cidade.
Sim. É fácil achar culpados e vítimas. Acusar e denunciar.
Mas a questão do Centro Histórico não será resolvida só com isso. É preciso um envolvimento de todos esses atores. E aí, inevitavelmente, o poder público tem um papel mais relevante. Porque cabe ao Estado fazer essa mediação de tantos interesses.
Mas cada ator pode fazer sua parte.
Os donos de imóveis poderiam receber incentivos para manter fachadas originais, descontos em impostos caso alugassem seus espaços para bares e restaurantes. Isso atrairia um movimento maior, que não ficaria apenas de passagem, mas de gente que demoraria mais aqui, deixando mais dinheiro. O povo poderia ser incentivado a valorizar produtores e lojas locais. Precisam entender a importância de prestigiar quem faz algo pela cidade. Quem produz. Quem vende. Quem emprega. Os lojistas precisam se unir mais e investir na beleza e na qualidade de suas lojas, nos espaços de lazer e descanso para competir com shoppings. Vitrines iluminadas, ruas limpas, seguras. Transporte público de qualidade.
Na verdade, muitas soluções são simples. Outras mais complexas. Meu ponto, porém, é outro: culpados e vítimas somos todos. Assim como a solução, que deve passar por todo mundo. Só assim traremos vida ao nosso Centro Histórico.
Samuel Vidilli é cientista social (svidilli@gmail.com)