Opinião

Histórias de Padre Hugo


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Alguns dias antes de minha Primeira Comunhão, em outubro de 1959, padre Alberto, o vigário de Vila Arens, chamou as crianças para os bancos da frente, na Igreja, e apresentou a todos um padre que eu ainda não conhecia e que tinha o nome de Hugo. Com um sorriso nos lábios, padre Hugo deixou a sacristia e apareceu diante do altar principal da igreja, para conversar com as crianças. E seu objetivo era um só: convidar a todos para participar da Cruzada Eucarística Infantil.

E a conversa foi tão produtiva, pelo menos para mim, que cheguei em casa anunciando que, feita a Primeira Comunhão, pertenceria à Cruzada. Falei com entusiasmo do padre que acabara de conhecer e da conversa que ouvira dele. E no domingo depois da Primeira Comunhão, lá estava eu de terno azul marinho, gravatinha borboleta, camisa branca, integrando o grupo de cruzados.

Padre Hugo comandava as reuniões dominicais após celebrar a missa das 7h30 que era a das Crianças e que tinha como orientador da celebração, o padre Alberto, já que as missas ainda eram em latim. Fazia o mesmo nas tardes de segunda-feira, quando os mais novos se reuniam para aprender mais sobre a Doutrina Cristã e incentivava a vocação sacerdotal.

Apesar do grupo de zeladoras - moças com mais tempo de Cruzada e que ajudavam a tomar conta das crianças durante a missa -, padre Hugo gostava de comandar tudo. Com o passar do tempo, comprou um aparelho de som, várias coleções de discos com aulas de catequese e fazia as reuniões de domingo. Abria o encontro com orientações básicas da semana, ligava a sonata, colocava o disco, verificando o tempo de duração do mesmo, deixava as zeladoras tomando conta e ia atender confissões. Jamais falhou: cinco minutos antes de terminar o lado A do disco, estava ele de volta à reunião para colocar o outro lado.

Mal respirávamos nas cadeiras! Era preciso atenção, pois não sabíamos o que ele iria perguntar ao final do outro lado do disco. Voltava, questionava e dispensava as crianças, sempre com a orientação de que era fundamental obedecer o pai, a mãe, a professora e as catequistas e jamais mentir para quem quer que fosse.

Sabíamos que nas primeiras sextas-feiras de cada mês, ele saia cedo, visitando os doentes da paróquia e levando comunhão a cada um deles. Isso se repetia muitas vezes aos domingos, quando não precisava ir, de bicicleta, até a então capela de Nossa Senhora Aparecida - hoje Santuário de Aparecida - na Vila Rami, para celebrar a missa das 10 horas.

Mas o tempo fez com que ele deixasse Jundiaí e fosse trabalhar em Machado, interior de Minas Gerais, sua cidade natal, isso já no início da década de 1970. Fui revê-lo em 1982, quando veio participar da celebração da primeira missa de meu irmão Antonio, que estava se ordenando padre. E nesta época já era Padre José, retomando seu nome de batismo. Antigamente, quando os padres se ordenavam, mudavam de nome para mostrar sua nova vida e a seguir os passos do Cristo. Hoje em dia, apenas o papa altera seu nome.

Nunca mais o vi! Mas no final da década de 1990, um grupo de criminosos o matou, quando atravessava um rio, de barco, em sua cidade natal, onde ia visitar doentes. Segundo os culpados pelo crime, o confundiram com outra pessoa. O fato tomou conta de quem o conhecia...

Mas hoje, acabei me emocionando ao lembrar deste homem e ao fazer uma busca na internet, descobri que sua cidade natal o homenageou, dando seu nome a uma escola municipal. E a escola faz exatamente o que ele fazia: ensinava os outros...

Nelson Manzatto é jornalista (nelson.manzatto@hotmail.com)

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