O título parece contraditório, né? Foi de propósito. Para chocar, para gerar reflexão.
Conforme já escrevi aqui recentemente, para evitar que crianças, adolescentes e jovens ingressem no mundo do crime, é fundamental que lhes seja garantida boa educação e acesso à cultura, lazer e esporte. São atividades que o poder público deve proporcionar, e cuja responsabilidade não é dos órgãos de segurança pública. Essa prevenção não é de atribuição das polícias, que só entram em ação quando esse mecanismo falhou.
A partir do cometimento de um crime é que o sistema de Justiça Criminal começa a funcionar, para responsabilizar o autor e trazer paz à vítima e à sociedade como um todo. Ou pelo menos deveria.
É que atualmente nem sempre essa sensação de segurança volta ao alcance de quem foi lesado em seu patrimônio, em sua integridade física, saúde, honra ou liberdade sexual. E a culpa não é da polícia.
De fato, é muito fácil atribuir aos órgãos de segurança a responsabilidade pela insegurança que às vezes a população vivencia. Mas saibam que os policiais são seres humanos que estão submetidos ao mesmo sentimento que a população de bem.
Claramente os crimes de menor potencial ofensivo resultam em responsabilização penal para seus autores na medida dessa gravidade reduzida, ou seja, poucas vezes eles serão presos, e sim, receberão as chamadas penas alternativas, dentre as quais a reparação do dano à vítima, prestação de serviços comunitários ou limitação ao exercício de algum direito. Isso ocorre no mundo inteiro.
O problema maior ocorre em relação aos crimes graves, como roubo, homicídio, tráfico de drogas, estupro, associação criminosa, dentre outros. Nesses casos, infelizmente é comum que surja a sensação de insegurança ou impunidade. O que também não é culpa da polícia.
O sistema de Justiça Criminal brasileiro, composto basicamente pelos órgãos de seguranças (polícias e guardas municipais), Ministério Público e Poder Judiciário estão de mãos atadas em razão da um conjunto de leis altamente favoráveis ao criminoso, facilitando de sobremaneira o surgimento da sensação de impunidade e insegurança, que muitas vezes lamentavelmente se concretiza na prática.
A balança da Justiça está em desequilíbrio, e quem perde com isso é a sociedade de bem. O Código Penal, por exemplo, é datado de 1940, e apesar de diversas alterações e criação de outras leis posteriormente, elas não atendem à vontade da população, porque foram editadas por quem não entende de "crime".
As leis são feitas pelo Poder Legislativo, no caso, o Congresso Nacional, composto por deputados federais e senadores. Os integrantes das comissões compostas para confecção das leis penais quase sempre tem uma visão destorcida da realidade criminal brasileira. São "especialistas" que nunca tiveram na linha de frente e "juristas de laboratório", cuja atuação é distante da árdua realidade da segurança pública. Os verdadeiros conhecedores são os policiais, que lidam diariamente no combate ao crime, mas nunca são ouvidos. Juízes e Promotores também conhecem dessa realidade, mas são chamados em número insuficiente para opinar frente às mudanças legislativas, que, na maioria da vezes, dão ouvidos em excesso a profissionais e órgãos ligados aos Direitos Humanos.
São necessárias mudanças urgentes na legislação, para que o sentimento seja de que o crime não compensa. Criminoso não é vítima da sociedade. O lugar dele é na cadeia.
Marcel Fehr é Delegado de Polícia do Estado de São Paulo.
Comentários
1 Comentários
-
Wilson Molez 24/02/2023Muito bom o enfoque do assunto. Muito bem redigido e por alguém que conhece do assunto. Parabéns Marcel Fehr.