Opinião

Para que vingança?

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Querido leitor,

Quando alguém nos prejudica, intencionalmente ou não, logo sentimos um gosto amargo e uma sensação desagradável.

Então saímos do nosso momento de calma e começamos a querer vingança ou retaliação.

Isso quer dizer que já saímos da nossa razão e começamos a culpar aquela ou aquelas pessoas, e pensamos: se eu estou me sentindo mal a culpa é deles.

Quando começamos assim é quase certo que vamos querer nos vingar ou retaliar e, movidos por essa sensação desagradável pensando termos sido prejudicados,  a gente começa a distorcer tudo o que diz respeito àquela ou àquelas pessoas.

Quem pensa como nós a respeito deles se torna nosso amigo, quem pensa diferente é nosso inimigo. Isso é um ciclo sem fim, pois nunca trás satisfação, nem quando eles são prejudicados.

Nossa real natureza não é a maldade e nem querer que os outros sofram. O que acontece é que sofremos também. Como podemos sair desse engano pois essa mente que pensa: "alguém está me prejudicando e por isso estou sofrendo" é um engano? E pensar que ficaríamos felizes se eles sofressem é um engano ainda maior.

No budismo nós entendemos a lei de causa e efeito, sendo que todas as nossas ações são causas e todas as nossas experiências são efeitos de causas. Não existe efeito sem causa, por isso todas as nossas experiências foram criadas por nós mesmos. Retaliar ou se vingar é criar novamente a causa e, a partir daí, o efeito acontecerá.

Quando estamos sentindo sensações desagradáveis raramente pensamos o que os outros estão sentindo e não pensamos que talvez nosso comportamento vingativo pode desencadear a raiva de alguém. Isso também não nos faz felizes.

A paciência em aceitar sem raiva tudo o que acontece conosco mostra nossa força espiritual. Somente conseguiremos manter a mente calma e pacífica se treinarmos meditação. O treino consiste em começar melhorando nossa respiração e, um exercício respiratório que pode ajudar muito, chama-se "meditação respiratória simples". Sente-se e  coloque sua coluna ereta e relaxe os pés, as pernas, o quadril e a cintura.

Deixe tudo que está fora da mente do lado de fora e só preste atenção no ar entrando e saindo dos seus pulmões, deixando assim uma sensação de calor e frescor bem na ponta do nariz.

Perceba que, quando você inspira, o ar entra fresco, e quando você expira, o ar sai morno.

Faça isso pelo menos 21 vezes.

Mesmo ouvindo ou lendo isso, se você não puser em prática, não vai funcionar. Se realmente quisermos ser felizes e termos paz, precisamos começar de algum lugar. Claro que isso não é tudo. Temos que receber instruções corretas para acalmar nossa mente que insistirá em repetir o de sempre.

Com treino, vamos começar a perceber que o verdadeiro inimigo está dentro de nós mesmos. Vingança é uma mente estreita e equivocada que só arruma mais problemas e, no final, não resolve nada, além de criar uma outra experiência dolorosa.

No livro "Como Solucionar Nossos Problemas Humanos", Geshe Kelsang Gyatso nos ensina que o "apego por pessoas queridas é causa frequente de raiva, pois costumamos retaliar em nome delas. Se uma casa se incendiar, a grama seca ao seu redor fará o fogo alastrar para as casas vizinhas, queimando tudo que encontrar pela frente. De modo similar quando uma pessoa querida é prejudicada a grama seca do apego traz seu infortúnio até nós e acende o fogo da raiva em nosso coração, um fogo que consumirá nossa riqueza de mérito. Para evitar que isso aconteça devemos evitar objetos de apego.

No samsara todo encontro leva à separação e tudo o que se junta acaba em dispersão. Sejamos ou não apegados à família e aos amigos, finalmente vamos ter que nos separar deles, antes ou depois da morte."

Nosso amor pelos outros não deve conter esse apego e abandonar o apego não significa abandonar os outros. É simplesmente entender que podemos amá-los sem apego, os ajudando quando precisarem. É importante manter nosso amor, mas não devemos justificar nossa raiva em nome dele.

Sendo assim, vamos treinar!

Gen Kelsang Chime é professora no Centro Budista Kadampa Vajrayogini em Jundiaí

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