É preciso ampliar luta contra trabalho escravo

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O trabalho escravo – ou em condições análogas às de escravidão – é condição que cresceu no Brasil nos últimos dois anos. Segundo um levantamento da Secretaria de Inspeção do Trabalho (órgão vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego, o MTE), no ano passado 2.575 trabalhadores foram resgatados das condições que poderiam caracterizar 'trabalho escravo'. O número é cerca de 30% maior quando comparado a 2021 – o que só reforça a importância desse debate.

São inúmeros os problemas e as questões a serem pensadas, com estratégias a serem formuladas e ações a serem desenvolvidas. O tema tem tanta relevância, infelizmente, que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) erigiu uma data (28 de janeiro) como 'Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo'.

Entre as questões principais, devemos lembrar que o país-continental que é o Brasil surge como primeiro obstáculo natural – pois combater um mal de tal tamanho em território tão amplo é tarefa que deveria ser desenvolvida pelos entes federados em conjunto.

Não é assim, no entanto, que se dá a questão. Na prática, os municípios não têm competência para fiscalizar as relações de trabalho, conforme decidiu, por unanimidade, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) em 2019.

De acordo com o TST, órgãos municipais, estaduais ou distritais não têm competência para fiscalizar empresas, e, portanto, não podem autuar e aplicar multa em matéria de Segurança, Saúde e Medicina do Trabalho. Tal competência, reforço, é do MTE e, portanto, da União.

Contudo, a prática de trabalho escravo vai além das relações trabalhistas normais - é uma violação aos direitos fundamentais - em especial ao direito de locomoção, estando caracterizado no artigo 149 do Código Penal, que prevê: "São elementos que caracterizam a redução a condição análoga à de escravo: a submissão a trabalhos forçados ou a jornadas exaustivas, a sujeição a condições degradantes de trabalho e a restrição de locomoção do trabalhador".

Entendo, por todos os fatores envolvidos, que os municípios poderiam desenvolver instrumentos e políticas públicas para acabar com essa questão repulsiva, em especial nas localidades onde há atividade rurais – e onde, infelizmente, acontecem mais registros dessa prática.

Saliento, também, que os municípios devem reforçar a importância de conscientizar as pessoas sobre esse problema social e gerar soluções que efetivem direitos. No dia a dia, o trabalho escravo começa a nascer através daquilo que, à primeira vista, pode ser uma proposta tentadora de emprego – proposta que, uma vez aceita, no entanto, surgirá como armadilha e causará a destruição de sonhos. A questão só fica mais grave, na medida em que trabalhadores escravos têm reduzida sua restrição, podem até mesmo contrair dívidas por alimentação e transporte – e ainda há o risco, sempre presente, da exploração sexual como fator agravante.

A repulsa ao trabalho escravo deve ser combatida e denunciada por todos. Em 2022, a prática foi registrada pelos fiscais do MTE em 17 Estados brasileiros. Os cultivos de cana-de-açúcar, alho, café, maçã e soja; a produção de carvão vegetal; a extração de pedras e madeira; e a confecção de roupas foram algumas das áreas com o maior número de registros no Ministério do Trabalho.

O que pode ser feito é denunciar – seja pelo telefone 100, pelo site www.ipe.sit.trabalho.gov.br ou nas delegacias regionais do Trabalho. Que se faça justiça, é o nosso desejo.

As denúncias de trabalho análogo ao de escravo podem ser enviadas pela internet, ao site do Sistema Ipê.

Neste dia 28 de janeiro, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) comemora o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. Nosso país é uma nação de dimensões continentais. Na nossa região podemos não fazer ideia de que é praticado  trabalho escravo ou análogo, porém, o Estado de São Paulo infelizmente figura como um dos Estados com maior desmantelamento desta prática.

Marcelo Silva Souza é advogado e consultor jurídico (marcelosouza40@hotmail.com)

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