Voltando ao passado

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Passei hoje pela rua Marrocos, no Jardim Bonfiglioli, e voltei no tempo! Claro que do meu jeito, da minha maneira, mas voltei. Consegui! Parei diante da casa onde morou meu avô José Monarolo e analisei as diferenças. Confesso que, quase 60 anos depois, vi poucas mudanças: a fachada da casa é a mesma, apenas construíram uma garagem para acomodar um carro que naquele tempo não era preciso.

Não sei quem mora ali, mas vi que o corredor, que levava ao fundo do quintal, praticamente nada mudou. Talvez trocaram o piso, mas vi que o acesso à cozinha, que tinha degraus, hoje não existe mais. A pintura, claro, também mudou. Mas percebi que a garagem quebrou a beleza natural. E voltei a olhar o corredor e vi o fundo do quintal onde antes havia uma cerca de bambu dividindo o local com um terreno baldio. E me lembrei do pé de amora onde subíamos para colher fruta e contar histórias um para outro.

Minha memória mostrou ali o forno a lenha onde minha tia Teresa fazia pão. E surgiram em minha memória meus primos Araci, Egle, Edson, José Carlos, Sonia, Adilson, e ainda meus irmãos Ademir, Ana e Osmar. Antonio e Alberto, mais novos, pouco curtiram o local...

E me lembrei da rua de terra, com buracos infindáveis e o barranco que havia em frente, hoje cheio de residências. E ri das brincadeiras que passaram por minha cabeça naquele instante e, meio sem graça, dei voltas num carro estacionado, como que brincando de pega-pega. Lembrei também do "esconde lenço" do "passa anel", da "mãe da rua" e do pega-esconde que era minha brincadeira preferida, pois meus esconderijos não permitiam que me encontrassem. E subi correndo, quase sem fôlego, a rua em frente à casa de meu avô que era o barranco onde, também, brincávamos de "mocinho e bandido" e as armas de fogo eram o dedo indicador.

E percebi um garoto no portão, olhando para o celular que tinha na mão e cruzou seus olhos com os meus e entrou correndo para casa. Ri, ao imaginar que fosse chamar a mãe para dizer que havia um louco ali em frente, correndo e pulando guias e sarjetas como se fossem os buracos da década de 1950. E desci rapidamente para a rua Marrocos, novamente, e parei antes de ser atropelado por um carro que vinha como louco – talvez mais do que eu – em busca de seu trabalho e do seu dinheiro. E ri da inocência de mais de 50 anos passados quando ter carro não era importante e correr nada mais era do que brincar de pega-pega.

E desci até a rua Pirapora e me lembrei que carros não passavam por ali e agora um semáforo registrava um volume de, pelo menos, dez automóveis ali parados. E decidi, pela última vez, subir até onde morara meu avô e que fora o ponto de encontro meu, de meus irmãos e de meus primos num tempo que nunca mais volta. Parei em frente ao portão, recordei meu avô sentado junto à porta da sala, preparando seu cigarro de palha. Lembrei-me de seu chapéu marrom que escondia sua calvície e percebi que duas lágrimas estacionaram em meus olhos, querendo escorrer. Respirei fundo, dei meia volta e quis voltar à realidade. Mas as lágrimas não permitiram e deram as mãos com outras e mais outras e desceram pelo meu rosto, ao tempo em que buscava a outra rua, de outro tempo, de quase 60 anos depois...

Nelson Manzatto é jornalista (nelson.manzatto@hotmail.com)

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