Lágrimas em avião e chineladas em público

07/01/2023 | Tempo de leitura: 2 min

Tenho assistido com cada vez mais tristeza e estarrecimento a toda forma de agressão cometida contra crianças. A impaciência absurda dos adultos para com elas é constante e pode ser observada em todos os ambientes por onde passo, por onde convivo e por onde paro para testemunhar.

Confesso e admito que já fui essa adulta ignorante e limitada. Achava absurdo o comportamento de crianças com claras crises de ansiedade em forma de agitação e agressividade. Julgava inadmissíveis birras em supermercado, gritos em ambientes públicos, choro incontrolável e atitudes completamente fora dos limites

Nessas ocasiões entram em cena os adultos que, em sua maioria, temerosos do julgamento alheio, agem com mecanismos violentos de punição desproporcionais aos fatos e só agravam a situação. Haja vista os episódios de agressão contra duas crianças praticada pelo pai, registrada recentemente em um praia em Salvador, na Bahia, amplamente divulgados nas mídias e redes sociais. Nas cenas ele aparece dando chineladas e empurrando as crianças no chão com violência, segundo declarou, com objetivo de "educá-las".

Outro caso ocorreu durante um voo em que o assento de uma das janelas foi vendido duas vezes pela companhia aérea. O erro levou um garoto de seis anos às lágrimas, pois a passageira, detentora do mesmo direito vez que também pagou pelo lugar, recusou-se a ceder o espaço ao menino. Ora, ninguém é obrigado a fazer isto! Mas daí a não querer lidar de forma amorosa e pedagógica com uma cabecinha infantil, inocente e ainda imatura... Digam-me: com quem está o problema?

Quando assisti ao vídeo da história ocorrida em Salvador, senti, como muita gente, como se minhas vísceras estivessem sendo esmagadas. Não apenas por essas crianças, mas por saber, como terapeuta e como profissional que lida há vários anos com seres humanos e suas (des)humanidades, que todo adulto bruto foi também uma criança brutalizada de alguma maneira durante a infância.

Uma criança não tem capacidade e nem sistema nervoso maduro para compreender porque está sendo censurada ou porque está sofrendo qualquer tipo de violência. E então ela aprende que, para não perder vínculos afetivos, para ter suas necessidades básicas e primárias atendidas, para não ser abandonada e rejeitada precisa agir da mesma maneira, copiando o adulto que a "educa".

Então se você adulto se identifica com as características descritas neste texto, e que indicam comportamentos nada elogiáveis com relação às crianças, busque ajuda imediata. Do contrário você estará dando continuidade a um ciclo que o atingiu. E é urgente quebrá-lo e rompê-lo única e exclusivamente a partir de você.

Quem bate - é bom lembrar que bater é também agressão psicológica - se distancia cada vez mais do conceito do ser humano racional. E isso só pode ser evitado através de um olhar honesto para com a questão. Do contrário seremos adultos apenas a observar a cena e nada fazer já que o rigor da lei, conforme o que já se conhece, não é suficiente e nunca será.

Márcia Pires é sexóloga e gestora de RH (piresmarcia@msn.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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