A bateria acabou... Mas a conversa só começou

26/11/2022 | Tempo de leitura: 3 min

?Na época da escola eu sempre me sentia deslocado por não ser bom com esportes, eu não sabia jogar futebol e nem os jogos na televisão eu gostava de assistir, até hoje não conheço a regra do impedimento.

Enquanto meus colegas ficavam ansiosos pela educação física eu levava um tabuleiro de xadrez pra jogar com meu amigo que, assim como eu, não era bom em esportes. É sempre assim, toda sala tem dois nerds chatos. Bem... Era assim que nos chamavam e de tanto falarem eu acabei acreditando.

Teve um dia que meu amigo não foi na aula e eu me vi sozinho sem ter com quem jogar xadrez. Guardei o tabuleiro e fui para a biblioteca, me chamou a atenção os quadrinhos coloridos dos livros de Asterix e Obelix. Peguei um pra ler e a leitura era tão leve e gostosa que eu terminei de ler ele ali mesmo na biblioteca, emendando a educação física com o recreio. Levei um pra ler em casa, terminei em uma tarde, devolvi e peguei outro, depois outro, outro e em menos de um mês li todos que tinham na escola.

E assim eu descobri o gosto pela leitura, fui de Asterix e Obelix pra turma da rua quinze, Agatha Christie, Machado de Assis e daí não parei mais, me apaixonei pela literatura.

Entrei pro clube do livro e a literatura me trouxe mais dois presentes: a escrita e a comunicação. Na época eu ainda não sabia que seria escritor, mas já escrevia resenhas e até alguns textos simples (lamento tê-los perdidos). E a comunicação veio ao encontrar pessoas que tinham gostos parecidos e assim, pela primeira vez, eu não me sentia mais deslocado, conseguia interagir em diversos assuntos, ficava conversando por horas.

Esse valor eu trago comigo até hoje, valorizo as pessoas que o papo flui, que o diálogo rende. O papo é a preliminar de tudo que vale a pena na vida, sejam amizades, amores ou noites inesquecíveis.

E acho que isso que faz com que eu e ela sejamos esse match automático, ficamos batendo papo por quase três horas, nem a bateria do carro aguentou. Tudo bem que esquecemos o farol ligado. Mas é que quando a gente se junta o papo vai longe.

Inteligência é afrodisíaca e ela é a prova disso. Descobri que sou viciado em diálogos intensos e conversas que varam a madrugada. Ela é meu ópio, aquela brisa que bate e fica até o dia seguinte. Sabe quando a lembrança de um momento fica sendo reproduzida na mente no decorrer do dia? Doses homeopáticas de uma conversa que reverbera na mente.

Só quem já teve essa sensação de encontrar alguém com quem pode falar de tudo vai me entender, só quem descobriu que a leveza de um diálogo sincero e a troca de olhares e sorrisos é a melhor preliminar que existe. E eu que nos tempos de escola me sentia um peixe fora d'água descobri que na verdade eu só estava no aquário errado.

Quando descobri meu aquário eu entendi que eu não queria mais nadar em outras águas, sempre de olhos abertos e atentos, assim como o Onofre, o peixe dela que fica olhando e pensando: O que esses dois cancerianos tanto conversam?

Ah Onofre, a gente conversa sobre tudo e por horas sobre nada, porque quando o santo bate a alma pede bis.

Jefferson Ribeiro é escritor e cronista (jeffribeiroescritor@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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