Ping-pong intelectual

19/11/2022 | Tempo de leitura: 3 min

Quando o papo é bom e o café é quente existem grandes chances de virar história por aqui, e esse é um dos prazeres de ser escritor. Engendrar esse encontro entre real e ficção no papel e no imaginário. Verdade e ficção nessa mistura mais improvável que macarrão com feijão.

E nessas idas e vindas a gente descobre que todo esse clichê de que a vida não é a mesma depois dos 30 é uma verdade não pelo senso comum, mas justamente pelo acúmulo de nossas experiências (tanto as boas quanto as ruins), individualidades e expectativas. E nada melhor que uma boa conversa. Sabe quando o papo é amigo do sorriso e inimigo do relógio? É sobre isso.

De falar de política, dança, relacionamentos, o último filme da Marvel ou a propaganda polêmica de cosméticos.

Aquele pingue-pongue intelectual, onde um rebate o comentário do outro. Aquela sensação de olhar a pessoa falando e pensar: Cara, que inteligência afrodisíaca, eu ficaria a noite toda ouvindo ela falar. Eu ficaria... Mas não fiquei, não fiquei porque, depois de tanto falar, rolou um silêncio. Não aquele silêncio constrangedor quando falta assunto no elevador e ainda é preciso esperar mais quatro ou cinco andares até poder se despedir com um sorriso amarelo. Eu falo daquele silêncio quando as bocas decidem que querem mais que apenas falar, quando o elo entre a mente decide se estender entre os corpos.

E ela que me fez ficar olhando para o relógio na semana passada torcendo que as horas não passassem, os ponteiros não girassem, novamente me deixou perdido ao ver que o encontro de nossos lábios fez daquele momento um vácuo no tempo, pelo menos em minha mente. Lamento não saber do poder desses beijos antes, acho que teria usado deste recurso para congelar aquele instante enquanto sentia a leveza e maciez da boca dela. O encaixe dos nossos corpos.

Sempre que me dou conta de situações assim, que colocam um sorriso no meu rosto, eu tento captar o momento, tatuar na mete aquela lembrança, pra poder revisitar sempre que a saudade vier cutucar e deixar na boca o gostinho de quero mais.

Tem tanta coisa que quero falar, mostrar, debater, mas falta tempo, faltam horas, sobram compromissos. Vontade de trancar o chefe na sala de reunião até o fim da semana.

Essa intensidade que transborda e se deságua em toques, sussurros e olhares pecaminosos é a porta de entrada pra conversas profundas e noites mal dormidas. Sim, mal dormidas, porém bem vividas. Ressaca de um porre de lembranças e a boca seca com o sabor de "Te quero de novo nos meus braços e na minha cama".

Meu corpo deu match com o teu e quero mais do teu toque.

Sorrisos bobos no decorrer do dia dividem espaço com bocejos de cansado e desejos de quero mais.

Mas sem culpa ou arrependimentos, só aquele desejo de repetir tudo de novo, por uma hora, uma noite ou apenas um instante, dizem até que são estes instantes que marcam.

O momento que os lábios se tocaram, os olhos se encontram ou os corpos se conectaram.

Quem sabe? Tem coisas que não é de saber, é de sentir, de deixar vir...

Incertezas motivadas por uma certeza, a gente não pode controlar o tempo, mas com certeza eu sei do que quero fazer com ele e, principalmente, com quem.

Jefferson Ribeiro é escritor e cronista (jeffribeiroescritor@gmail.com)

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do SAMPI

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