Alimentação sem carne: pais enxergam dietas alternativas, viáveis e saborosas

A ideia de que a alimentação vegetariana e vegana são insuficientes e que faltarão nutrientes para o desenvolvimento saudável de uma criança se constrói em parte por equívocos

Por Heloísa Pereira | 09/10/2022 | Tempo de leitura: 6 min
Jornal de Jundiaí

Daniel Tegon Polli

Ana Laura Hermann e a filha Olga
Ana Laura Hermann e a filha Olga

A infância é a principal fase do desenvolvimento cognitivo de uma pessoa. Nesse período a saúde e o sistema imunológico são fortalecidos e a maioria dos hábitos se constrói.

A ideia de que a alimentação vegetariana e vegana são insuficientes e que faltarão nutrientes para o desenvolvimento saudável de uma criança se constrói em parte por equívocos e pela falta de informação. Os hábitos construídos na infância são fundamentais para formar o paladar.

A professora de educação infantil Ana Laura Dobre Ferreira Hermann, de 43 anos, conta como foi o processo de adotar uma dieta vegana na vida de sua filha, Olga Hermann, de 8 anos, frisando o quão é fundamental a busca de profissionais qualificados e dispostos.

“Quando eu fiquei grávida eu já era vegana há muito tempo, então foi um processo bastante natural para eu tornar a minha filha vegana também. O mais difícil foi encontrar profissionais atualizados e que atendessem as minhas necessidades a partir das minhas escolhas. Para isso eu e meu marido pesquisamos muito, sempre mantendo uma rotina de exames para saber se estava tudo ok, mantendo assim uma gravidez sem riscos e que não deixasse de lado a forma como eu escolhi me alimentar”, relata.

Ana Laura também explica que sempre buscou referências de profissionais e estudos e, como sua filha foi introduzida deste o momento em que nasceu a esse formato de alimentação, não houve obstáculos pois a inserção ou transição de uma dieta vegetariana ou vegana não deve ser encarada como um sacrifício a ser feito.

A professora expõe que hábitos não são transformados, mas sim criados e que a forma mais eficaz de fazer isso acontecer é através do exemplo.

“Eu acredito que é fundamental envolver a criança no processo de alimentação, levando-a junto para as compras, mostrando o preparo das refeições, a origem dos alimentos, ensinar sobre questões de desperdício. Isso vale para uma alimentação saudável no geral, não apenas para uma dieta vegana. Não adianta querer que seu filho se torne vegetariano e dar um miojo vegetariano para ele”, opina.

Ela acrescenta dizendo que outros ambientes fora de casa oferecem uma diversidade de cardápios para alimentações veganas e que a própria escola de sua filha prepara refeições que se preocupam em fornecer lanches que atendam às necessidades individuais dos alunos.

“Desde muito pequena minha filha tem bastante consciência sobre a alimentação dela, nunca foi algo imposto e obrigatório, ela é bem convicta. Nunca tivemos nenhum tipo de problema dela querer provar alguma coisa que não seja vegana. Ela é livre nas próprias escolhas, enquanto pais a gente orienta, mas nunca decidimos por ela”, afirma.

DIVERSIDADE NOS CARDÁPIOS 

As dietas vegetarianas ou veganas hoje são mais acolhidas e enxergadas como uma alternativa viável e acessível e que buscam agregar na alimentação uma infinita possibilidade de combinações de cardápios, com gostos, sabores, cheiros e texturas, aproveitando o que os alimentos têm de melhor.

Para o consultor empresarial e de tecnologia da informação Marcos Kaoru Hira, de 55 anos, isso é resultado de iniciativas de conscientização e de novas informações sobre o tema, o que permite um ambiente mais aberto e incluso para novos adeptos.

Kaoru introduziu o vegetarianismo na rotina dos seus dois filhos, Mariana Kaori Hira, de 16 anos, e Miguel Kenzo Hira, de sete anos, e expressa como a temática da ‘alimentação alternativa’ deixou de ser um tabu nas relações e nos espaços que ocupa.

“Cada vez mais as pessoas entre meus amigos, família e colegas de trabalho têm vindo me pedir sugestões de como eles também podem se tornar vegetarianos. Na minha família recebemos algumas críticas quando começamos há 14 anos e, na época, principalmente preocupados com a minha filha, vinham dar suas opiniões para voltarmos a consumir a proteína animal, mas hoje, quase todos também trocaram suas dietas e já são vegetarianos”, lembra Kaoru.

O empresário ainda descreve como ele e sua esposa, Alessandra Inoue Hira, de 51 anos, preparam as refeições em casa, de forma a deixar o cardápio o mais atrativo e saboroso possível.

“Ao contrário do que muitos acreditam, é relativamente fácil cozinhar para vegetarianos. Eu procuro sempre incluir algum vegetal em qualquer uma das refeições e, tanto no almoço, quanto no jantar, procuro trazer alimentos bem coloridos, diversificando bastante em suas propriedades e nutrientes. No almoço e jantar procuro alternar entre algum arroz, macarrão, sopas, cremes, sempre acompanhados de vegetais como legumes, verduras, grãos e mesmo as saladas sempre tem algum grão, como o feijão fresco, pepino, tomate, procurando, à medida do possível, consumir produtos orgânicos e naturais”.

LIBERDADE NAS ESCOLHAS

A analista de business intelligenc Sabrina de Araujo Mariano, 30 anos, também introduziu o vegetarianismo na alimentação da sua filha, Julia Mariano Fraga, de três anos e nove meses. Ela conta que se preocupou em cuidar da própria saúde, e aos limites que precisaria ter ao longo da gravidez da Julia.

“Hoje em dia é mais tranquilo porque acho que já me posiciono bem sobre isso e as pessoas conseguem ver como a Julia se alimenta bem, isso gera certa confiança nas pessoas em saberem que deu certo. Mas no início foi difícil, me perguntavam muito sobre os nutrientes, sobre as vitaminas, o que faltaria e se eu não estava me equivocando ao tomar essa atitude, ao decidir que a minha filha se alimentaria de tal forma”, relembra Sabrina.

A analista ainda comenta que pretende levar a diante esse modelo de alimentação e que sempre observa e interpreta como sua filha se dispõe diante disso. “Às vezes ela me pergunta, por exemplo, ‘mamãe isso é bicho carne’, ao querer a origem de determinado alimento. Aos poucos ela vai entendendo melhor e eu estarei aqui para ensinar o que foi necessário”.

UMA ALTERNATIVA POSSÍVEL 

A nutricionista especializada em dietas vegetarianas Juliana Klein Kimura, de 33 anos, esclarece que desde que bem planejada e feita com o acompanhamento profissional, a alimentação vegetariana é segura em todas as fases da vida, desde a gestação. Assim, após o período de aleitamento materno exclusivo, ou seja, após os seis meses de vida, a criança pode começar a introdução alimentar vegetariana. Ela frisa também que todos os nutrientes são encontrados em uma dieta vegetariana, com exceção da Vitamina B12 e por isso é tão importante o acompanhamento nutricional.

“Como conseguimos encontrar todos os nutrientes em uma alimentação vegetariana bem equilibrada e adequada, não há prejuízo no desenvolvimento infantil. Todas as crianças, que consomem ou não alimentos de origem animal, devem ser suplementadas com algumas vitaminas desde o nascimento, e a única diferença em relação à criança vegetariana é em relação à suplementação de Vitamina B12. Vitamina essa de extrema importância para o desenvolvimento neurológico, atuando nos processos cognitivos, de concentração e de memória”, pontua.

Juliana explica que o ideal para uma dieta vegetariana é que nas refeições principais da criança contenha 25% do prato de cereais e tubérculos (arroz, batata, mandioca, etc), 25% de leguminosas (feijões, ervilha, lentilha, grão de bico, etc) e 50% de legumes e verduras (quanto mais variedade, melhor a oferta de nutrientes), conforme a imagem da Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB). Além disso, é fundamental uma fonte de Vitamina C nessa refeição, como uma fruta cítrica, para aumentar a disponibilidade de ferro. Para temperar os legumes, azeite de boa qualidade para obter Ômega 3. A B12 como mencionada deve ser suplementada individualmente.

Já nos intervalos das refeições, ela sugere a oferta de frutas e lanches saudáveis. Segundo ela, com esse balanceamento é possível atingir uma oferta maior de outros nutrientes, como o zinco e o cálcio. Leites vegetais fortificados com cálcio podem auxiliar a compor a necessidade diária.

“Estudos mostram que uma alimentação vegetariana reduz os riscos de doenças cardiovasculares, reduz os níveis séricos de colesterol e pressão alta além de auxiliar no funcionamento intestinal. Uma criança que consome uma alimentação sem carne irá se beneficiar de todas essas questões”, comenta Juliana sobre os benefícios que o vegetarianismo pode proporcionar à saúde.

1 COMENTÁRIOS

A responsabilidade pelos comentários é exclusiva dos respectivos autores. Por isso, os leitores e usuários desse canal encontram-se sujeitos às condições de uso do portal de internet do Portal SAMPI e se comprometem a respeitar o código de Conduta On-line do SAMPI.

  • Jose da Silva
    10/10/2022
    Só chegamos onde chegamos em níveis intelectuais e desenvolvimento porque a raça humana sempre foi carnívora. Meu filho vai comer carne até as 15 anos, pelo menos. Quando ele for adulto se não quiser mais comer, é um problema dele. Até lá, vai comer, para que tenha um desenvolvimento cognitivo e orgânico normal. Não há problema algum em crianças comerem carne durante a fase de desenvolvimento. Os problemas citados pela reportagem, relacionados a consumo excessivo de carne, principalmente carnes gordurosas, atingem somente adultos e mais velhos. Ao contrario do que a reportagem tenta induzir, comer carne quando criança, quando seu corpo está em pleno desenvolvimento (principalmente cerebral) é extremamente importante e fará uma diferença enorme no futuro desta criança. Fica a dica.