Ana Suy, doutora em pesquisa, psicanalista, escritora brasileira e autora de um dos Best Sellers mais lidos no momento, chamado 'A gente mira no amor e acerta na solidão', escreveu em uma postagem recente que se as relações fossem fáceis, a primeira pessoa do plural se chamaria 'laços' ao invés de 'nós'. Bem mais fácil e bonito de desatar e continua: a gente vai ao outro e se enrosca. Quando tenta voltar para si, já não se encontra.
Da lente sobre a qual me debruço nos últimos tempos, que é o desenvolvimento de habilidades relacionais, o entendimento da necessidade de se ter um bom sistema de limites pessoais saudáveis nas relações, incluindo aqui, também e inclusive, relações amorosas, em tese seria capaz de dar conta das inúmeras demandas e distância existentes entre estes tantos laços e nós, mas só que não.
A palavra limite por si já remete ao que há de mais desafiador nas relações humanas, que é pensar nela como uma barreira que, hora é usada para dar conta de comportamentos de defesas inatas de sobrevivência, entre elas, luta e fuga, hora é usada como instrumento, sobretudo, de poder e manipulação consciente ou inconsciente do outro. E com isso as perspectivas de um bom e saudável entendimento sobre determinado conflito, desentendimento ou mal entendido, em vez de serem resolvidos, acabam se transformando em um confronto que, não raro, torna-se algo indissoluto.
É possível ter conversas difíceis sem se ferir ou ferir ao outro ou ainda, é possível estabelecer limites saudáveis nas relações sem sofrer? Sim, é. Porém, como quase tudo relacionado à complexidade humana, trata-se de um processo e não uma estratégia constituída de um passo a passo onde cumprimos cinco, dez etapas e pronto, está resolvido.
Todo processo que envolve mudança de comportamento implica, necessariamente, em uma mudança de atitudes diante da vida e dos desafios que ela nos coloca. O nosso sistema corpo mente precisa sair do estágio onde se encontra para "re-titular" aqueles sentimentos maiores, gravados no sistema nervoso desde antes até do nascimento e que levam, facilmente, ao desistir de promover mudanças profundas em nós. Os principais destes sentimentos, a tríade formada por medo, culpa e vergonha. Eu sempre lembro que somos mamíferos sociais e como tais, a sobrevivência da espécie ao longo do curso da história só foi possível graças à capacidade dos humanos racionais, de organizarem-se em grupos. Não somos a espécie mais forte, nem a dotada de melhor visão e nem de melhor olfato na natureza. Os homens das cavernas, em sua necessidade de sobrevivência precisaram, desde os primórdios, lançar mão de capacidade relacional para, em grupo, dar conta de lutar contra o predador e preservar e proteger a todos, tanto quanto possível, minimizando abatimentos.
Mas então, poderiam os homens terem perdido sua capacidade de relacionar quando chegaram à sociedade moderna? Pode ser que sim, pode ser que não. O fato é que, para voltarmos aos laços como citei no início deste artigo, precisaremos cuidar do eu interno e externo com autorresponsabilidade. A mesma que trará de volta o senso de eu e quais são as bordas e fronteiras saudáveis nas relações. Somente assim não nos encontraremos perdidos de volta, quando enroscarmos nos nós do "nós".
Márcia Pires é Sexóloga, especializada em felicidade no trabalho e gestora de RH.