A quebra de safra provocada por condições climáticas adversas é um fenômeno que pode gerar efeitos abrangentes e profundos em múltiplos níveis, afetando não apenas a produção agrícola, mas também a economia. Os recentes incêndios no interior de São Paulo levantaram uma importante questão sobre os reflexos de uma abrupta e catastrófica queda na expectativa de safra de um produtor rural ocasionada por um caso fortuito ou de força maior.
Uma das principais consequências de uma quebra de safra é a diminuição na quantidade de produtos agrícolas disponíveis, e esse impacto direto nas colheitas resulta em uma menor oferta de alimentos. Com a oferta de alimentos reduzida devido à quebra de safra, o preço dos produtos agrícolas tende a subir. O efeito macroeconômico ocasionado pela quebra de safra pode gerar uma crise financeira para os produtores rurais e todos aqueles que participam da cadeia produtiva agrícola.
Um exemplo disso é justamente a cadeia de intempéries experimentada no ano de 2021 e que atingiu inúmeros produtores rurais da região da Alta Mogiana, especialmente algumas áreas rurais localizadas nas cidades de Franca, Pedregulho, Jeriquara, Restinga, Patrocínio Paulista e Ibiraci. Após um extenso período de seca, foram experimentadas cerca de 3 geadas intensas que, por sua vez, foram seguidas de focos de incêndios em algumas localidades. Não bastasse isso, quando da chegada do período de chuvas na primavera, muitos locais experimentaram casos de precipitações de granizo.
Logo, não há o que se falar em uma prosperidade produtiva quando se experimenta um cenário tão desafiador como o visto acima e nos últimos anos. Conforme alguns estudos apontam, é certo que um queda de safra repercute em, pelo menos, os próximos 3 (três) anos safras seguintes e, evidentemente, afetando a saúde financeira do produtor rural e sua família.
Em consequência a isso, os preços da saca de café atingiram máximas históricas, gerando assim inúmeros prejuízos a produtores rurais que tiveram quebra de safra e possuíam contratos de venda futura.
Conforme dito, os recentes incêndios que atingiram o interior paulista e tantas outras localidades podem sim desencadear uma crise financeira e produtiva, como já observado no passado recentes.
Outro efeito imediato é justamente o acionamento de seguros agrícolas. Em teoria, tal ferramenta financeira deveria servir como um mecanismo de proteção financeira destinado a produtores rurais, com o objetivo de minimizar os impactos negativos causados por eventos adversos que possam comprometer a produção agrícola, protegendo os produtores contra a perda de rendimento das suas colheitas ou a destruição das suas plantações devido a fatores como eventos climáticos extremos, pragas e doenças.
Entretanto, não é incomum observar o não cumprimento das obrigações contratuais estabelecidas pelas seguradoras, apesar de expressamente comprovado o sinistro que gerou a quebra de safra.
As justificativas para a negativa são muitas e beiram o absurdo:
- O produtor rural promoveu alguma alteração supostamente indevida na cultura antes do evento que gerou a quebra, tal como um esqueletamento ou decote de herbáceos no caso do café, sendo que tais tratos são completamente comuns e, muitas vezes, recomendáveis ao cafezal.
- A plantação da cultura foi realizada fora de uma janela pré-estabelecida e, muitas vezes, não demonstrada para o produtor antes da assinatura do contrato. Além disso, não é incomum observar que o período de plantio “obrigatório” em questão era completamente incompatível ou impraticável com a cultura ou com as condições de trato do terreno naquela safra específica.
- A intempérie climática em questão não está coberta pelo seguro contratado, obrigado o produtor rural a ser as diferenças entre tempestade, ciclone, tornado, tufão, geada, neve, incêndio, queimada e demais inúmeros conceitos específicos e técnicos que podem ser utilizados como subterfúgio para o não pagamento da indenização securitária.
- Ainda que aprovado o pagamento da indenização securitária, podem existir fatores limitantes de tal pagamento, ocorrendo uma avaliação totalmente parcial e contra os interesses do produtor rural em relação aos efeitos e prejuízos sofridos por uma queda de safra. Quanto menor a apuração dos prejuízos, menor o pagamento da indenização securitária.
Outro reflexo que será melhor explorado no próximo artigo é justamente a questão do superendividamento como um processo gradativo e perigoso especialmente para o produtor rural.
De qualquer forma, é indispensável um apoio jurídico para identificar eventuais práticas abusivas e viabilizar as medidas extrajudiciais e/ou judiciais necessárias para a proteção dos direitos do produtor rural quando este mais precisa.
Guilherme Del Bianco é advogado, sócio diretor do escritório MVB Advogados, especialista em Gestão Jurídica da Empresa, em Negociação Estratégica, em Direito do Trabalho e em Direito Processual do Trabalho.
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